Quem é e como pensa Carlos Costa?

16/02/2011
Colocado por: Rui Peres Jorge

 

Crédito: Pedro Elias, Lisboa, 07.06.10, tomada de posse de Carlos Costa

 

O governador do Banco de Portugal trata em público os banqueiros por colegas e, no meio da maior crise financeira e económica portuguesa, concede a primeira entrevista a uma reputada jornalista, mas da área da politica (no Diário Económico).  

 

Chegou em Junho de 2010 ao comando do BdP, tem uma vasta experiência bancária e pela frente esperam-no vários anos como governador. E será aí que encontraremos a resposta sobre quem é, como pensa, e que estratégia tem Carlos Costa. Por enquanto, aqui ficam alguns dos pontos que marcaram os seus primeiros meses.

 

1) A entrada de Carlos Costa no banco fica marcada pelas notícias de que, quando trabalhou no BCP, assinou como director para a área internacional a renovação de créditos concedidos aos off-shores da polémica, o que o Governador reconhece, embora repudie qualquer capacidade de saber os problemas com esses paraísos.

 

2) Meses depois, no final do ano passado, dias após o governo apresentar mais um plano de austeridade, desdisse do seu próprio (e primeiro) boletim económico que dizia as medidas de austeridade para 2011 não chegariam (o que o BdP justificou como um erro da sua equipa na redacção do texto).

 

3) Em Novembro, numa das primeiras intervenções em público, na câmara de comércio luso espanhola, opta por dar uma aula de economia em que comparou Portugal a uma empresa. E perante uma plateia cheia de banqueiros, tratou os que regula como “colegas”, aproveitando para repetir a importância de criar um conselho de sábios da politica orçamental, recomendação que o Governo segue.

 

4) Em Dezembro, com o apoio do BCE, vai contra a determinação do Governo e da Assembleia da Republica de aplicar ao banco de Portugal os mesmos cortes salariais que a restante administração publica, mas garante – sem especificar exactamente como – que fará as mesmas poupanças salariais embora com outra arquitectura de cortes, decisão que confirma em comunicado em Janeiro.

 

5) Também em janeiro tem o primeiro arrufo com um grande banqueiro. Depois de ter recomendado aos bancos a retenção de dividendos para que assim possam fortalecer as suas estruturas de capital, Ricardo Salgado diz que não percebeu essa recomendação e anuncia que distribuirá dividendos (mais tarde Salgado garante estar a cumprir a recomendação, ao ser moderado na distribuição). A CGD também o deverá fazer.

 

6) Hoje, na maior crise financeira e económica que Portugal atravessa em década concede a sua primeira entrevista. Escolhe um jornal especializado (Diário Económico),  mas uma jornalista de politica. Aqui ficam algumas passagens da entrevista:

 

Banca e Regulação

“Quem vai ao mar avia-se em terra”. Ou seja, a banca está sólida, capitalizada, mas é prudente e desejável que reforce os seus capitais

 

Por isso é que o Banco de Portugal recomendou que, no caso da distribuição de dividendos, houvesse uma preocupação com o reforço de capitais. Este é o ano para reforçar capitais

 

As estratégias seguidas pelos diferentes bancos – quer do ponto de vista de alienação de activos e do reforço de capitais, quer do ponto de vista de alienação de activos – mostra que esse diálogo [BdP/bancos] mostra que esse frutífero diálogo, bem como a preocupação do Banco de Portugal, têm tido resultados

 

O paradigma de supervisão que serviu durante os anos que precederam a grande crise assentava na ideia da autoregulação (…) [Essa foi] uma prática e concepção que sofreu entretanto uma alteração de 180 graus

 

Na prática, o BPN perdeu clientes, tanto na área de depósitos com na de crédito, o que significa que não foi agressivo sobre o sistema mas que lhe cedeu quota de mercado (…) O BPN retraiu-se para um nível que, aliás, coloca u  problema ao accionista

 

A minha lógica de trabalho é mais um acto de sedução do que de comando

 

Defendo o actual modelo: a coexistência de supervisão comportamental e da prudencial, lado a lado, mas com as chamadas chinese walls, sem interferências mutuas

 

Relativamente ao caso que menciona [“caso BCP”], e numa prática já seguida pelos governadores anteriores, não participo em decisões. É uma  questão de principio, de forma a não me sentir condicionado na tomada de decisão. Relativamente à actividade presente e futura no BCP, não tenho condicionante nem limitação 

 

 

Relação com Governo

 

Como é próprio de um governador de um banco central, ele [Jean-Claude Trichet] tem de manter a pressão sobre nós, da mesma forma que eu espero manter a pressão sobre quem tem de decidir em matéria de finanças publicas

 

Gostaria até de frisar que [José Sócrates] tem respeitado integralmente a independência e autonomia do BdP mesmo quando nós publicamos números menos agradáveis como os do último Boletim Económico

 

Foi [Teixeira dos Santos] que deu a cara, que fez parte do trabalho, até 2007. O período 2008/2009, só o senhor ministro das Finanças pode explicar. É enfim ele que tem de levar – julgo que a grande custo pessoal – este barco a bom porto

 

Apesar de eu ser o tipo de pessoa que quando se levanta de manhã é como se me levantasse no primeiro dia, mesmo que a véspera tenha sido de grandes preocupações, julgo que o ministro das Finanças me supera!

 

 

Sobre economia

 

Pode dizer-se que estamos em recessão

 

Os recursos disponíveis têm de se orientar para o sector dos bens transacionáveis

 

Temos de ter consciência de que há um limite de utilização da capacidade das empresas exportadoras

 

Nas economias nórdicas, que passaram por algo idêntico no início do anos noventa [crise financeira e crédito], esse processo de balanceamento da poupança interna com as necessidades de financiamento levou quatro/cinco anos

 

Olhamos para os recursos e consideramos que o nosso problema é de financiamento mas em primeiro lugar é de valores, deposi de instituições e em terceiro lugar de políticas. O financiamento vem em último lugar (…) por isso é que propus o Conselho Orçamental

 

O facto de estar a fazer este exercicio de grande risco não pode servir de desculpa para não o cumprirmos (…) Há que ter, por isso, atenção redobrada: todas as forças têm de estar conscientes de que ninguém tira nenhuma vantagem se não cumprirmos os objectivos orçamentais

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Rui Peres Jorge