O estranho caso da rigidez do mercado laboral

25/01/2011
Colocado por: Pedro Romano

O indicador mais comummente utilizado para avaliar a rigidez do mercado laboral é o Employment Protection Legislation (EPL), um índice calculado pela OCDE que tenta captar os entraves legais à contratação e despedimento. Pontos fortes: é simples, fácil de interpretar, abrangente e está disponível para um conjunto alargado de países. Mas, baseando-se no que diz a Lei, tem a infeliz limitação de poder ser enganador sempre que as práticas concretas dos empregadores divergirem significativamente das prescrições legais – seja por falta de fiscalização, seja por problemas de aplicação da Lei.  

 

Como ultrapassar esta limitação? Uma solução passa pela criação de um indicador alternativo, que tente capturar a rigidez laboral através da observação de características do mercado de trabalho. Foi precisamente isso que quatro investigadores das Universidades de Coimbra e do Minho fizeram num artigo intitulado  “sectoral labour market flexibility in a small open economy”, utilizando a base de dados “Quadros de Pessoal” para seguir de forma mais directa o que de facto se passa no mercado de trabalho. Como se baseia em informação pormenorizada, tem o benefício de permitir analisar o grau de rigidez laboral por sector

 

O EPL quantifica o grau de rigidez laboral em três eixos diferentes: a protecção contra despedimento individual, as restrições ao despedimento colectivo e o grau de regulamentação dos contratos temporários. Para estes indicadores, Fernando Alexandre, Pedro Bação, João Cerejeira e Miguel Portela propõem três proxys: a percentagem de trabalhadores a trabalhar acima do salário mínimo – quanto maior for, maior margem terá a empresa para ajustar os seus níveis salariais sem a pressão imposta pela subida do salário compulsório – a percentagem de trabalhadores que não cobertos por contratos colectivos de trabalho e a percentagem de trabalhadores que não trabalha a tempo inteiro.

 

Resultados? Não é possível saber de que forma é que Portugal compara com os restantes países, já que o indicador apenas foi calculado para Portugal, mas uma coisa é certa: apesar de o nível de rigidez ser incerto, a variação do nível confirma aquilo que o EPL tem vindo a indicar – o grau de protecção das relações laborais tornou-se mais baixo sensivelmente desde o final da década de 90. O indicador baseado na base de dados “Quadros de Pessoal” segue o EPL de perto, mas com um atraso óbvio. Uma idiossincrasia que, conjecturam os autores, pode dever-se ao facto de as empresas demorarem algum tempo a adaptar as suas práticas contratuais às alterações legislativas.

 

O grau de protecção laboral também diverge significativamente ao longo dos vários sectores. Aparentemente, os sectores mais especializados e com mais intesidade tecnológica beneficiam de maior flexibilidade, gerindo com mais facilidade a utilização do factor trabalho no processo produtivo. Mas é difícil encontrar uma regra geral: os sectores onde há mais flexibilidade, por exemplo, são precisamente indústrias não diferenciadas, como a “construção e reparação de navios e barcos”. Mais importante, ao longo dos últimos anos tem-se verificado um elevado grau de convergência entre os vários sectores no que diz respeito à protecção laboral.

 

Como aplicação prática do índice, os autores utilizaram-no num modelo de variações no emprego por sector. Os resultados da aplicação econométrica mostram que o impacto da alteração da taxa de câmbio real varia consideravelmente conforme com a) grau de abertura ao comércio; b) intensidade tecnológica; c) flexibilidade do mercado laboral. De facto, os sectores mais afectados pelas alterações na taxa de câmbio real foram aqueles que tinham maior exposição ao comércio, menor intensidade tecnológica e… maior flexibilidade laboral.

 

 

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