Investimento desilude no primeiro trimestre

05/06/2013
Colocado por: Rui Peres Jorge

Afinal, economia portuguesa contraiu 4% no primeiro trimestre, revelou hoje o INE, revendo em baixa em uma décima a estimativa rápida. Paula Carvalho do BPI diz que ”detalhe do PIB reforça riscos negativos” e evidencia evolução muito negativa de consumo privado e, mais importante, do investimento. Economia cairá pelo menos 2,5%, estima. José Moreira do Montepio aponta para contracção de 2,4% com riscos descendentes. Filipe Garcia, da IMF, diz que não haverá forma de cumprir com as metas financeira e económicas enquando o PIB não estabilizar.

 

Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium bcp, BPI, NECEP (Universidade Católica) e IMF, isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.   

 

José Miguel Moreira – Departamentos de Estudos de Montepio

 

1. Estimativa final do PIB do 1ºT2013 apontou para uma contração em cadeia de 0.4%, ligeiramente superior à reportada na estimativa inicial (-0.3%), penalizado essencialmente pelo investimento (FBCF e variação de existências) e pelo consumo privado, e suportado unicamente pelas exportações líquidas.

 

2. A estimativa final do INE para o PIB português do 1ºT2013 apontou para uma contração em cadeia de 0.4%, ligeiramente superior à reportada na estimativa inicial (-0.3%). Ainda assim, tratou-se de um significativo abrandamento do ritmo de contração, sendo inclusivamente a menor descida desde o 1ºT2012 (-0.1%), depois de no 4ºT2012 a economia ter caído 1.8%, a maior queda desde o 1ºT2009, quando a economia mundial se encontrava na Grande Recessão. De resto, também a contração de 0.6% observada no 4ºT2012 no conjunto da Zona Euro foi a maior desde aquele trimestre.

 

3. O atual período de recessão já dura há 10 trimestres, encontrando-se o PIB no nível mais baixo desde o 2ºT2000 e 8.0% abaixo do nível pré-recessão de 2008-09 (aqui considerado como o valor médio de 2007). No ano de 2012 registou-se simultaneamente a menor (-0.1% no 1ºT2012) e a maior contração trimestral durante esta recessão. Note-se que o PIB português é particularmente volátil, sendo que a média móvel de 4 trimestres revelou uma contração de 1.0% face ao ano móvel terminado no 4ºT2012 (i.e. o ano de 2012), a maior desde o 1ºT2009 e a 9ª consecutiva, com o ritmo de contração a intensificar-se nos últimos 4 trimestres.

 

4. A estimativa final veio confirmar na generalidade o que havíamos antecipado acerca do comportamento das diversas componentes do PIB na ótica da despesa, com a principal exceção a caber ao consumo privado, que voltou a contrair, algo que seria expetável num contexto de um forte aumento de impostos, mas que contraria as indicações que eram dadas pelos dados mensais das vendas a retalho e das vendas de automóveis, que nos haviam levado a admitir a possibilidade de um ligeiro acréscimo deste agregado. Ainda assim, consumo privado evidenciou um contributo negativo bastante inferior ao do trimestre anterior (-0.4 p.p. vs -1.5 p.p. no 4ºT2012), mas caindo já pelo 9º trimestre consecutivo e para mínimos desde o 2ºT2000, fortemente penalizado pelo consumo de bens não-alimentares e de serviços. Ainda do lado da procura interna, e conforme havíamos avançado, o PIB foi também bastante penalizado pelo investimento – tanto ao nível do investimento em capital fixo (FBCF), que evidenciou um contributo negativo de 0.4 p.p., se bem que em desagravamento (-0.7 p.p. no trimestre anterior), como da variação de existências, que reverteu sensivelmente o forte contributo positivo do trimestre anterior (-1.2 p.p. vs +1.0 p.p. no 4ºT2012) –, com o consumo público a evidenciar também um contributo negativo (-0.2 p.p. vs -0.1 p.p. no trimestre anterior), neste caso também um comportamento ligeiramente pior do que o que se havia admitido. Já as exportações líquidas revelaram um comportamento em linha com o que tínhamos antecipado, evidenciando um forte contributo positivo (+1.9 p.p. vs -0.5 p.p. no 4ºT2012), refletindo um pronunciado acréscimo exportações e uma forte queda das importações (com contributos de +1.0 p.p. e +0.9 p.p., respetivamente); estas últimas permanecendo muito condicionadas pela bastante fraca dinâmica interna da economia.

