A economia portuguesa surpreendeu os economistas, com variação homólogas (1,6%) e em cadeia (0,8%) muitos superiores às previsões. Por trás deste bom resultado estará um desempenho mais forte do que se esperava das exportações, tanto de bens como de serviços. Os economistas contactados pelo Massa Monetária explicam como chegámos aqui.
Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium bcp, BPI, NECEP (Universidade Católica) e IMF, isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.
Núcleo de Estudos de Conjuntura da Economia Portuguesa (NECEP)
A Estimativa Rápida do INE indica um crescimento do PIB de 0.8% no 3º trimestre de 2016, uma aceleração de 0.5 pontos percentuais face ao trimestre anterior e o melhor registo desde o final de 2013. Paralelamente, o crescimento homólogo (1.6%) foi idêntico ao crescimento médio de 2015 e o crescimento no ano móvel terminado no 3º trimestre é de 1.2%. A leitura deste novo dado é muito positiva e sinaliza um andamento do produto claramente acima da dinâmica instalada. Na conjuntura actual, a evolução dos dados reais é influenciada pela evolução dos deflatores pelo que esta aceleração pontual deve ser interpretada com cautela.
De acordo com a síntese do INE, o crescimento mais intenso do PIB está associado principalmente ao andamento da procura externa líquida, com uma aceleração das exportações nas componentes de bens e serviços. A procura interna também terá dado um contributo positivo para a variação homóloga do PIB mas não para a variação em cadeia, sendo suportada por uma aceleração do consumo privado de bens não duradouros. Nada é dito sobre a evolução do investimento pelo que se depreende que este último agregado poderá ter mantido a trajectória desfavorável observada nos trimestres anteriores – aspecto a confirmar com a divulgação das contas nacionais trimestrais no fim do mês. O acumular da reposição gradual de salários da função pública e a redução do IVA da restauração podem estar a contribuir para o crescimento trimestral surpreendentemente elevado.
O crescimento da zona euro, divulgado pelo Eurostat, foi também de 1.6% em termos homólogos se bem que mais fraco em cadeia (0.3%) face ao registo de Portugal, aliás, o melhor entre pares europeus. Espanha, ainda assim, cresceu a ritmo próximo do português (0.7%) mas a evolução foi fraca na Alemanha e França (ambas com 0.2%) e mesmo em Itália (0.3%). De registar o crescimento robusto do Reino Unido (0.5% em cadeia e 2.3% homólogo) no trimestre subsequente ao referendo sobre o Brexit.
Estes dados são uma boa notícia já que surpreendem pela positiva em Portugal e primam pelo alinhamento face ao esperado no caso da zona euro. Não é de colocar inteiramente de parte a existência de alguns efeitos de calendário ou pontuais na variação em cadeia ora divulgada (0.8%). Estes dados sugerem que o processo de recuperação da economia portuguesa continua em curso e afasta o cenário de quase estagnação que se vislumbrava desde o início do ano. E são consistentes com crescimentos tendenciais anuais próximos de 1.5%, tornando plausível crescimento de 2016 inscrito pelo Governo no Orçamento do Estado para o próximo ano.
Filipe Garcia, Informação de Mercados Financeiros (IMF)
A estimativa rápida do INE para o crescimento no 3º trimestre mostra-nos um número positivo e que traduz uma aceleração da economia. O crescimento em cadeia de 0.8% contrasta com cinco trimestres consecutivos com crescimentos entre +0.1% e 0.3% e coloca novamente em aberto a possibilidade de Portugal crescer acima de 1% em 2016.
Segundo o INE, esta aceleração resulta da procura externa líquida, para a qual o turismo deverá ter registado um contributo importante. O modelo de crescimento baseado na tentativa de promoção do consumo privado continua a não parecer ser o que “puxa” pela economia e o caminho mais adequado para se chegar a um crescimento sustentado, até porque a procura interna teve um contributo negativo de Julho a Setembro. Preocupa-nos o que estará a acontecer ao investimento, que não deixa de ser a semente de crescimento futuro e que, receamos, terá tido mais um mau trimestre.
O crescimento homólogo de 1.6% provavelmente será bem-recebido pelos analistas internacionais. Trata-se ainda de uma taxa de crescimento baixa e é uma dinâmica que carece de confirmação nos trimestres seguintes, mas é um bom número.
Paula Carvalho, BPI
A actividade económica evoluiu muito favoravelmente no 3º trimestre de 2016 sobretudo graças ao comportamento das componentes externas da procura agregada, segundo a informação preliminar do INE. Estas são notícias positivas na medida em que tornam mais plausível o cenário inscrito no Orçamento de Estado, reforçando também a credibilidade dos planos oficiais e a trajectória de consolidação das contas públicas aos olhos dos investidores internacionais. Melhorias na frente económica são um dos ingredientes mais relevantes na avaliação da percepção do risco país, pelo que esta é uma boa notícia, sobretudo se confirmada pela análise do detalhe das Contas Nacionais, em finais de Novembro.
