Inflação de 0% em Fevereiro

12/03/2013
Colocado por: Rui Peres Jorge

Os preços não variaram em Fevereiro deste ano face a 2011, mediu o INE. Filipe Garcia, da IMF, comenta os resultados, diz que a inflação só não foi negativa porque o preços dos combustíveis subiu, mas lembra também que Fevereiro é tipicamente um mês de inflação baixa. José Miguel Moreira, do Montepio lê neste valor um sinal de confirmação das análises que vieram fazendo durante o ano passado de que as pressões inflacionistas de 2012 seriam, em grande medida, temporárias. Paula Carvalho sublinha que, excluindo os preços energéticos, a inflação está negativa desde Janeiro, um sintoma da fragilidade da actividade económica.

 

Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium bcp, BPI, NECEP (Universidade Católica) e IMF, isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.

 

Paula Carvalho – Departamento de Estudos do Banco BPI

 

1. A recente tendência da inflação constitui mais um sinal da debilidade da procura interna, pois a taxa de inflação subjacente, excluindo os preços mais voláteis dos bens alimentares e energia, está em terreno negativo desde Janeiro (-0.5% em Fevereiro). O facto de forte contracção da procura só agora se reflectir no andamento da inflação justifica-se pelos aumentos de impostos indirectos implementados em 2011 e 2012, que causando aumentos discretos no índice, influenciam o patamar da taxa de inflação durante um ano, dada a forma de construção do indicador. O facto de os preços dos combustíveis estarem mais estabilizados, embora num nível elevado, contribui também para este cenário.

 

2. A inflação negativa ou muito baixa tem consequências positivas. Por um lado, constitui um factor de compensação para as famílias, favorecendo o rendimento disponível real, ou seja, a efectiva capacidade de aquisição de um determinado cabaz de bens de consumo; por outro lado, favorece a competitividade internacional, nomeadamente dentro dos países da UEM, onde sendo a taxa de câmbio fixa, são os diferenciais de inflação e de evolução salarial que contam para os níveis relativos de competitividade.

 

3. Todavia, este cenário tem também consequências menos favoráveis, sobretudo no que diz respeito aos níveis de endividamento, mais facilmente dissolúveis num ambiente de inflação positiva e elevada. E este é um problema transversal à economia portuguesa, famílias, empresas e estado. Concretamente, no que concerne à dívida pública, um cenário de queda de preços (deflator do PIB) dificultaria o alcance de uma trajectória sustentável, exigindo obtenção de saldos primários excedentários superiores, para o mesmo custo de financiamento.    

 

Filipe Garcia – Informação de Mercados Financeiros

 

1. O mês de Fevereiro é, normalmente, um mês de em que os preços se alteram pouco e essa situação voltou a verificar-se. A queda no “vestuário e calçado volta a merecer destaque” e
mostra a tentativa de adaptação deste sector em acompanhar as dinâmicas do consumo das famílias, que estão francamente preocupadas com a redução do rendimento disponível. O retalho continua a fazer promoções muito fortes para se adaptar a esta realidade. A inflação só não foi mais negativa porque se registaram subidas ligeiras nos preços dos combustíveis.

 

2. No que diz respeito à inflação média, continua o ajustamento em baixa, resultante da diluição do impacto da subida do IVA na energia.

 

3. Estamos curiosos para ver os números relativos a Março, um mês que normalmente apresenta valores altos em termos de inflação pois irá condicionar de forma significativa o valor da inflação média de 2013.

 

José Miguel Moreira – Departamento de Estudos do Montepio

 

1. A inflação, medida pela variação homóloga do IPC, registou uma estabilização homóloga, um registo inferior ao esperado pelo consenso da Bloomberg (-0.1%) e ao observado no mês anterior (+0.2%) e representando a mais baixa leitura desde dezembro de 2009 (-0.1%), dando assim continuidade à tendência descendente evidenciada desde novembro de 2011.

 

2. Em termos mensais, o IPC registou uma diminuição de 0.1%, 0.2 p.p. menor que a verificada no mês homólogo do ano, com este comportamento a ser ditado essencialmente pelos preços do vestuário e calçado, que registaram uma queda de 5.2%, apresentando um forte contributo negativo de -0.34 p.p.. Já a contribuir positivamente para a evolução do IPC esteve sobretudo a classe dos transportes (+0.13 p.p.), associado a um crescimento mensal dos preços de 0.9% e que refletiu essencialmente o agravamento dos preços dos combustíveis.

 

3. A taxa de variação homóloga do IPC core foi de -0.5%, inferior em 0.2 p.p. à observada no mês anterior e permanecendo num nível bastante inferior ao do IPC geral (0.0%). O diferencial entre a taxa de variação homóloga deste indicador e a do IPC permaneceu negativo pelo 39º mês consecutivo, evidenciando que as pressões inflacionistas advinham, em parte, dos preços da energia, mas com a inflação core a também não ter estado imune às alterações fiscais que foram sendo efetuadas desde meados de 2010.

 

4. Estes primeiros dados do ano para a inflação parecem assim vir confirmar as nossas perspetivas, de que as anteriores pressões inflacionistas assumiam um carácter largamente temporário. Assim, depois da inflação no país (medida pela variação homóloga do IHPC) ter abrandado dos 3.6% observados em 2011 para 2.8% em 2012, continuando ainda acima da média da Zona Euro – refletindo, essencialmente, o impacto de alterações da tributação indireta e de preços condicionados por procedimentos de natureza administrativa em 2011 e 2012, no contexto das medidas de consolidação orçamental incluídas no programa de ajustamento económico e financeiro (PAEF) acordado com a troika –, prevemos que a dissipação desses efeitos temporários ao longo do presente ano, em conjugação com uma descida do preço médio anual do petróleo, um crescimento relativamente moderado dos preços de importação de bens não energéticos, a manutenção de uma forte moderação salarial – refletindo a intensa recessão económica que o país atravessa (apontamos para uma queda anual de 3.0% do PIB em 2012 e de 2.0% em 2013), bem como as novas medidas de austeridade já anunciadas –, e a continuação da deterioração do mercado laboral, se traduza num regresso da inflação para níveis bem mais modestos em 2013, devendo a inflação ficar abaixo de 1%, em cerca de 0.8%.

 

Rui Peres Jorge