Inflação abranda mas pouco

12/04/2012
Colocado por: Rui Peres Jorge

A taxa de inflação recuou para 3,1% em Março. José Miguel Moreira, do Montepio, evidencia a quarta queda deste indicador em cinco meses, mas avisa que a inflação deverá premanecer elevada este ano em torno dos 3%, muito devido ao impacto das subidas das taxas de IVA. Bárbara Marques, do Millennium bcp, evidencia os impactos em alta nos preços decorrentes nova colecção Primavera/Verão no vestuário e das subidas de impostos. Aponta para uma taxa de inflação média no ano de 3,5% este ano.

   

Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium bcp, BPI e NECEP (Universidade Católica), isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.  

 

Bárbara Marques – Gabinete de Estudos do Millennium bcp

 

1. Em março de 2012, o Índice de Preços do Consumidor (IPC) aumentou 3,1% face ao período homólogo, uma evolução em linha com as expectativas (+1,2% em termos mensais e +0,5 p.p. face ao valor médio estimado para a área do euro). A inflação subjacente (excluindo a alimentação e a energia) foi de 1,9%, destacando o contributo expressivo dos combustíveis para a inflação, dentro de um registo de grande volatilidade. Contudo, a evolução mensal apresenta um comportamento próximo do verificado pelo índice geral.

 

2. A evolução da inflação em termos mensais foi influenciada no sentido ascendente pela variação dos preços do vestuário e calçado (+25,3%), correspondendo a um efeito sazonal com a entrada da nova coleção primavera/verão, e pela subida de preços dos transportes (+1,6%) e das bebidas, álcool e tabaco (+2,5%), por efeitos fiscais de alteração das taxas de imposto e administrativas associadas. Em sentido descendente atuaram os menores custos com Saúde (-0,6%), associado aos preços dos medicamentos, a despesa com o lazer (-0,7%), e os produtos alimentares (-0,1%).

 

3. O impacto da redução da despesa de consumo nos preços não aparece muito generalizado. A título de exemplo, embora os preços da categoria de vestuário e calçado estejam 6% mais baratos face a março do ano passado, esta categoria apresenta variações típicas para esta fase do ano, ao passo que os serviços associados ao lazer parecem estar a ajustar mais significativamente o preço à maior debilidade da procura.

 

4. A nossa projeção para a taxa de inflação média mantém-se em torno dos 3,5% em 2012, embora de futuro possam surgir pressões de sentido divergente: as alterações fiscais implícitas ao orçamento retificativo relacionadas com o imposto sobre o tabaco e a taxa sobre a segurança alimentar poderão traduzir-se num aumento dos preços finais ao consumidor, embora possa ser moderado pela diminuição dos preços dos medicamentos.

  

 

José Miguel Moreira – Departamento de Estudos do Montepio

 

1. Em março o índice de preços no consumidor (IPC) registou um crescimento homólogo de 3.1%, desacelerando pela 4ª vez nos últimos 5 meses (+3.6% em fevereiro), para um mínimo desde agosto de 2011, e retomando assim a tendência descendente iniciada em maio, após um longo período de quase 2 anos em ascensão, tendência que foi pontualmente interrompida no mês passado e que já havia sido temporariamente suspendida em setembro e outubro, na altura colocando a inflação em máximos desde julho de 2010.

 

2. Em termos mensais, o IPC subiu 1.2%, bem mais do que no mês anterior (+0.1%), refletindo a sazonalidade típica destes meses, mas menos do que no mês homólogo do ano anterior (+1.6% em março de 2011). A classe que mais contribuiu para a variação do índice total foi a do vestuário e calçado, evidenciando um forte contributo de 1.23 p.p., associado a um crescimento mensal dos preços de 25.3%, refletindo a entrada da nova coleção de primavera/verão. Com este registo, a classe de vestuário e calçado inverteu a recente tendência negativa (contributo de -0.27 p.p. em fevereiro), que havia estado associada à época de saldos e promoções que marcou essa fase do ano. Também a contribuir para o crescimento do IPC continuaram a estar os acréscimos dos preços nas classes de transportes (+0.24 p.p.) e de bebidas alcoólicas e tabaco (+0.08 p.p.). A classe de produtos alimentares e bebidas não alcoólicas registou uma queda mensal de 0.2%, parecendo querer demonstrar que já se desvaneceu os impactos das subidas do IVA resultantes das alterações nas classes de alguns produtos alimentares.  