 

5. Em termos de perspetivas, para o conjunto do ano de 2013, refletindo esta queda no 1ºT2013 ligeiramente superior àquela por nós admitida, revimos em baixa o crescimento anual do PIB, de uma queda de 2.3% para uma de 2.4%, continuando-se além do mais a admitir alguns riscos descendentes, sobretudo devido ao impacto das novas medidas de austeridade que serão implementadas a partir de 2014 (e que somente não prolongarão a recessão no próximo ano porque se espera uma recuperação da economia europeia). Riscos associados quer ao impacto já este ano das medidas que serão anunciadas em sede de OE-2014, quer das novas medidas anunciadas em sede do retificativo do OE-2013. Na realidade, a previsão de uma queda de 2.4% requer alguma recuperação da atividade no 2º semestre deste ano (algo que não parece ser o cenário central da OCDE no seu último Economic Outlook, publicado a 29 de maio, onde apontou para uma queda anual do PIB de 2.7%).

 

Filipe Garcia – Informação de Mercados Financeiros

 

1. A revisão em baixa face à estimativa inicial não altera significativamente a leitura dos números feita há um mês.

 

2. A divulgação de mais uma taxa de crescimento negativa em cadeia do PIB não pode surpreender, tendo em conta a trajetória dos últimos anos da economia portuguesa bem como a evolução da envolvente externa. Apesar de -0.4% ser melhor do que o esperado e comparar com -1.8% no trimestre anterior, não se pode ainda dizer que a recessão esteja a abrandar. A variação homóloga do PIB continua a agravar-se (-4.0%), o que acontece pelo quarto trimestre consecutivo.

 

3. Não constitui surpresa que seja a procura interna a contribuir de forma mais negativa para o crescimento do produto. Quer o consumo das famílias quer do Estado continuam em ajustamento. Os primeiros a ajustar o impacto fiscal e mais uma queda do emprego (5%) e o Estado a prosseguir no corte da despesa. O ritmo de queda da procura interna ainda não estabilizou.

4. No investimento, salta à vista o péssimo número da construção – que sabemos também ser a principal fonte de crédito malparado e que mostra bem a importância deste sector, bem como os excessos das últimas décadas.

 

5. Porém, o aspeto negativo a destacar neste relatório é o de nova queda no investimento em máquinas e equipamentos. Por si só, este indicador mostra que as empresas não querem ou não podem investir, o que por si só é um mau indicador para o futuro da economia portuguesa. Assim, compreendem-se melhor as medidas de incentivo ao investimento, mas que deveriam ser direcionadas para esta componente do investimento mais reprodutivo.

 

6. Tal como se apresenta a situação, a economia portuguesa só poderá voltar ao crescimento em breve perante uma evolução extraordinariamente positiva do comércio externo – que se afigura difícil tendo em conta a situação económica dos parceiros comerciais. Isto porque a inversão na trajetória da procura interna é improvável no médio prazo.

7. Naturalmente, para que o processo de convergência orçamental acordado tenha alguma hipótese de ter sucesso, será necessário que a economia portuguesa estabilize em termos de queda do produto.  Os números do INE confirmam o que todos observam – essa estabilização ainda não ocorreu. Desta forma, o cumprimento dos objetivos, económicos e financeiros, será consecutivamente adiado até que o produto comece a crescer.

 

 

 Paula Carvalho – Departamento de Estudos do Banco BPI

 

1. O detalhe do comportamento do PIB divulgado pelo INE foi pior que o esperado. Para além da revisão da contracção anual, de uma queda de 3.9% para -4%, o relatório veio confirmar que o consumo das famílias continua em retracção significativa: em termos médios anuais deverá rondar 4% no conjunto do ano mesmo considerando um desagravamento da tendência, e esta componente continua a ter influência determinante no PIB; e sobretudo a componente de Formação Bruta de Capital sofreu uma queda muito acentuada, -16%, levando a uma necessária revisão de cenários.

 

2. De facto, ainda que o Investimento estabilize até final do ano, a taxa anual de variação situar-se-ia em -10.5%. Mesmo admitindo alguns acréscimos em cadeia (dada a volatilidade do agregado, atendendo a eventuais factores de sazonalidade e climatéricos com influência no 1T2013 e reflectindo que as medidas de estímulo anunciadas terão algum impacto positivo no segundo semestre), dificilmente o ritmo de queda será menor que 7%. Acresce referir que a componente externa ainda está sujeita a riscos acrescidos, atendendo ao cenário internacional. Pelo que provavelmente a retracção da actividade rondará 2.5% no conjunto do ano.

 

 

Rui Peres Jorge