Vítor Gaspar nas reuniões anuais do FMI em Washington no ano passado Fonte: Joshua Roberts/Bloomberg
Uma pequena caixa no último relatório semestral do FMI sobre a economia mundial (Box 1.1 do World Economic Outlook) causou impacto um pouco por todo o mundo. Olivier Blanchard, economista-chefe do Fundo e Daniel Leigh, também economista em Washington, confirmam um cenário temível: durante a Grande Recessão (desde 2007) os efeitos da austeridade sobre o crescimento têm sido muito superiores ao que se assumia até agora. São erros que custam caro. Que o diga Portugal que experimentou uma subida dramática do desemprego no último ano, contrariando todas as previsões da troika e do Governo.
Ao contrário do que se possa pensar, muita da política económica é feita por regras relativamente básicas. Uma das mais conhecidas é a de que um corte (aumento) de um ponto percentual no défice estrutural (o que exclui medidas temporários e o efeito do ciclo económica) rouba (adiciona) 0,5 pontos percentuais na taxa de crescimento da economia nesse ano. Em gíria económica: diz-se que o multiplicador orçamental é de 0,5 pontos e esse era o valor de referência por exemplo para o FMI:
a number of policy documents, including IMF staff reports, suggest that fiscal multipliers used in the forecasting process are about 0.5. In line with these assumptions, earlier analysis by the IMF staff suggests that, on average, fiscal multipliers were near 0.5 in advanced economies during the three decades leading up to 2009
O que o FMI vem agora dizer é que a realidade pode ter mudado. Durante a Grande Recessão, e partindo da análise das políticas orçamentais e desempenhos económicos de 28 economias avançadas, Blanchard e Leigh concluem que os multiplicadores orçamentais têm sido bastante mais elevados, podendo variar entre 0,9 e 1,7 pontos.
our results indicate that multipliers have actually been in the 0.9 to 1.7 range since the Great Recession. This finding is consistent with research suggesting that in today’s environment of substantial economic slack, monetary policy constrained by the zero lower bound, and synchronized fiscal adjustment across numerous economies, multipliers may be well above 1
Como frisou um leitor do massa monetária, tratam-se de desvios, face à realidade observada de 300%. O FMI nota que, naturalmente, as implicação também se sentem nas componentes do PIB e no emprego:
When we decompose GDP, we find the largest coefficient for forecasts of investment and the most statistically significant coefficient for forecasts of consumption. The coefficient associated with forecasts of the unemployment rate is also large and significant.
Perante estas conclusões é inevitável pensar no famoso erro de estimativa da taxa de desemprego nacional: o Governo entrou em 2012 a apontar para uma taxa de 13,4% e já vai a caminho dos 16%.
Resta por isso saber se Vítor Gaspar e a troika aprenderam com os erros. É que para 2013, e dada a dose de austeridade prevista, a perspectiva de uma queda do PIB de 1% pode ser desafiada.
O Governo garante que, em 2013, reduzirá o défice orçamental estrutural de 4% do PIB para 2,4%, uma variação de 1,6 pontos. Ora se o multiplicador orçamental para Portugal for de 0,5 pontos, então, esta consolidação roubará cerca de 0,8 pontos de PIB. Assumindo que as condições externas se mantêm iguais às deste ano, estes valores parecem consistentes com uma recessão em torno de 1%.
Mas se o multiplicador orçamental for, por exemplo, de 1,5 pontos tudo muda de figura. Nesse caso, a redução de défice do próximo ano poderá cortar até 2,4 pontos ao crescimento de 2013, ditando uma recessão que será mais do dobro da prevista no Orçamento do Estado.
Veremos o que acontece. Mas desta vez não valerá usar argumento, como fizeram Governo e troika com o disparo da taxa de desemprego em 2012, de que a economia surpreendeu pela negativa sem razão aparente.
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