Desemprego acima dos 14% nos próximos anos

16/02/2012
Colocado por: Rui Peres Jorge

A taxa de desemprego atingiu os 14%, afectando quase 800 mil pessoas revelou o INE. José Miguel Moreira, do Montepio, salienta a renovação do máximo histórico no desemprego em Portugal e diz que, pelo menos nos próximos 24 meses, o desemprego permanecerá acima dos 14%. Paula Gonçalves Carvalho, do BPI, também espera que a situação no mercado de trabalho continue a piorar, destacando na sua análise o aumento do desemprego entre os jovens e entre os menos qualificados. Bárbara Marques, do Millennium bcp, descreve como “muito expressivo” o aumento no desemprego no último trimestre de 2011, salientanto que o emprego recuou mais do que o PIB. 

   

Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium bcp, BPI e NECEP (Universidade Católica), isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.  

 

Bárbara Marques – Gabinete de Estudos do Millennium bcp

 

1. A taxa de desemprego aumentou para 14% no 4º trimestre (+1,6 p.p. que no trimestre anterior), abrangendo 771 mil pessoas. Trata-se de um aumento muito expressivo que decorre quer do aumento do número de desempregados, quer da diminuição da população empregada. De acordo com o Eurostat, a taxa de desemprego em Portugal no mês de dezembro foi de 13,6%, valor superior ao verificado em média na área do euro (10,4%).

 

2. A população inativa aumentou expressivamente (+1,2% no trimestre) por transição de uma elevada percentagem de pessoas desempregadas (16,2%), o que indicia uma menor predisposição na procura ativa de emprego, em parte devido às menores probabilidades de sucesso na atual conjuntura e aos requisitos mais exigentes e benefícios menores com a atribuição da condição de desempregado.

 

3. A diminuição do emprego foi superior à diminuição verificada no PIB no trimestre, mas semelhante em termos homólogos (de acordo com as nossas estimativas), sugerindo efeitos sazonais nas estatísticas do emprego, mas também esforços de racionalização de custos e de defesa da produtividade por parte dos empregadores. Todos os setores de atividade registaram quebras no emprego no último trimestre do ano, de forma mais acentuada no setor da construção e no setor dos serviços. Estas tendências terão persistido no início de 2012, tendo por base os inquéritos de confiança setoriais e os valores do IEFP para o desemprego registado em janeiro por atividade económica – destaque para o aumento de  17% em relação ao mês homólogo no desemprego nos serviços (atividades imobiliárias, administrativas e serviços de apoio), setor responsável por quase ¾ do volume total de emprego.

 

4. A taxa de desemprego média em 2011 foi de 12,7%. O contexto recessivo em 2012 e a pressão para aumentar a  flexibilidade ao nível empresarial, dado o contexto particularmente incerto, sugerem a manutenção da taxa de desemprego nos valores elevados agora atingidos.

 

  

Paula Gonçalves Carvalho – Departamento de Estudos Económicos e Financeiros do Banco BPI

 

1. A evolução do mercado de trabalho traduzida quer nos números do IEFP quer nos do INE é preocupante na medida em que significa o aumento do ritmo de agravamento da situação no mercado de trabalho. Para além da própria taxa de desemprego, que alcançou um novo máximo histórico, 14%, vários aspectos traduzem esta realidade: o número de desempregados aumentou 25% face ao período homólogo e superou os 700 mil indivíduos; os desempregados de longa duração (desempregados há mais de um ano), são mais de metade do total de indivíduos à procura de emprego; o desemprego entre os jovens aumentou de forma muito expressiva ao longo do ano: era 27% no início do ano; terminou o ano em 35%, ou seja, mais de um jovem (15-24 anos) em cada três está na situação de desempregado. Por outro lado, a informação do IEFP aponta para a manutenção da tendência de agravamento pois a procura de emprego entre indivíduos desempregados continua a aumentar e, em contrapartida, a oferta de novos postos de trabalho encolhe para mínimos históricos. As perspectivas não são, por isso risonhas.

 

2. Em termos puramente matemáticos, a redução da população activa contribui para o aumento da taxa de desemprego. Acresce que a redução ocorreu sobretudo graças ao fluxo de saída de indivíduos provenientes da situação de emprego (2.66% da pop activa) mais do que da situação de desemprego (1.23%). O aumento dos inactivos no trimestre registou-se sobretudo na população jovem e graças ao aumento de estudantes. Na informação anual é também visível aumento do número de domésticos.

 

3. Dois pontos a destacar: 

Por um lado, o desemprego continua a afectar de forma mais preponderante a população menos qualificada, o que significa que compensa a aposta na educação (não só pelo Estado como pelas famílias e empresas): a taxa de desemprego até ao básico e secundário é respectivamente 14% e 13%; para os licenciados é 9%, valores médios anuais em 2011. Não deixa de ser um facto positivo, significa que geralmente vale a pena a aposta, ainda que pela informação publicada não se saiba se estão empregados na área de especialização.

– Por outro lado, destaca-se o facto de entre os inactivos, ter aumentado quer o número de desencorajados quer os indivíduos inactivos mas disponíveis para trabalhar, uma medida de desemprego não visível nos indicadores oficiais.

 

José Miguel Moreira – Departamento de Estudos do Montepio

 

1. A taxa de desemprego fixou-se nos 14.0% no 4ºT2011, um resultado que traduz um enorme agravamento face aos 12.4% observados no trimestre anterior, representando o nível mais elevado da atual e da anterior série histórica. Este aumento da taxa de desemprego resultou do efeito conjugado do decréscimo da população empregada e do acréscimo da população desempregada. Este é apenas o quarto Relatório efetuado após a introdução do modo telefónico de recolha de dados, da consequente alteração do questionário e da adoção de novas tecnologias no processo de desenvolvimento e supervisão do trabalho de campo, pelo que a sua leitura é ainda limitada.

