Aumento das taxas de IVA somará 1,1 pontos à inflação

12/03/2012
Colocado por: Rui Peres Jorge

A inflação subiu para 3,6% em Fevereiro. José Miguel Moreira, do Montepio, analisa os números divulgados pelo INE, destaca que a inflação sem energia e bens alimentares está em 2,2%, mas também que o valor da inflação geral se vai manter elevado o resto do ano puxada pelos preços da energia e pelo aumento dos impostos indirectos. Bárbara Marques, do Millennium bcp, evidencia entre os riscos para este ano o impacto das condições climatéricas nos preços dos bens alimentares. 

   

Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium bcp, BPI e NECEP (Universidade Católica), isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.  

 

Bárbara Marques – Gabinete de Estudos do Millennium bcp

 

1.Em janeiro de 2012, o Índice de Preços do Consumidor (IPC) aumentou 3,6% face ao período homólogo (+0,1% em termos mensais e +0,9 p.p. face ao valor médio estimado para a área do euro).

A evolução da inflação foi influenciada por aumentos na classe de transportes (+1,1% no mês), nomeadamente combustíveis e transportes rodoviários de passageiros, refletindo quer a ligeira subida do preço do petróleo no início do ano, quer a alteração de preços administrativos. Não obstante o impacto ter sido menor do que o esperado, não são de excluir aumentos do preço dos combustíveis e dos transportes nos próximos meses. A classe de restauração e hotelaria também apresentou um contributo positivo para a variação mensal do IPC (+0,073 p.p.), devendo ter origem em efeitos desfasados das alterações fiscais para a atividade e bens intermédios introduzidos no início do ano.

2.Em sentido descendente pesou a variação negativa na classe de vestuário e calçado (-5,5% no mês), ainda que com menor intensidade que no mês anterior, devido a efeito sazonal, que deverá inverter de sinal em março com a introdução de novas coleções.

3.Os principais fatores de risco para o futuro próximo centram-se na evolução de fatores exógenos como o preço dos produtos energéticos e dos bens alimentares, estes últimos por influência das condições climatéricas. A nossa projeção para a taxa de inflação média mantém-se próxima de 3,5% em 2012.

 

José Miguel Moreira – Departamento de Estudos do Montepio

 

1. Em fevereiro o índice de preços no consumidor (IPC) registou um crescimento homólogo de 3.6%, acelerando pela 1ª vez nos últimos 4 meses (+3.5% em janeiro), com este ligeiro agravamento a representar assim uma nova interrupção da tendência descendente iniciada em maio, após um longo período de quase 2 anos em ascensão, tendência que já havia sido temporariamente interrompida nos meses de setembro e outubro, na altura colocando a inflação em máximos desde julho de 2010.

 

2. Em termos mensais, o IPC subiu 0.1%, menos do que no mês anterior (+0.5%), mas mais do que no mês homólogo do ano anterior (+0.0%). A classe do vestuário e calçado manteve a tendência negativa, ainda que menos acentuada que a verificada no mês anterior, evidenciando o contributo negativo mais intenso para a variação mensal do IPC (-0.27 p.p.), continuando a refletir a época de saldos e promoções que marca esta fase do ano. Já a contribuir para o crescimento do IPC destacam-se os acréscimos dos preços nas classes de transportes (+0.20 p.p.) e de restaurantes e hotéis (+0.08 p.p.), com esta última a dever ter continuado a refletir a repercussão nos preços finais da reclassificação de taxas de IVA efetuada em janeiro, depois de, juntamente com a classe de produtos alimentares e bebidas não alcoólicas, já ter sido das mais afetadas no mês de janeiro.

3. Recorde-se que, segundo as simulações então apresentadas pelo INE, o impacto mecânico da alteração nas taxas do IVA sobre o nível do IPC será de cerca de 1.1%, mas não se esperando naturalmente que todo esse impacto fosse imediato, sendo de admitir que alguns comerciantes tenham optado por suportar (pelo menos parcialmente e/ou temporariamente) este agravamento, numa tentativa de conseguir ganhar competitividade num contexto de uma procura bastante deprimida.

