O que dirá o TC sobre os cortes salariais no privado?

13/07/2012
Colocado por: Catarina Almeida Pereira

Uma semana depois de ter surpreendido o País com o chumbo dos cortes salariais da Função Pública, o Tribunal Constitucional é chamado a pronunciar-se sobre medidas que vão ser aplicadas ao sector privado.

 

As alterações ao Código do Trabalho também têm impacto sobre os salários. Mas as contas são, neste caso, mais difíceis de fazer. Desconhecem-se estimativas oficiais do Governo. Até porque isso não salva o défice orçamental.

 

Os técnicos da Comissão Europeia afirmam que as reformas laborais terão implicações “relevantes” nos custos do trabalho. Num relatório que foi publicado em Dezembro, concluem que só a redução das indemnizações por despedimento – que vão passar de 30 dias de salário por ano trabalhado para “cerca” de dez dias, numa nova alteração à lei a concretizar até ao final do ano – implicam uma redução dos custos do trabalho efectivos em “pelo menos 3%”. Este cálculo tem em conta que antes da crise 4% dos trabalhadores eram despedidos por ano.

 

Nas estimativas de Bruxelas não está considerado o efeito directo do aumento do número de dias de trabalho, da redução do pagamento por horas extraordinárias ou da introdução do banco de horas por negociação individual, (que na prática vai reduzir o montante pago por trabalho suplementar), nem o efeito indirecto da flexibilização dos despedimentos, por exemplo.

 

Os 24 deputados do PCP e do Bloco de Esquerda que assinam o pedido de fiscalização sucessiva, entregue esta semana no Palácio Ratton, consideram que as alterações violam sete artigos da Constituição.

 

Um deles é o polémico artigo 53º, que determina que é” garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos”.

 

Foi com base neste artigo que em Dezembro de 2008 o Tribunal Constitucional chumbou o alargamento do período experimental de 90 para 180 dias, para todos os trabalhadores. O diploma tinha sido elaborado pela então maioria socialista. O pedido de apreciação foi feito por Cavaco Silva.

 

Agora, os limites da “segurança no emprego” serão testados a propósito de outras inovações. A proposta aprovada no Parlamento prevê que o despedimento por inadaptação passe a ser possível ainda que não tenha havido uma modificação prévia ao posto de trabalho, o que abre a porta a despedimentos por “redução continuada” de produtividade ou de qualidade. Nas situações de extinção de posto de trabalho, passa a ser a empresa a definir o critério de quem despede, deixando de ser obrigada a proteger os mais velhos.

 

Não são apenas as alterações ao despedimento que serão analisadas. Há vários artigos em causa:

 

Banco de horas por negociação directa entre trabalhador e empregador

 

O que vai mudar: O novo Código do Trabalho permite que o banco de horas seja directamente negociado entre trabalhador e empregador. Com este regime, o período normal de trabalho pode ser aumentado até mais duas horas diárias, num total de cinquenta semanais, com o limite de 150 horas por ano. Além disso, basta que 75% dos trabalhadores de uma equipa estejam de acordo para que o banco de horas seja estendido aos restantes 25%

 

O que analisará o TC: os deputados entendem que o banco de horas viola os artigos da Constituição que garantem a conciliação do trabalho com a vida familiar (artigo 59º), o direito ao livre desenvolvimento da personalidade (artigo 26ª), à protecção da família (67º), da saúde (64º) e da liberdade sindical (55º).

 

 

Eliminação de feriados, redução de férias e corte no pagamento de horas extra

 

O que vai mudar: O novo Código do Trabalho elimina quatro feriados, bem como a majoração que permitia aos trabalhadores assíduos ter mais três dias de férias (num total de 25), com efeitos a partir de 2013. A compensação por trabalho extraordinário é reduzida para metade e é eliminado o descanso compensatório.

 

O que analisará o TC: Salientando que as medidas implicam mais “sete dias de trabalho por ano, sem qualquer acréscimo na retribuição”, os deputados argumentam que estas normas violam as primeiras alíneas do artigo 59º, que garantem o direito à retribuição do trabalho “segundo a quantidade”, às condições de higiene, segurança e saúde e ao repouso.

 

Sobreposição sobre cláusulas dos convénios colectivos

 

O que vai mudar: O artigo 7º do novo Código do Trabalho estabelece que são nulas as normas de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho que prevejam valores distintos para as compensações por despedimento. Já as que definem formas de pagamento das horas extraordinárias ficam suspensas durante pelo menos dois anos.

 

O que o TC vai analisar: Os deputados argumentam que a anulação ou redução de efeitos de cláusulas definidas nas convenções colectivas violam dois pontos do artigo 56º da Constituição. O primeiro deles diz que “compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei.”

 

[Actualizado a 16 de Julho para incluir as conclusões do relatório publicado pela Comissão Europeia]