 

2. A população desempregada foi estimada em 771.0 mil indivíduos, renovando níveis máximos históricos, o que, utilizando uma retropolação dos dados históricos, corresponde a um forte acréscimo de 14.5% face ao trimestre homólogo de 2010, em aceleração face à taxa de crescimento de 4.1% do trimestre anterior, representando neste trimestre um comportamento já relativamente consonante com o observado pelo número de desempregados inscritos nos Centros de Emprego, embora neste último caso com uma intensidade bastante inferior (+7.1% vs -2.5% no 3ºT2011). Face ao trimestre anterior, o número de desempregados aumentou 11.8% (+2.2% no 3ºT2011), apresentando também um comportamento mais em linha com a subida observada no desemprego registado (+8.9%), embora igualmente mais acentuado.
 

3. Segundo o INE, para a variação trimestral do desemprego contribuíram essencialmente o aumento no número de homens desempregados, que subiu 14.3% (+50.7 mil indivíduos), explicando 62.3% do aumento global do desemprego. O aumento do desemprego ocorreu nos grupos etários mais baixos. Aumentou 19.9% (+36.1 mil indivíduos) nos indivíduos dos 25 aos 34 anos, tendo aumentado 13.0% (+18.0 mil) nos mais jovens (15 a 24 anos). Nos restantes grupos etários, o desemprego também aumentou, mas o contributo para o aumento global do desemprego foi menor. A duração média do desemprego é um problema de dimensão crescente, já que quanto mais tempo se está sem emprego mais dificuldade se tem em voltar a trabalhar, tendo no 4ºT2011 se assistido a uma evolução desfavorável neste domínio, com o desemprego de longa duração (12 ou mais meses) a aumentar 12.5% (+76.8 mil indivíduos). Da mesma forma, o número de indivíduos à procura de primeiro emprego aumentou em 6.1% (+4.6 mil), embora o seu contributo para o aumento global do desemprego tivesse sido menor. O aumento no número de desempregados à procura de novo emprego teve origem essencialmente no setor dos serviços, onde se assistiu a um acréscimo de 12.4% (+44.1 mil).

 

4. A população empregada foi estimada em 4.735 milhões de indivíduos, representando um decréscimo trimestral de 2.4% (-118.3 mil indivíduos), o que, numa base comparável, corresponde a uma diminuição de 3.0% face ao mesmo trimestre de 2010, em agravamento (-1.2% no trimestre anterior). A distribuição da população empregada por setor de atividade económica era a seguinte: 9.6% dos empregados encontravam-se a trabalhar na agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca; 26.9% na indústria, construção, energia e água e 63.5% nos serviços. No 4ºT2011, foram os dois primeiros setores de atividade referidos que mais viram diminuir a população empregada (-5.4% e -4.4%, respetivamente), pese embora também nos serviços se tenha assistido a uma queda considerável (-1.1%). A população ativa residente em Portugal diminui 0.7%, para 5.543 milhões de indivíduos, enquanto a taxa de atividade da população em idade ativa (15 e mais anos) foi de 60.9%, representando uma diminuição de 0.4 p.p. face ao valor observado no trimestre anterior. Por oposição, a população inativa, composta por 5.147 milhões de indivíduos, aumentou 0.8% face ao trimestre anterior, ao passo que a população inativa com 15 e mais anos aumentou 1.2%.
 

5. Considerando os dados ajustados de sazonalidade (cálculos do Departamento de Estudos do Montepio), a taxa de desemprego no 4ºT2011 é ligeiramente inferior, de 13.9% (12.4% no 3ºT2011), representado o nível mais elevado desde, pelo menos, o 1ºT1977 (considerando os dados ajustados de sazonalidade das séries trimestrais do Banco de Portugal). Esta taxa de desemprego ajustada de sazonalidade no 4ºT2011 é também 0.6 p.p. superior à média das estimativas mensais avançadas pelo Eurostat ao longo do trimestre, o que deverá implicar uma revisão em alta da série mensal da taxa de desemprego do Eurostat.

 

6.  A situação deteriorada em que o mercado laboral se encontra mantém-se como um dos principais constrangimentos para a economia portuguesa, devendo continuar a agravar-se, ademais que este ano será particularmente difícil. De resto, é no sentido de um contínuo agravamento que apontam a generalidade das previsões para o país, sendo essa também a nossa perspetiva, tendo em consideração o conjunto de medidas de ajustamento com que a economia se está a confrontar, devendo permanecer acima dos 14.0% durante este ano e o próximo, e com o pico trimestral máximo da taxa de desemprego a ser atingido somente entre o final deste ano e o início do próximo.

 

7. É também no sentido do agravamento da situação no curto prazo que continuam a apontar os indicadores mais prospetivos, com as expectativas de emprego dos empresários, para os próximos 3 meses, do survey de janeiro da Comissão Europeia a revelarem a 2ª melhoria consecutiva, mas refletindo apenas o desagravamento da situação no setor dos serviços (aquele que tem maior peso na economia), com as expectativas de emprego para o total da economia a manterem-se bastante afastadas do limiar da criação de emprego, sendo que se encontram pelo 13º mês consecutivo a evidenciar uma eliminação de postos de trabalho na economia. Os consumidores (mais sensíveis às medidas de austeridade anunciadas) evidenciaram, por sua vez, uma degradação nas suas expectativas de desemprego para os próximos 12 meses, para níveis que já não eram vistos desde março de 2009, permanecendo em níveis bastante elevados e consistentes com um agravamento do desemprego na economia portuguesa.

 

Rui Peres Jorge