 

4. A inflação homóloga continuou a ser impulsionada, pela classe dos transportes, que se manteve a evidenciar uma das maiores contribuições, tendo observado uma aceleração, de 4.5% para 5.1%, mas vendo-se pelo 3º mês consecutivo ultrapassada pela classe de habitação, água, eletricidade, gás e outros combustíveis, que registou uma aceleração mais modesta (de +9.6% para +9.7%), mas encontrando-se num nível bem superior e evidenciando um contributo mais elevado (+1.10 p.p. vs +0.88 p.p. no caso dos transportes). As únicas contribuições negativas para a variação homóloga do IPC provieram das classes do vestuário e calçado (-0.13 p.p.), onde os preços terão refletido maiores promoções e saldos face ao mês homólogo do ano anterior, bem como de acessórios, equipamento doméstico e manutenção corrente da habitação, embora aqui de uma forma meramente marginal (-0.02 p.p.).
  
5. A taxa de variação homóloga do IPC core (que exclui a energia e os bens alimentares não transformados) foi de 2.2%, revelando uma aceleração de 0.1 p.p. face ao registo de janeiro, idêntica à verificada no IPC geral, mas mantendo-se num nível bastante inferior à do IPC geral. O diferencial entre a taxa de variação homóloga deste indicador e a do IPC permaneceu negativo pelo 27º mês consecutivo, continuando a evidenciar que as pressões inflacionistas advêm, essencialmente, dos preços da energia. Todavia, a inflação core também não está imune às alterações fiscais que têm vindo a ser efetuadas desde meados de 2010, embora a subida de outubro do IVA na eletricidade e no gás natural não tivesse afetado esta classe.

6. O índice harmonizado de preços no consumidor (IHPC) registou igualmente um acréscimo mensal de 0.1%, tendo a sua variação homóloga também acelerado, de 3.4% para 3.6%, mais que no caso do IPC, encontrando-se agora no mesmo nível. O IHPC português apresenta um crescimento homólogo acima do estimado pelo Eurostat para a Zona Euro (+2.7%), o que acontece desde agosto de 2007, tendo-se assistido a um aumento dessa diferença, de 0.8 p.p. para 0.9 p.p..
  
7. Em termos prospetivos, continuamos a considerar que as atuais pressões inflacionistas assumem um caráter largamente temporário, mas que deverão permanecer elevadas no corrente ano. Com efeito, a inflação no país (medida pela variação homóloga do IPCH) deverá manter-se em níveis elevados em 2012 (+3.2%,de acordo com as nossas perspetivas), apenas ligeiramente inferiores aos 3.6% observados no ano passado, devendo então posteriormente regressar para níveis mais modestos em 2013, para valores em torno de 1.2%. Trata-se, no entanto, de previsões que se deparam atualmente com riscos ascendentes, designadamente para este ano, decorrente dos agravamentos que se têm vindo a observar nos preços da energia, em particular do petróleo.

8. Refira-se que a evolução das principais determinantes dos preços no consumidor, num contexto de crescimentos moderados dos custos salariais (condicionados pelos elevados níveis de desemprego), implicaria uma evolução mais moderada da inflação em 2012. Contudo, a evolução dos preços ver-se-á bastante condicionada por medidas de política orçamental, que determinarão um contributo muito significativo para a inflação no corrente ano, em particular a já referida reclassificação das taxa de IVA aplicadas a alguns bens e serviços, que continuará a refletir-se num agravamento dos preços durante os próximo meses, bem como pelo aumento de preços administrados e de alguns impostos específicos sobre o consumo. Já a contração da atividade económica no país (apontamos para uma queda anual de 3.0% do PIB em 2012), assim como o abrandamento da economia mundial, traduzir-se-ão numa evolução globalmente favorável dos custos de produção, que, conjugada com a dissipação dos efeitos das medidas orçamentais, justificam a forte diminuição da inflação prevista para o próximo ano.

 

 

Rui Peres Jorge