O pacto de crescimento de Carlos Costa

09/05/2012
Colocado por: Rui Peres Jorge

 

 

Carlos Costa no Parlamento a 13 de Abril Fonte: Mário Proenca Bloomberg

 

Durão Barroso sintetizou bem a última viragem de ventos na política europeia. Há um “novo consenso” que defende que as políticas de austeridade têm de ser combinadas com crescimento. Dias antes Mario Draghi, Presidente do BCE, havia marcado a agenda, detalhando pormenores da seu “pacto de crescimento”, pedindo uma visão para a Zona Euro daqui a dez anos e, como noticiamos no Negócios, pressionando para que resultados significativos em termos de propostas de política apareçam até ao final deste mês. Os três pilares de crescimento defendidos em Frankfurt são: 1) melhorar e efectivar a “governance” europeia; 2) avançar com reformas estruturais no mercado de trabalho, mas também na concorrência; 3) estimular investimento, sem afectar trajectória de consolidação orçamental. 

 

Neste debate, vale a pena também olhar para o que disse recentemente o Banco de Portugal. Em duas intervenções recentes Carlos Costa, governador, desenhou o seu próprio pacto de crescimento.

 

Num discurso em Paris na delegação da Fundação Calouste Gulbenkian, fez um diagnóstico a várias dimensões da crise europeia (sublinhados nossos):

1) Avanços na governance europeia não são garantia de sucesso, existindo riscos já identificados

 

Um marco importante deste processo foi a aprovação pelo Conselho Europeu, em outubro de 2010, das recomendações do Grupo de Missão sobre a Governação Económica, liderado pelo Presidente van Rompuy. Com base nestas recomendações e num conjunto de propostas apresentado pela Comissão Europeia, a UE reforçou gradualmente a sua arquitetura de supervisão das políticas económicas com iniciativas bem conhecidas como: i) O Pacto Euro Mais; ii) O Semestre Europeu; iii) O pacote de seis atos legislativos (six pack); iv) O pacto orçamental (fiscal compact); e (v) O  pacote de dois projetos de regulamento (two pack).

  

Porém, é ainda prematuro julgar a eficácia deste novo quadro, dado que os benefícios potenciais dependerão amplamente da sua efetiva concretização e do grau de cumprimento das novas regras. A complexidade da nova estrutura de governação económica constitui um motivo de preocupação. O novo modelo deve ser claramente explicado e bem compreendido por todos os intervenientes e promover um tratamento equitativo e condições de igualdade. Um outro desafio passa pela necessidade de estabelecer uma articulação adequada, no contexto do novo quadro, entre os países pertencentes e não pertencentes à área do euro.

 

2) Mutualização de dívida é boa ideia, mas não para já (sublinhados nossos):

Outras inovações institucionais têm sido propostas por académicos, analistas e várias entidades. Entre estas inovações inclui‐se a possível criação de obrigações europeias. (…) A Comissão publicou um Livro Verde sobre a viabilidade da introdução de “obrigações de estabilidade”, destinado a estimular o debate sobre esta matéria.

  

As obrigações europeias não são uma solução para os desafios e dificuldades imediatos enfrentados pela área do euro, embora possam fazer parte de uma solução a médio prazo. A ideia de obrigações europeias é apelativa e realça uma característica importante da integração europeia: a “solidariedade”. No entanto, a emissão destas obrigações coloca muitas questões políticas, jurídicas e técnicas que devem ser analisadas em maior pormenor.

3) Uma estratégia de crescimento em torno de três pilares (sublinhados nossos):

 

É necessário um novo paradigma de crescimento, que produza um crescimento sustentável e não ilusório e que nos permita salvaguardar as características fundamentais do modelo social europeu. Por outras palavras, precisamos de uma estratégia de crescimento e desenvolvimento que nos aproxime da “economia de mercado social altamente competitiva”, orientada para o pleno emprego e para o progresso social, para a melhoria ambiental e para os avanços científicos e tecnológicos advogados pelo Tratado da UE.

  

Esta estratégia de crescimento e desenvolvimento poderia ser construída em redor de três dimensões: reforma institucional e estrutural; conclusão do mercado único; e reforço da dimensão externa da Europa.

 

4) Num outro discurso, dias antes, dedicado ao desafio educativo, Costa evidencia a importância da apostar na educação e formação e defendeu o contrato único (sublinhados nossos):

 

Assim, o nível de educação, isto é o número de anos de escolaridade, explica o lugar que os países menos desenvolvidos ocupam no quadro da especialização intersetorial. A evidência empírica demonstra que a produtividade, o valor acrescentado por ativo e a composição do comércio externo estão correlacionados com a percentagem de estudantes que transitam dos níveis de educação primária e secundária baixa para o nível de educação secundária alta.

  

Por sua vez, o “modo como educam” diferencia os países desenvolvidos. Os maiores níveis de produtividade e/ou os produtos de maior qualidade estão associados a países cujos sistemas de formação profissional têm por base uma estreita articulação entre educação formal e formação profissional no âmbito das próprias empresas e, por outro lado, uma cooperação estreita entre as empresas e os trabalhadores, através das respetivas organizações representativas – os chamados “sistemas duais de educação profissional” (casos da Alemanha, Suíça e Áustria, por exemplo).

  

A segmentação que caracteriza o mercado de trabalho português, onde existe uma importância relativa muito significativa dos contratos com termo, não fomenta a aposta na formação por parte das empresas nem na autoformação dos indivíduos. A reforma do mercado de trabalho no sentido de privilegiar o contrato único seria também um fator potenciador da formação ao longo da vida ativa.

Rui Peres Jorge