Fonte: Simon Dawnson/Bloomberg
Nos últimos trinta anos, somando estes três sectores [Estado, empresas e familias], o rácio de dívida sobre PIB nas economias avançadas tem aumentado sem parar de 167% do PIB em 1980 para 314% hoje, ou seja, a uma média de 5 pontos percentuais do PIB por ano nas últimas três décadas. Dadas as actuais políticas e tendências demográficas, é difícil ver que esta tendência se inverta num futuro próximo. Devemos ficar preocupados? Quais são as consequências reais de um aumento tão rápido nos níveis de dívida? E quando é que os impactos negativos se começam a sentir?
Cecchetti, Mohanty e Zampolli, “The real effects of debt”, BIS, Setembro de 2011
O economista chefe do Banco de Pagamentos Internacionais (BIS) e dois dos responsáveis pela análise económica na instituição levam mais longe os trabalhos de Rogoff e Reinhart sobre o limite de dívida pública, estimando também limites para as dívidas das empresas e das famílias a partir dos quais o endividamento começa a penalizar o crescimento.
Os três economistas do BIS analisaram dados de 18 economias da OCDE em 1980 e 2010 para concluírem que níveis de dívida pública acima de 85% do PIB penalizam o crescimento (os norte-americanos apontavam para 90% do PIB, ver aqui por exemplo), acrescentando que são também penalizadores do crescimento níveis de dívida das empresas acima de 90%, e das famílias de 85% do PIB.
Como hoje damos conta no Negócios, as implicações para Portugal são impressionantes. No final de 2010, segundo dados do Banco de Portugal, o endividamento total da economia ascendia a 563 mil milhões de euros (326% do PIB), divididos entre cerca de 236 mil milhões de euros das empresas (137% do PIB, que compara com os 90% “limite” do BIS), 163 mil milhões de euros do Estado (94% do PIB, que compara com os 85% “limite” do BIS) e 164 mil milhões das famílias (ou 95% do PIB que compara com os 85% “limite” do BIS).
Isto quer dizer, por exemplo, que para conseguirem reduzir o seu endividamento para um nível que não penalize o crescimento, as empresas nacionais deveriam cortar o seu endividamento em pelo menos cerca de 80 mil milhões de euros (um terço do total). O Estado, onde o endividamento vai continuar a subir nos próximos anos (a troika aponta para 115% do PIB em 2013), o ajustamento também terá de ser tremendo.
Mas, afinal, porque é que os endividamento pesa no crescimento?
As Finanças são uma das bases das sociedades modernas, promovendo o crescimento. Sem Finanças e dívida, os países são pobres e permanecem pobres. Quando podem pedir emprestado e poupar, os indivíduos podem consumir mesmo sem rendimento no momento. Com dívida, os empresários podem investir quando as suas vendas não o permitiriam. E, quando podem endividar-se, as autoridades orçamentais, podem desempenhar um papel a estabilizar a macroeconomia. Mas a história ensina-nos que o crédito pode criar vulnerabilidades. Quando os níveis de endividamento ultrapassam determinados limites, crises financeiras tornam-se mais prováveis e severas (Reinhart e Rogoff (2009)). Isto sugere de forma forte que a dívida pode tornar-se excessiva. Mas quando?
Os economistas respondem à sua pergunta através da análise à correlação entre os níveis de endividamento em cada um dos sectores e o nível de crescimento nas respectivas economias, prosseguindo com uma modelização de uma equação de crescimento baseada na literatura empírica da economia do crescimento, fazendo depender o desempenho dos capitais humano e físico. Acrescentam depois variáveis associadas ao nível de endividamento para testar o seu impacto. Através do estudo de várias regressões estabelecem os pontos limite para cada tipo de dívida.
No caso da dívida pública, por exemplo, concluem que, a partir dos 85% do PIB, um aumento de dez pontos no endividamento público retira cerca de 0,1 pontos à taxa de crescimento. A conclusão, frisam, é especialmente importante no actual contexto internacional na medida em que, com a crise financeira dos últimos quatro anos, a maioria das economias desenvolvidas ultrapassará a nível limite de endividamento público. Na frente privada o cenário também é preocupante. A solução, dizem, terá de passar por um aumento da taxa de poupança.
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