Jean-Claude Trichet a passar o testemunho a Mario Draghi na despedida do primeiro do leme do BCE em Outubro 2011 Fonte: Hannelore Foerster/Bloomberg
O Negócios questionou por e-mail cinco especialistas em economia financeira e política monetária sobre o papel do BCE e de Mario Draghi nos últimos meses, com especial enfoque nos dois empréstimos a três anos com que o banco central cedeu um bilião de euros aos bancos europeus e na flexibilização das regras de colateral para sete países, incluindo Portugal.
As respostas chegaram por telefone (Charles Wyplosz e Jacob Kirkegaard) e por e-mail (Daniel Gros, Frank Westermann e Ricardo Reis) e foram contributos valiosos para os dois trabalhos que o Negócios publicou ontem e hoje sobre o tema na sua edição em papel. Agora publicamos, em vários “posts” no massa monetária, as respostas completas dos cinco economistas a questões centrais para reflectir sobre o BCE e o futuro do euro.
O Sr. Trichet pediu um “salto quântico” na “governance” da Zona Euro. Será que o Draghi implementou um salto dessa natureza, mas na política monetária do BCE?
[Jacob Kirkegaard] Penso que Jean-Claude Trichet procurou fazer muito do que Mario Draghi acabou por fazer. Não o conseguiu implementar mais por falta de condições externas adequadas, do que sua falha. Por isso, não utilizaria essa expressão. Mas, de facto, Mario Draghi impressionou: em duas semanas expulsou Berlusconi do governo italiano, conseguiu avançar com o “fiscal compact” e foi, na prática, o credor de último recurso. Mas estes resultados foram possíveis porque houve, entretanto, avanços significativos ao nível político na Europa. Repare que se estas acções tivessem sido tomadas há um ano, Berlusconi, por exemplo, ainda estaria provavelmente no seu lugar.
Dito isto, por “salto quântico” eu entenderia qualquer coisa como as “eurobonds” que, sejamos realistas, não são possíveis sem a existência de avanços como os que estão a ser dados, por exemplo com o “fiscal compact”, com a introdução de limites constitucionais ao défice. Estamos a observar passos muito significativos na integração da Zona Euro.
[Charles Wyplosz] Estou muito impressionado com Mario Draghi. Repare, das minhas cinco condições para a resolução da crise na Zona Euro, há duas que estão cumpridas – o “fiscal compact” e a garantia pelo BCE da dívida soberana – e as duas resultaram da actuação de Mario Draghi. O Sr. Trichet passou o tempo a tentar não fazer nada, e a colocar pressão sobre os governos para eles fazerem o que nunca poderiam fazer. Draghi, de forma muito inteligente, entregou resultados, acalmou os mercados, mudou o jogo. Diplomático mostrou ter o que é preciso para ser um bom banqueiro central.
[Ricardo Reis] Não chamaria à LTRO um “salto quântico”: é uma medida, na minha opinião foi melhor do que não fazer nada, mas pior do que algumas medidas alternativas de política que teriam sido mais eficazes. As LTRO também não envolvem, por si, uma grande mudança na governance do BCE.
[Frank Westermann] Não estou seguro que este tenha sido um passo em frente. A fragmentação das regras de colateral, por exemplo, parece ter sido um passo na direcção oposta.
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