Uma economia em estado de choque

14/02/2013
Colocado por: Rui Peres Jorge

Economia terá contraído 3,2% em 2012, revelou o INE. Este é o resultado de um último trimestre do ano muito negativo que desapontou a maioria das previsões. Rui Bernardes Serra, do Montepio, salienta que foi mesmo o pior trimestre desde o início de 2009, “quando a economia mundial se encontrava em plena Grande Recessão” e diz que a contracção do PIB em 2013 deverá ficar entre os 2% e os 2,5%. O resultado do trimestre é tão mau que a equipa de economistas do NECEP, da Universidade Católica, admite que possam existir factores excepcionais com grande impacto nos resultados, como o ajustamento aos anúncios de austeridade do Governo. É o nono trimestre de recessão, vincam. Ricardo Santos, do BPN Paribas (em inglês), refere um “choque de confiança” e aponta para uma recessão de 2,7% em 2013.  

 

Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium bcp, BPI, NECEP (Universidade Católica) e IMF, isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.

 

Rui Bernardes Serra – Departamento de Estudos do Montepio

 

1. A estimativa preliminar do INE para o Produto Interno Bruto (PIB) português do 4ºT2012 revelou-se pior do que o esperado, ao apontar para uma queda de 1.8%, superior às nossas perspetivas, que eram idênticas à mediana das projeções das instituições contactadas pela Bloomberg (-1.0%). Trata-se de uma duplicação do ritmo de contração observado no 3ºT2012 e da maior queda desde o 1ºT2009, quando a economia mundial se encontrava em plena Grande Recessão.

 

2. Assim, apesar de com esta estimativa inicial o INE ainda não divulgar dados em cadeia em detalhe do PIB, face a este resultado, continuamos a considerar que, na ótica da despesa, a procura interna terá permanecido condicionada pelos efeitos das fortes medidas de austeridade que já se encontravam em vigor em 2012, bem como pelo anúncio de um novo conjunto de fortes medidas de austeridade para 2013 – que representam um enorme agravamento da carga fiscal, com destaque para as alterações no número de escalões de IRS, a aplicação de uma sobretaxa de IRS e o agravamento da tributação das pensões mais elevadas –, as quais acabaram desde logo por se começar a refletir na atitude dos agentes económicos.

 

3. A procura interna terá sido a mais penalizada, com o consumo privado (cerca de -2.5%) e, sobretudo, o investimento (cerca de -6.0%) a deverem ter registado as maiores contrações. Já as exportações líquidas terão evidenciado um contributo positivo, com a queda estimada para as exportações – em resultado da intensificação do ritmo de contração da Zona Euro no final do ano passado – a dever ter sido mais do que compensada pela superior retração das importações, muito condicionadas pela bastante fraca dinâmica interna da economia. Refira-se que parte do nosso erro de previsão terá vindo das exportações, que terão caído não pouco mais de 1%, mas cerca de 2%.

 

4. Na ótica da oferta, é provável que a descida do VAB tenha sido inferior, mas os principais setores terão observado uma intensificação do ritmo de contração, com a maior queda a observar-se na construção (entre -6% e -8%), seguida da indústria (entre -1% e -2%) e dos serviços (entre -0.5% e -1.5%). Esta maior queda da economia portuguesa no 4ºT2012 teve consequências para o comportamento anual, pelo que no conjunto do ano de 2012 acabou por se observar uma diminuição do PIB de 3.2% (-1.6% em 2011), uma contração superior à nossa previsão (-3.0%, idêntica à do Banco de Portugal e à da troika).

 

5. As previsões de uma descida do PIB de 2% em 2013 parecem agora um pouco irrealistas, na medida que o carry-over negativo é de 2%. Isto é, se o PIB ao longo dos 4 trimestres de 2013 fosse idêntico ao do 4ºT2012 a economia cairia 2%. Neste sentido, é agora provável que a contração do PIB em 2013 seja entre 2.0% e 2.5%. 

 

Núcleo de Estudos de Conjuntura sobre a Economia Portuguesa (NECEP) da Universidade Católica

1. No 4º trimestre de 2012, a economia portuguesa registou uma contração de 1,8% face ao trimestre anterior e de 3,8% em termos homólogos (-0,9% e -3,5%, respetivamente, no 3º trimestre). Este é o nono trimestre consecutivo de quebra do PIB e a maior queda desde o 1ºT de 2009. A taxa média de crescimento do PIB em 2012 foi de -3,2% (-1,6% em 2011).

 

2. Um aspeto relevante nos dados do 4º trimestre é que diferem bastante (pela negativa) da generalidade das previsões feitas no último trimestre do ano, sendo que o mesmo já havia sucedido no 4º trimestre de 2011. Neste sentido, é legítimo supor que há fenómenos estatísticos, de calendário e comportamentais (relacionados, por exemplo, com a incerteza relativa ao impacto das medidas orçamentais anunciadas para o ano seguinte) que podem explicar uma parcela importante desta quebra tão forte do PIB no 4º trimestre. Acresce que a supressão do subsídio de Natal pode ter alterado de forma relevante o perfil intra-anual da atividade económica, influenciando adicionalmente a trajetória “tradicional” do PIB.

 

3. Em qualquer caso, os dados do 4º trimestre de 2012 são claramente negativos, consistentes com o aumento do desemprego verificado no mesmo período e com a forte deterioração observada em dezembro em vários indicadores domésticos e externos (e.g., consumo, investimento, produção, encomendas e exportações).

 

 

Ricardo Santos – BNP Paribas (excertos de nota enviada a clientes)

 

1. The full breakdown is due to be released by the Statistics Institute on 11 March. But the Institute said in its press release today that the positive contribution from net trade had diminished substantially, as exports contracted and imports fell by less than in previous quarters.

 

2. On a less negative note, internal demand decreased less than it had in the same period the previous year, primarily due to a less pronounced fall in investment. Confirmation of this could have negative implications for the coming quarters. Exports and the contribution of net trade have been the only things propping up the Portuguese economy, so a greater slowdown at this stage could pose increasing risk to activity going forward.

 

3. While some of this weakness was due to one-off factors, such as dock-worker strikes that ended only in early January, the main culprit was the announcement of further tightening by the government on 12 September and the negative shock it gave to confidence, which lasted until the end of 2012.

 

4. The survey data released two weeks ago, however, showed some improvement for the first time since September. Consumer confidence increased to -58.7 in January from -59.8 in December and the economic climate indicator increased to -4.3 in January, its third consecutive increase, after hitting -4.6 in October 2012.

 

5. While we expect GDP to continue to contract, we expect the pace of contraction to ease somewhat in Q1, for a quarterly fall of around 1%. The impact on domestic activity of fiscal tightening should ease and exports should contract less, as the worst of the economic slump in the economies of Portugal's main trading partners has probably passed. For 2013 as a whole, we expect GDP to fall by 2.7%.

 

6. However, downside risks remain. We cannot rule out another confidence shock like the one we saw in September 2012. The government is expected to present by the end of this month a detailed plan for EUR 4bn of spending cuts to be implemented mostly in 2014. If the measures are in line with the recommendations set out by the IMF and mostly based around permanent cuts in pensions and civil-service wages, this could lead to a further fall in consumer confidence and consumption from Q2.

Rui Peres Jorge