Os dados de desemprego não deviam ter de bater à porta do Governo antes de entrar no domínio público

17/02/2011
Colocado por: Manuel Esteves

(Marta Poppe)

  

Os dados sobre desemprego do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) foram hoje divulgados, exactamente um dia depois de terem sido publicados os resultados do inquérito trimestral sobre emprego do Instituto Nacional de Estatística (INE). Não é a primeira vez que a divulgação dos dados dos centros de emprego e do INE coincide, mas esse é um aspecto secundário. A questão primordial é a seguinte: porque razão é que o IEFP não define uma data precisa para divulgar os seus dados de desemprego?

 

Esta questão é polémica e já suscitou até a aprovação, pelos partidos da oposição, de uma resolução no Parlamento, que recomendava ao Governo a fixação de uma data indicativa para a divulgação destes números. O objectivo era evitar uma eventual gestão política da publicação dos dados.

 

Porém, a resolução não foi acatada. É verdade que o IEFP definiu uma janela entre o dia 17 e 20 de cada mês para tornar pública a informação, mas o Governo continua a ter a última palavra quanto à data exacta. Neste mês saiu a 17. Mas, se o Ministério do Trabalho assim o entendesse, podia ter saído só no fim-de-semana. Os efeitos mediáticos teriam sido, naturalmente, muito diferentes.

 

A regra geral, aplicada pelas instituições que divulgam estatísticas com regularidade nos países desenvolvidos, é a de pré-definir datas para a publicação dos dados.. Em Portugal, tanto o Banco de Portugal, como o INE seguem essa norma, tendo nos respectivos sites um calendário, onde indicam as datas previstas para a divulgação de informação. Não deveria o IEFP seguir este exemplo? Sim, por três razões:

 

  • Relevância dos dados: este indicador é um excelente complemento ao inquérito ao emprego do INE. O facto de os dados do IEFP terem uma natureza distinta dos do INE, na medida em que são administrativos e não estatísticos, não deve interferir na decisão de fixar uma data para a sua divulgação. Apenas obriga a um cuidado adicional na sua leitura e compreensão.

 

  • Operacionalidade da fixação de prazos: o IEFP tem condições para publicar a informação sobre os inscritos sempre na mesma data. A única variável que introduz alguma imprevisibilidade temporal na disponibilização da informação diz respeito aos dados oriundos das regiões autónomas, que não são carregados no sistema central. Porém, o IEFP pode sempre criar uma almofada temporal que assegure que os dados daquelas duas regiões estão disponíveis na data pré-definida.

 

  • Politização dos dados: se há informação que é objecto de atenção por parte dos partidos políticos, é esta. Governo e partidos da oposição procuram tirar dividendos dos números, puxando a brasa à sua sardinha. Sempre foi assim e assim continuará a ser. Mais grave é o facto de, ciclicamente, se levantarem suspeitas sobre a manipulação destes dados que, sendo administrativos, são obviamente influenciados por decisões de secretaria. Não sendo possível eliminar a natureza administrativa destes dados, nem naturalmente as suspeitas, a fixação de uma data para a divulgação mensal dos dados contribuiria para a transparência desta informação, com a qual todos – partidos políticos, organizações sociais, investigadores, jornalistas e cidadãos em geral – beneficiariam. E admitindo que o que é bom para o País, é bom para o Governo, também este sairia a ganhar.

 

Pelo que se disse, não parece haver motivos para os dados de desemprego do IEFP continuarem a ter de bater à porta do Governo antes de entrar no domínio público.

 

Manuel Esteves