Economia em recessão há cinco trimestres consecutivos

14/02/2012
Colocado por: Rui Peres Jorge

O PIB contraiu 1,5% no ano passado. José Miguel Moreira, do Montepio, explica os números divulgados hoje pelo INE, lembrando que o 4º trimestre de 2011 foi já o quinto consecutivo com recessão em Portugal, uma análise que é também sublinhada pelo Núcleo de Estudos de Conjuntura sobre a Economia Portuguesa (NECEP) da Universidade Católica, que prevê um 2012 ainda mais dificil, com uma queda do PIB superior a 3%. Bárbara Marques, do Millennium bcp, também aponta para uma recessão entre 3% e 3,5% em 2012, puxada pela forte queda da procura interna e avisa para os riscos na frente externa.

   

Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium BCP, BPI e NECEP (Universidade Católica), isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.  

 

Bárbara Marques – Gabinete de Estudos do Millennium bcp

 

1. A estimativa rápida do INE para a evolução do PIB no 4º trimestre revelou uma contração da atividade económica de 2,7% face ao período homólogo, correspondente a uma diminuição de -1,3% em variação trimestral. Embora não publicando os dados relativos à evolução das componentes do PIB, o INE revela que se observou uma acentuada redução do consumo privado (famílias) e da despesa em investimento. Adicionalmente, foi apresentada uma revisão em baixa da evolução do PIB no 3º trimestre (de -1,7% para -1,8% em variação homóloga), devido a correções nos deflatores e nas estatísticas do comércio internacional.

2. Embora esta evolução tenha sido mais favorável do que o previsto pelo nosso Indicador Coincidente (-3,1% de variação homóloga e -1,7% de variação trimestral), confirma-se o agravamento do contributo negativo da procura interna no último trimestre do ano, atenuado por um melhor desempenho das exportações líquidas. Embora as exportações tenham desacelerado na transição do ano, o contributo da procura externa líquida terá sido de aproximadamente 7,5 p.p., tendo em conta a acentuada redução das importações de bens (nota: tomando como pressupostos os deflatores do trimestre anterior e as tendências recentes para a balança de serviços).

3. No cômputo geral, o PIB português terá contraído em 1,5% em 2011, correspondendo a um desempenho melhor que o perspetivado inicialmente pelas autoridades e revelando a importância do contributo das exportações líquidas ao longo de todo ano. As tendências observadas no final do ano deverão ter continuidade em 2012, esperando-se um agravamento da atividade económica em termos médios (contração do PIB entre os 3 e os 3,5%), com perspetivas de melhoria no último trimestre. Como fatores de risco a este cenário destacam-se a elevada incerteza no contexto externo, que poderá condicionar o contributo da procura externa, e um eventual agravamento da procura interna mais intenso que o esperado, em função da reação à degradação do emprego e das condições financeiras enfrentadas pelos agregados familiares.

 

 

Núcleo de Estudos de Conjuntura sobre a Economia Portuguesa (NECEP) – Universidade Católica   

 

1. No 4º trimestre de 2011, o PIB nacional registou nova quebra face ao trimestre anterior, o que constitui o quinto trimestre consecutivo de declínio da atividade económica. Os valores registados no último trimestre do ano foram particularmente negativos, denotando uma evolução significativamente inferior à taxa de crescimento tendencial do PIB (já de si muito baixa, próxima de zero). Assim, no 4º trimestre de 2011, a economia portuguesa registou uma variação em cadeia de -1,3% e uma contração homóloga de 2,7%. No 3º trimestre de 2011, os valores foram de -0,6% e -1,8%, respetivamente. Os dados do 4º trimestre correspondem, no essencial, às expectativas do NECEP, apresentadas na sua última folha trimestral de conjuntura.

 

2. O NECEP mantém a sua visão para 2012, projetando uma quebra do PIB superior a 3%, consequência em parte do esforço orçamental adicional que terá de ser feito para cumprir a meta do défice. Neste sentido, é previsível que no 1º trimestre de 2012 a economia portuguesa continue a sua trajectória negativa tendo em conta as restrições ao financiamento, o processo de desalavancagem e a redução generalizada do rendimento disponível.

