Gastos com pensões explicam estagnação portuguesa?

09/05/2013
Colocado por: Rui Peres Jorge

 

Fonte: Yuriko Nakao/Bloomberg

 

Esqueça a concorrência da China, o mercado de trabalho muito rígido ou os gastos públicos discricionários. A explicação para a estagnação da economia portuguesa está nos gastos com pensões – com grandes responsabilidades para os governos de Cavaco Silva – e no mau trabalho desempenhado pelos bancos na primeira década da moeda única – que canalizaram o enorme fluxo de recursos financeiros que chegou a Portugal com o euro para os sectores menos produtivos. Esta é a conclusão de Ricardo Reis, economista e professor na Universidade de Columbia.

 

Em “The Portuguese Slump-Crash and the Euro crisis”, artigo citado por Vítor Gaspar nas suas apresentações e que, depois de apresentado no Brookings, está no menu internacional dos artigos sobre a crise portuguesa, Ricardo Reis analisa a década perdida iniciada em 2000. As suas conclusões interessam para o debate sobre a saída da crise. As duas áreas que identifica como problemáticas estão no centro da receita de ajustamento da troika e do Governo.

A tese de Ricardo Reis é a de que, por um lado, os bancos canalizaram o fluxo de dinheiro que chegou a rodos com a entreda no euro para indústrias com baixa produtividade de sectores não transaccionáveis, com destaque para serviços como a educação ou o comércio.

 

Portugal went through a sharp increase in capital inows from 2000 onwards. Whereas these led to a boom elsewhere, in Portugal they triggered a slump. I argued that this was due to two factors. First, underdeveloped credit markets in Portugal implied that most of the capital inows went to fund unproductive firms in the non-tradable sector. This causes productivity to fall and the real exchange rate to appreciate, and it took resources away from the tradables sector. 

 

O economista não explica o que levou os bancos a esta escolha sem sentido económico. Pode ser que os bancos, em vez de estarem ao serviço da economia, tenham estado ao serviço de sectores pouco produtivos. Reis chama-lhe “mercado de crédito subdesenvolvido”.

 

Mas um segundo factor central para a estagnação foi o aumento da carga fiscal na economia portuguesa para fazer face às despesas com pensões.

 

Second, because of generous past promises on old age pensions, the Portuguese government continuously raised taxes between 2000 and 2007. This discouraged work, and combined with the mis-allocation of resources, produced a slump

O economista concretiza que os governos de Cavaco Silva nos anos 90 e a exisitência de pensões mínimas a todos os reformados num contexto de uma sociedade pobre e envelhecida (as pensões mínimas existem desde há muito tempo mas tiveram um aumento expressivo no Governo de Durão Barroso, com Bagão Félix, como nota o relatório do FMI sobre cortes de despesa, pág. 35).

It is dificult to see signs of large discretionary spending in the data. In fact, in education, culture, or economic affairs, there were cuts in spending during the slump. More than 100% of the increase in total spending comes from a particular sub-category of social protection spending: old age retirement.

 

Previous to the reform [2007], the system's generosity impacted spending through two specic channels. First, Portugal has one of the highest rates of old-age poverty in the OECD (OECD, 2009), and addresses this social concern by having a minimum pension for everyone. The combination of population aging and the slump implied large increased the spending in this anti-poverty aspect of Social Security. Second, the large expansions in the generosity of the system occurred in the early 1990s, especially for public servants. It was during the years of 2000-07 that these past promises came due, and spending rose.

 

Looking at the government, therefore, the more promising shock to explain the slump is the hike in taxes. This was mostly due to the need to keep up with a large increase in spending as a result of the slump or of past promises towards pensions. Portugal set up its welfare state in the early 1990s, and a very generous one that placed a large strain on public finances ten years later. Only by 2007 was there a serious reform of the system and by then taxes had been rising continuous to keep up.

O economista considera que estes são os dois principais factores a explicar a estagnação portuguesa que fragilizou o país. Além de desvalorizar o papel da despesa pública discricionária, Reis desvaloriza também o impacto da entrada da China nos mercados internacionais (vários países sofreram esse choque) e de um mercado de trabalho excessivamente rígido (ficou muito mais flexíveis na última década).

 

Diagnóstico influencia políticas actuais 

 

Especialmente nos últimos meses as despesas com pensões têm estado no centro das políticas de redução de défice orçamental. O argumento é o de que é preciso baixar a despesa pública, para assim reduzir o défice e, logo que possível, permitir uma redução de impostos que estimule a economia.

 

Esta prescrição de política económica tem implícito o diagnóstico de que as despesas do Estado subiram demais – com destaque para pensões (e funcionários públicos) –, o que por sua vez forçou um aumento de impostos que prejudica o crescimento e que é preciso reverter.

 

Ricardo Reis não toma posição no artigo sobre as politicas que estão a ser adoptadas. Mas do diagnóstico resulta que uma provável saída para crise deva ser reduzir a despesa excessiva com pensões – assim se compreende que há uns dias, quando questionado sobre o que pensava do artigo, um investidor em dívida pública portuguesa que lera o artigo, tenha respondido de imediato: “o problema foram as pensões”, validando o planos que o Governo e a troika têm sobre a mesa.

Rui Peres Jorge