 

3. Recorde-se que, segundo as simulações então apresentadas pelo INE, o impacto mecânico da alteração nas taxas do IVA sobre o nível do IPC seria de cerca de 1.1%, mas não se esperava naturalmente que todo esse impacto fosse imediato, admitindo-se que alguns comerciantes tenham optado por suportar (pelo menos parcialmente e/ou temporariamente) este agravamento, numa tentativa de conseguir ganhar competitividade num contexto de uma procura bastante deprimida.

 

4. A inflação homóloga continuou a ser impulsionada, pela classe dos transportes, que se manteve a evidenciar uma das maiores contribuições, não obstante ter observado uma ligeira desaceleração, de 5.1% para 4.8%, mas vendo-se pelo 4º mês consecutivo ultrapassada pela classe de habitação, água, eletricidade, gás e outros combustíveis, onde os preços cresceram ao mesmo ritmo do mês anterior (+9.7%), bem superior aos dos transportes e evidenciando um contributo igualmente mais elevado (+1.11 p.p. vs +0.82 p.p. no caso dos transportes). As únicas contribuições negativas para a variação homóloga do IPC provieram da classe do vestuário e calçado (-0.29 p.p.), bem como, embora mais marginalmente, das classes de acessórios, equipamento doméstico e manutenção corrente da habitação e de lazer, recreação e cultura (-0.02 p.p. e -0.01 p.p., respetivamente).
  

5. A taxa de variação homóloga do IPC core (que exclui a energia e os bens alimentares não transformados) foi de 1.9%, revelando uma desaceleração de 0.3 p.p. face ao registo de fevereiro, inferior à verificada no IPC geral (-0.5 p.p.), mas mantendo-se num nível bastante inferior à do IPC geral. O diferencial entre a taxa de variação homóloga deste indicador e a do IPC permaneceu negativo pelo 28º mês consecutivo, continuando a evidenciar que as pressões inflacionistas advêm, essencialmente, dos preços da energia. Todavia, a inflação core também não está imune às alterações fiscais que têm vindo a ser efetuadas desde meados de 2010, embora a subida de outubro do IVA na eletricidade e no gás natural não tivesse afetado esta classe.

 

6. O índice harmonizado de preços no consumidor (IHPC) registou igualmente um acréscimo mensal de 1.2%, tendo a sua variação homóloga também desacelerado, de 3.6% para 3.1%, permanecendo ao mesmo nível do IPC. O IHPC português apresenta um crescimento homólogo acima do estimado pelo Eurostat para a Zona Euro (+2.6%), o que acontece desde agosto de 2007, tendo-se assistido a uma diminuição dessa diferença, de 0.9 p.p. para 0.5 p.p..
  
7. Em termos prospetivos, continuamos a considerar que as atuais pressões inflacionistas assumem um caráter largamente temporário, mas que deverão permanecer elevadas no corrente ano. Com efeito, a inflação no país (medida pela variação homóloga do IPCH) deverá manter-se em níveis elevados em 2012 (+3.2%, de acordo com as nossas perspetivas), apenas ligeiramente inferiores aos 3.6% observados no ano passado, devendo então posteriormente regressar para níveis mais modestos em 2013, para valores em torno de 1.3%.

8. Refira-se que a evolução das principais determinantes dos preços no consumidor, num contexto de crescimentos moderados dos custos salariais (condicionados pelos elevados níveis de desemprego), implicaria uma evolução mais moderada da inflação em 2012. Contudo, a evolução dos preços ver-se-á bastante condicionada por medidas de política orçamental, que determinarão um contributo muito significativo para a inflação no corrente ano, em particular a já referida reclassificação das taxa de IVA aplicadas a alguns bens e serviços, bem como pelo aumento de preços administrados e de alguns impostos específicos sobre o consumo. Já a contração da atividade económica no país (apontamos para uma queda anual de 3.2% do PIB em 2012), assim como o abrandamento da economia mundial, traduzir-se-ão numa evolução globalmente favorável dos custos de produção, que, conjugada com a dissipação dos efeitos das medidas orçamentais, justificam a forte diminuição da inflação prevista para o próximo ano.

Rui Peres Jorge