A procura interna volta a salvar o dia

28/11/2014
Colocado por: Nuno Aguiar

A economia portuguesa cresceu 1,1% no terceiro trimestre deste ano, uma revisão em alta de 0,1 pontos percentuais em relação à estimativa rápida apresentada a meio de Novembro. O consumo privado é o principal factor por trás deste crescimento, com a procura externa a manter o seu contributo negativo. Os economistas estão também entusiasmados com o investimento.

 

Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium bcp, BPI, NECEP (Universidade Católica) e IMF, isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.

 

Rui Bernardes Serra – economista-chefe do Montepio

 

1. A estimativa final do INE para o PIB no 3ºT2014 apontou para uma subida de 0.3%, representando uma revisão em alta face aos 0.2% anteriormente reportados, saindo em linha com as nossas perspectivas, que eram as únicas de entre as instituições nacionais e internacionais contactadas pela Bloomberg que apontavam para uma revisão em alta.

 

2. Na ótica da procura, confirmaram-se as indicações que tínhamos avançado aquando da estimativa inicial, com o contributo negativo das exportações líquidas (-0.8 p.p. vs +1.1 p.p. no 2ºT2014), a anular parcialmente o contributo positivo da procura interna (+1.1 p.p. vs -0.9 p.p. no 2ºT2014).

 

3. Em resultado da revisão em alta do PIB do 3ºT2014, diminuíram os riscos descendentes para a nossa previsão de um crescimento anual do PIB de 0.9% em 2014, que agora já se encontram relativamente balanceados. Os riscos descendentes têm uma origem, quer externa (relacionados com a incerteza geopolítica no Médio Oriente e no Leste da Europa), quer interna (devido aos efeitos da crise do Grupo Espírito Santo sobre as decisões dos agentes).

 

4. Os riscos ascendentes prendem-se com a possibilidade da economia espanhola continuar a crescer acima do que fora anteriormente estimado, algo relevante atendendo ao elevado peso que ainda tem nas trocas comerciais com o nosso país

 

Paula Carvalho – economista-chefe do BPI

 

1 – A dinâmica da procura interna surpreendeu pela positiva e constitui uma boa notícia na medida em que significa que o reforço dos níveis de confiança, de famílias e empresários, se começa a traduzir em mais crescimento.

 

2 – No que diz respeito ao consumo privado, a leitura deverá ter sido um pouco empolada pela devolução dos subsídios aos funcionários públicos nos meses de Verão. Todavia, é sintomático que esta dinâmica positiva do consumo ocorre sem que a taxa de poupança desça, antes pelo contrário, e sem ser estimulada pelo recurso ao crédito. Estamos na presença da reposição quase técnica de patamares menos extremos em algumas variáveis – caso das vendas de automóveis, que atingiram níveis mínimos absolutos – com um impacto grande, na margem. No futuro é expectável que o consumo privado se mantenha positivo, embora mais contido.

 

3 – A melhor notícia vem do investimento, pois a dinâmica positiva é influenciada pelo investimento em maquinaria e equipamento, +15.2%, registando crescimento pelo quinto trimestre consecutivo; e em material de transporte, +28.5%, enquanto o investimento em construção deverá estar próximo do limiar de estabilização. Embora permaneça em níveis muito baixos, esta recuperação constitui um sinal muito favorável, devendo ser um elemento impulsionador do crescimento em 2015.

 

4 – Relativamente à procura externa, há apenas que destacar que as exportações registaram um bom desempenho, apesar da desaceleração de alguns importantes parceiros comerciais; já o crescimento das importações reflecte a recuperação da procura interna mas também o maior conteúdo importado das exportações, graças ao maior peso dos combustíveis nas exportações de mercadorias.

 

5 – Tudo somado, e atendendo aos sinais de enfraquecimento recente de algumas tendências, ajustámos ligeiramente em baixa a nossa previsão para 2014, para 0.9%, mantendo a previsão de 2015 em 1.5%. Os principais riscos são externos e relacionam-se com o andamento das economias externas e factores de ordem política. Em contrapartida, a evolução do euro e dos preços do petróleo no mercado internacional deverão continuar a suportar o crescimento, exercendo um efeito favorável sob a actividade.

 

Núcleo de Estudos de Conjuntura sobre a Economia Portuguesa (NECEP) da Universidade Católica 

 

1. No 3º trimestre de 2014, a economia portuguesa cresceu 0.3% em cadeia mantendo o ritmo do 2º trimestre. O crescimento homólogo do PIB manteve-se positivo (1.1%, +0.2 pontos percentuais, p.p., face ao trimestre anterior). A taxa de crescimento no ano terminado no 3º trimestre de 2014 foi de 1.1%, acima do crescimento anual observado no final do 1º semestre (0.6%). Estes dados são ligeiramente mais favoráveis face ao perspectivado na estimativa rápida do INE de 14 de Novembro, com uma revisão em 0.1 p.p. no crescimento, quer encadeado, quer homólogo, do PIB. Em particular, revelam que a economia portuguesa já terá recuperado da contracção observada no primeiro trimestre do ano.

 

2. O consumo privado cresceu 1.3% em cadeia, evoluindo muito acima da sua dinâmica recente, e em contraste com a estagnação do trimestre anterior. Esta evolução positiva é explicada, em grande medida, pelo consumo de bens duradouros que cresceu 5.7% em cadeia. O investimento (FBCF) também evoluiu de forma muito favorável, com um expressivo crescimento encadeado de 2.2%, se bem que o nível do investimento se mantenha ainda em patamares muito baixos. As exportações cresceram 0.7% em cadeia, em linha com a respectiva dinâmica favorável ao crescimento e continuando a recuperar da queda de 1.8% registada no início do ano. Já as importações apresentam uma leitura consistente com as relativas ao consumo privado e investimento, com um crescimento em cadeia de 2.7%.

 

3. A recuperação do investimento é o dado mais animador do terceiro trimestre (crescimento homólogo de 3.7% sendo o maior desde o segundo trimestre de 2008) e, a manter-se com este fulgor durante os próximos trimestres, poderia suportar a recuperação da economia portuguesa ao longo do próximo ano.

 

4. Não obstante uma avaliação genericamente mais favorável face à reportada para o trimestre anterior, a leitura da conjuntura continua a ser dificultada por efeitos de deflatores, que permanecem negativos nas componentes de investimento e importações, de calendário (dias úteis) e outros como a reposição temporária dos vencimentos dos funcionários públicos que pode ter explicado o expressivo aumento do consumo privado durante o verão.  O NECEP mantém o ponto central de previsão para o crescimento anual de 2014 em 0.7%.

 

Nuno Aguiar