Economia portuguesa tem reagido de forma mais negativa à austeridade. Fonte: Mário Proença/Bloomberg
O crescimento económico parece estar a tornar-se uma espécie de mito sebastiânico do Portugal pós-crise financeira. Nos seis anos entre 2008 e 2013, conta-se um de criação de riqueza, outro de estagnação e quatro de recessão. 2014 continua a ser um grande ponto de interrogação.
Desde o início do programa da troika, a dimensão das revisões de estimativas de evolução do PIB tem sido impressionante. Neste ano e meio, 2013 deixou de representar o momento de arranque de uma retoma robusta, para passar a ser mais um ano abaixo da linha de água. 2014 passou do ano com maior crescimento anual do PIB desde 2000, para estar cada vez mais próximo da estagnação.
Mesmo concedendo que o governo teve de alterar parte da sua estratégia inicial (decisão do Tribunal Constitucional, deterioração da economia europeia, etc), as diferenças são drásticas. Em Julho de 2011, o governo e a troika previam que a economia portuguesa crescesse 1,2% em 2013. Em Abril de 2012 essa estimativa foi revista para 0,3% e, em Junho, para 0,2%. Em Setembro é realizada a última revisão para -1%, previsão que se mantém actualmente. Uma diferença de 2,2 pontos percentuais face às estimativas iniciais.
E o fosso pode ainda ser muito maior. Nenhum organismo nacional ou internacional partilha do “optimismo” do governo e da troika para este ano. O Banco de Portugal espera uma recessão de 1,9% este ano, a OCDE 1,8% e a Universidade Católica 2,4%. Os gigantes Coface, Nomura e Citigroup antecipam quedas do PIB de 2%, 2,7% e 4,6%, respectivamente. Em média, estas cinco entidades esperam uma recessão de 2,6% em Portugal. Muito longe dos 1% de Vítor Gaspar e da troika.
As previsões para 2014 seguiram um padrão similar a 2013, ainda que menos drástico, passando de 2,5% de crescimento para os actuais 0,8%. O Banco de Portugal e a OCDE estão um pouco mais optimistas, com estimativas de 1,3% e 0,9%, respectivamente, enquanto a Católica ainda espera uma recessão de 0,6% no próximo ano.
Esta fragilidade económica teve reflexos directos no mercado de trabalho. Ainda antes de 2013 começar, as previsões taxa de desemprego para este ano já tinham sido revistas quatro vezes. Num ano, passou de 13,6% para 16,4%. No relatório do Artigo IV, o FMI antecipa que o desemprego oficial comece a descer a partir de 2014, mas que o desemprego estrutural – que demora mais a reduzir e diz respeito ao desencontro entre a força de trabalho disponível e as necessidades das empresas – continuará a subir, pelo menos até atingir os 14,3%, em 2017.
No mesmo documento, o FMI inclui um artigo intitulado “Quão rápido pode Portugal crescer?” Nela, o Fundo considera que um “crescimento mais alto é uma matéria de urgência para Portugal”, com consequências para o emprego e as receitas do governo. Apesar de considerar pouco provável que Portugal regresse aos níveis de crescimento pré-entrada no euro, o FMI diz ser “realista” crescer a 2% no longo prazo.
Uma meta aspiracional algo desanimadora.
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