Para já, poderá levar a ligeiros ajustamentos em alta das previsões para a economia portuguesa este ano, algumas algo pessimistas e que colocam mesmo o patamar de evolução anual próximo da estagnação. A nossa previsão é de um crescimento positivo, de 1.1%, agora com ligeiro enviesamento no sentido da melhoria.
A análise possível ao comportamento das componentes sugere que o principal destaque vai para as exportações, que reflectem uma influência decrescente dos efeitos negativos causados pela redução das exportações de combustíveis e da queda das exportações para Angola. Espelham também o bom comportamento das restantes componentes: repare-se que as exportações de bens, sem estes dois efeitos, registam um ritmo de crescimento de cerca de 6%; relativamente às exportações de serviços, destacam-se as exportações de Turismo, que têm vindo notoriamente a acelerar, contribuindo para o reforço do excedente externo – representam cerca de metade das exportações de serviços.
Outro elemento a relevar é a aparente queda do consumo de bens duradouros, que deverá ter pesado nas importações, com efeitos mistos sob o PIB mas que revela um padrão de crescimento tendencialmente mais saudável, eventualmente com reforço da taxa de poupança das famílias.
Rui Bernardes Serra, Montepio
A estimativa preliminar do INE para o PIB de Portugal no 3.º trimestre apontou para um crescimento, em cadeia, de 0.8%, o maior crescimento desde o 4.º trimestre de 2013 (+1.0%), depois de ter avançado apenas 0.3% no 2.º trimestre e a um ritmo médio de 0.2% nos últimos quatro trimestre. O crescimento do 3.º trimestre superou a mediana das projecções das instituições contactadas pela Bloomberg (+0.3%) e as nossas próprias perspectivas (entre +0.2% e +0.4%). Admite-se que as nossas perspectivas possam ter estado contaminadas pelos dados do lado da oferta, que sugeriam um crescimento inferior para o VAB (teoricamente o VAB e o PIB são a mesma realidade, mas, na prática, há discrepâncias entre as duas medidas, como sucedeu no 2.º trimestre, quando o PIB subiu 0.3% e o VAB avançou 0.4%).
Na óptica da procura, o INE refere que o crescimento, em cadeia, se deveu apenas ao contributo da procura externa líquida, reflectindo o forte aumento das exportações de bens e serviços, enquanto a procura interna registou um contributo negativo. O nosso erro de previsão terá resultado sobretudo da dimensão do contributo das exportações líquidas, reiterando-se as dinâmicas das diversas componentes da procura interna. Assim, estimamos um crescimento do consumo privado (+0.5%), mas uma queda do investimento (devido à variação de existências [que tinha tido um forte contributo positivo de 0.6 p.p. para o crescimento do PIB do 2.º trimestre], já que o investimento em capital fixo (FBCF) terá subido ligeiramente [-0.3% no 2.º trimestre]). O consumo público terá, grosso modo, estabilizado.
Em termos de sectores, estimam-se crescimentos da indústria, da construção (ligeiro, mas regressando ao crescimento) e dos serviços (sensivelmente ao mesmo rimo do 2.º trimestre).
Nos últimos 15 trimestres, o PIB subiu 13 vezes e caiu duas (1.º trimestre de 2014: -0.5% e 3.º trimestre de 2013: -0.1%), tendo-se observado, nestes 15 trimestres, um crescimento acumulado de 4.9%. A economia teve neste trimestre uma performance superior à da Zona Euro (+0.3%), do Reino Unido (+0.5%), dos EUA (+0.7%) e do Japão (+0.5%). Com este crescimento, em cadeia, de 0.8%, no 3.º trimestre, o PIB manteve a trajectória de crescimento iniciada no 1.º trimestre de 2013, quando colocou termo a um período recessivo que durou nove trimestres, tendo o PIB no 1.º trimestre de 2013 se situado no nível mais baixo desde o 2.º trimestre de 2000 e, neste 3.º trimestre, atingido níveis máximos desde o 3.º trimestre de 2011. Note-se que o PIB português é particularmente volátil, sendo de salientar que a média móvel de quatro trimestres revelou uma subida de 1.2%, idêntica à do 2.º trimestre (+1.2%), representando a 11.ª consecutiva após 10 contracções.
Em termos homólogos, o PIB subiu 1.6% no 3.º trimestre, em aceleração (+0.9% nos dois trimestres anteriores). O INE referiu que o crescimento mais intenso do PIB reflectiu principalmente o aumento do contributo da procura externa líquida (+0.2 p.p. no 2.º trimestre), verificando-se uma aceleração mais expressiva das exportações de bens e serviços em comparação com a das importações de bens e serviços. A aceleração das exportações foi comum às componentes de bens e de serviços. O contributo da procura interna para a variação homóloga do PIB também aumentou no 3.º trimestre (+0.7 p.p. no 2.º trimestre), em resultado da aceleração do consumo privado devido ao comportamento da componente de bens não duradouros e serviços, enquanto a componente de bens duradouros desacelerou.
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