 

 

José Miguel Moreira – Departamento de Estudos do Montepio

 

1. A estimativa preliminar do INE para o Produto Interno Bruto (PIB) português do 4ºT2011 saiu exatamente em linha com as nossas perspetivas, ao apontar para uma queda trimestral de 1.3%. A contração da atividade revelou-se inferior à prevista pelo consenso da Bloomberg (-1,5%), entre os quais o Montepio se apresentou não só como uma das mais otimistas, como também como a única certeira, algo que já tinha sucedido também com a estimativa preliminar do 3ºT2011. Tratou-se, no entanto, de um intenso agravamento do ritmo de contração, depois da queda de 0.6% observada no 3ºT2011, implicando a permanência da economia portuguesa em recessão pelo 5º trimestre consecutivo.

 

2. Em termos homólogos o PIB contraiu 2.8%, depois do decréscimo de 1.8% observado no 3ºT2011, e que foi adicionalmente revisto em baixa em 0.1 p.p., com esta aceleração do ritmo de contração a resultar, segundo o INE, de um significativo agravamento do contributo negativo da procura interna, associado particularmente às diminuições mais expressivas no investimento e no consumo privado. O contributo positivo da procura externa líquida aumentou, em resultado sobretudo da acentuada diminuição das importações de bens e serviços, com as exportações a manterem um crescimento homólogo elevado, embora desacelerando.
  
3. Em termos anuais, o PIB terá contraído 1.5% em 2011, depois de em 2010 a economia portuguesa ter conseguido crescer 1.4%, mas não tendo sequer conseguido recuperar metade do que havia caído em 2009 (-2.9%), representando a 3ª queda mais intensa do PIB português desde pelo menos 1960, acompanhada pela referida contração de 2009, e pela mais intensa queda de 5.1% em 1975, após o 25 de abril.
 

4. Regressando aos dados em cadeia, apesar de com esta estimativa inicial o INE ainda não divulgar dados em detalhe do PIB, estimamos que, na ótica da despesa, a economia tenha sido penalizada no 4ºT2011 pela generalidade das componentes da procura interna, em especial pelo consumo privado, que terá registado uma contração em cadeia de cerca de 2.3%, regressando às quedas depois de ter estagnado no trimestre precedente, e pelo investimento em capital fixo (FBCF), para o qual continuamos a prever uma contração na ordem dos 5.0%, após já ter caído 2.8% no trimestre anterior, um comportamento que reflete as fracas perspetivas de negócios dos empresários. Dentro da procura interna, somente o consumo público poderá ter escapado às fortes quedas, apontando-se para uma descida marginal desta componente, depois de ter contraído 1.8% no 3ºT2011. Já as exportações líquidas terão impulsionado a economia portuguesa no derradeiro trimestre do ano, mas à custa de uma forte correção das importações (que se estima em torno dos -3.5%) no quadro da já referida intensa redução da procura interna, com as exportações, por sua vez, a deverem ter observado uma ligeira descida.

 

5. Na ótica da produção, as quedas terão sido generalizadas entre os maiores setores de atividade económica, devendo ter-se mostrado especialmente intensas na construção, onde se aponta para uma contração do VAB no 4ºT2011 em cerca do dobro da observada no 3ºT2011 (-3.2%). A indústria terá registado a segunda contração mais elevada, com a melhor dinâmica externa da economia a conseguir compensar parte das atuais fraquezas internas, mas revelando-se insuficiente para evitar a permanência deste setor em contração, ademais num trimestre em que o contributo externo favorável não proveio das exportações, mas, como referido, da queda das importações. Assim, e depois de o VAB da indústria ter registado um decréscimo trimestral de 0.7% no 3ºT2011 (considerando o setor alargado, i.e. incluindo a energia, água e saneamento), este terá voltado a contrair e a um maior ritmo, apontando-se para uma descida de 1.3% no 4ºT2011, naquela que será a 3ª queda consecutiva. Tirando a residual agricultura (onde não se exclui a possibilidade de um ligeiro acréscimo), os serviços terão sido o setor que menos contraiu, apontando-se para uma queda do VAB dos serviços (excluindo as atividades financeiras e imobiliárias) na ordem dos 0.6% (-0.3% no 3ºT2011), com os serviços públicos a deverem ter caído bem menos do que os serviços privados.

 

Rui Peres Jorge