O debate no site Vox acerca de política orçamental parece ter contagiado o próprio Fundo Monetário Internacional (FMI), que publicou agora um estudo (mais um…) acerca da influência que os impostos e a despesa pública têm em economias desenvolvidas. Walking hand in hand é o nome do 'paper', assinado pelo director do departamento orçamental, Carlo Cottarelli, e disponível no site do FMI.
Carlo Cottarelli, director departamento orçamental do FMI Fonte: FMI
Ao contrário da maioria dos 'papers' publicados anteriormente pelo FMI, este não tenta estimar multiplicadores da despesa ou calcular o impacto que o Orçamento tem no crescimento do PIB. O estudo faz antes um apanhado do “estado de arte” do debate, em que elenca os principais canais de transmissão da política orçamental à economia, clarifica melhor os prós e contras da consolidação orçamental e especifica as circunstâncias em que esta deve ser apressada ou retardada. Inclui ainda uma lista de rubricas onde aparentemente há margem para reduzir o défice sem reduzir a eficiência económica.
De seguida, sumarizamos as conclusões do FMI:
Efeitos de curto prazo da consolidação orçamental:
a) Reduzir o défice orçamental significa tornar a dívida mais sustentável e assim diminuir o risco de uma crise de dívida como a que vemos actualmente. A evidência empírica confirma que, apesar de a debilidade orçamental não ser uma condição suficiente para provocar a ira dos mercados, ela é condição necessária.
b) Reduzir o défice também reduz a procura agregada e, assim, diminui a taxa de crescimento do PIB. O FMI afirma que os estudos mais recentes mostram que o multiplicador é positivo e que tende a aumentar numa situação em que a política monetária atingiu a exaustão (o que significa a taxa de juro de 0%, ou perto disso).
Este segundo efeito de redução do PIB (nominal e real) tem, por sua vez, três efeitos, que contrariam o efeito pretendido da consolidação orçamental. Por um lado, aumentam as despesas sociais e reduzem as receitas fiscais (nota empírica: medidas que valem 1% do PIB apenas reduzem o défice em 0,7%). Por outro, tornam o rácio dívida/PIB superior ao que seria numa circunstância diferente. Finalmente, à medida que o PIB entra em território negativo, geram-se receios nos mercados financeiros, que podem elevar os juros e tornar o Estado insolvente.
Efeitos de longo prazo da consolidação orçamental:
a) A consolidação orçamenta, na medida em que permite diminuir a dívida pública, aumenta o potencial de crescimento da economia. O FMI não apresenta grande fundamento para esta tese, limitando-se a remeter para o trabalho empírico de Rogoff e Reinhart, que constaram esta relação de longo prazo para um grande conjunto de economias.
b) Há igualmente um efeito microeconómico da consolidação, que diz respeito à acção intrusiva do Estado. O FMI lembra, a respeito disto, os efeitos distorcionários criados pela carga fiscal e o impacto da despesa pública na alocação eficiente de recursos (embora nos pareça que este “canal” tenha mais a ver com níveis de despesa do que propriamente com défices e dívida, que é o que está implícito na consolidação orçamental).
Finalmente, as “dicas” do FMI para uma consolidação inteligente. Retivemos apenas os que são relevantes para a Europa:
– Dar preferência à subida dos impostos indirectos (consumo, via IVA, por exemplo) em vez dos indirectos, e às taxas sobre a propriedade, por questões de eficiência;
– Subir taxas sobre externalidades. Isto não envolve não apenas externalidades como a poluição, pode também abranger “poluição financeira”, como o risco excessivo tomado por algumas partes do sector bancário (taxa Tobin a caminho?);
– Combater a fraude fiscal;
– Cortar subsídios de vários tipos, sobretudo os subsídios agrícolas, que nalguns países representam entre 1 e 2% do PIB;
– Cortar na despesa militar, que representa 1% do PIB;
– Reduzir na factura salarial da função pública, que subiu muito na maioria dos países da OCDE ao longo dos últimos anos;
– Ponderar cortes na despesa social que não seja sujeita a exames de avaliação de eficiência. O FMI avança que menos de 10% da despesa com prestações sociais está correctamente avaliada;
– Aumentar a idade de reforma;
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