Portugal enfrenta dois anos de mínimos históricos na inflação

12/11/2013
Colocado por: Rui Peres Jorge

A inflação em Portugal regressou a terreno negativo. Filipe Garcia, da Informação de Mercados Financeiros, explica que os preços dos transportes (muito influenciados pelos combustíveis e lubrificante) estão a ser decisivos para a evolução dos preços. A inflação média está em terreno positivo, mas deve continuar a cair “pelo menos até final do ano”, diz o economista. José Miguel Moreira, do Montepio, aponta para que, no final do ano, a inflação média (medida pelo índice harmonizado europeu) fique nos 0,5% este ano, subindo ligeiramente para 0,8% em 2014. A confirmar-se serão valores que serão os segundos mais baixos “desde que existem registos”, apenas superados “pela queda de 0.9% registada em 2009, depois do colapso dos preços do petróleo”. Finalmente, Paula Carvalho do Banco BPI, aponta os prós e os contras da inflação baixa: por um lado, alívia as famílias de aumentos de preços e facilita ganhos de competitividade externa, mas por outro, significa que a economia crescerá menos, dificultando a desalavancagem da economia.  

 

Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium bcp, BPI, NECEP (Universidade Católica) e IMF, isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.   

 

Paula Carvalho – Departamento de Estudos do Banco BPI

 

1. A taxa de inflação caiu de novo para valores negativos quando medida em termos homólogos. Embora se assemelhe à situação de 2009, a situação actual é bem diversa, na medida em que traduz sobretudo o reflexo de factores condicionantes internos, na ausência de uma pressão ascendente sobre o preço dos combustíveis (factor de influência externa) ou na ausência de impulsos artificiais sobre os preços que decorrem do impacto dos aumentos de impostos indirectos. Dado que actualmente estes dois factores estão, por ora, maioritariamente ausentes (ainda que não na sua globalidade pois, como recorda a nota do INE, “a taxa de variação média continua a ser influenciada pelas alterações na distribuição das taxas do IVA sobre alguns bens e serviços, com particular destaque para alguns produtos alimentares e bebidas não alcoólicas e para a restauração, ocorridas em Janeiro de 2012”), o comportamento dos preços praticados ao consumidor traduz, de facto, a situação de fragilidade da procura interna. Repara-se que esta é uma situação comum a todos os países que estão sob escrutínio/ajustamento, para além de Portugal, a Grécia, Irlanda, Chipre, Espanha, todos eles com taxas de inflação (em Setembro) inferiores à média da região do euro.

 

2. Não é provável que Portugal entre numa espiral deflacionista, inclusivamente atendendo à dinâmica da actividade económica, gradualmente mais positiva. Todavia, a taxa média de inflação não deverá regressar acima do patamar de 1% tão cedo, possivelmente até próximo do final de 2014.

 

3. Pelo lado positivo, a queda da taxa de inflação traduz a reposição de competitividade externa, processo pelo qual estão também a passar as restantes economias em ajustamento. E uma taxa de inflação mais baixa significa maior poder de compra real das famílias, favorecendo as trajectórias de recuperação da procura interna. Pelo que se se assumir como temporária, esta tendência acaba por ser benigna.

 

4. Existe, no entanto, um lado menos bom de uma inflação negativa ou baixa. Efectivamente, dado o peso do consumo privado no Produto, esta evolução repercutir-se-á sobre o andamento do deflator do PIB…parte integrante, por construção, do PIB nominal. O que na situação de uma economia muito endividada, estado, empresas e famílias não têm a sua tarefa facilitada no que diz respeito ao esforço de desalavancagem.

 

Filipe Garcia – Informação de Mercados Financeiros

 

1. A inflação saiu abaixo do esperado em Outubro, ao registar uma variação mensal nula num mês que em média tem sido positiva, entre 0,3%-0,4%. O maior destaque está no facto de a inflação homóloga sair negativa, o que acontece pela primeira vez desde o final de 2009, se ignorarmos um registo marginalmente negativo (-0.03%) que aconteceu em Fevereiro deste ano.

 

2. As habituais subidas do vestuário e calçado foram compensadas por reduções ao nível da classe de transportes que incluem a redução nos combustíveis. Deve notar-se que em Outubro o câmbio do euro face ao dólar atingiu o valor mais alto em quase dois anos e que os preços do Brent se mantiveram estáveis.

 

3. Olhando para a evolução num prazo mais longo, nota-se a tendência de queda da inflação média, o que já sucede quase ininterruptamente desde Março de 2012. Esta tendência explicou-se até Outubro pela dissipação dos efeitos do aumento do IVA, mas o que se destaca nesta fase é a fraca dinâmica da procura interna e a estabilidade nos preços internacionais.

 

4. Deve notar-se que o comportamento da inflação em Portugal não é dissonante do que acontece no resto da zona euro. Aliás, esse contexto levou o BCE a cortar taxas na semana passada dados os receios de deflação no futuro. A inflação média apresenta agora o valor mais baixo desde Agosto de 2010. É de esperar que a inflação média continue a recuar pelo menos até ao final do ano.

 

José Miguel Moreira – Departamento de Estudos do Montepio

 

1. A inflação, medida pela variação homóloga do IPC, passou em Outubro de 0,1% para -0.2%, contrariando as expectativas do mercado de uma estabilização (consenso: +0.1%). Trata-se da 4ª desaceleração consecutiva, com a variação dos preços a retomar a tendência descendente que vem a evidenciar desde Nov-11, registando-se a primeira queda dos preços desde Dez-09 (-0,6%).

 

2. A contribuir mais intensamente para a queda homóloga dos preços continuou a estar a classe dos transportes, que viu o contributo negativo agravar-se de -0,52 pontos percentuais (p.p.) para -0,57 p.p., mas sendo de realçar o comportamento evidenciado pelos produtos alimentares e bebidas não alcoólicas, que permanecerem a evidenciar um contributo positivo, mas bastante menos intenso que no mês anterior (+0.1 p.p. vs +0.37 p.p. no mês anterior).

 

3. A taxa de variação homóloga do IPC core foi de 0,2%, depois de ter crescido 0,3% no mês anterior, permanecendo pelo 2º mês consecutivo num nível superior ao do IPC geral (-0,2%). Os dados da inflação conhecidos para este ano continuam a confirmar as nossas perspectivas, de que as anteriores pressões sobre os preços advinham essencialmente das commodities (em concreto da energia) ou de alterações fiscais e assumiam um carácter largamente temporário.

 

4. Assim, prevemos que a dissipação desses efeitos temporários ao longo do presente ano, em conjugação com uma descida do preço médio anual do petróleo, um crescimento marginal dos preços de importação de bens não energéticos e a manutenção de uma forte moderação salarial, se traduzam numa redução da inflação (medida pela variação homóloga do IHPC) em 2013 para cerca de 0.5% (e para +0.8% em 2014) – representando em ambos os casos uma revisão em baixa em 0.1 p.p. face às nossas anteriores previsões –, um valor que é o 2º mais baixo desde que existem registos, apenas superado pela queda de 0.9% registada em 2009, depois do colapso dos preços do petróleo.

Rui Peres Jorge