CES e IRS: como um (não) influencia o outro

01/04/2014
Colocado por: Elisabete Miranda

Créditos: Simon Dawson/Bloomberg

 

Numa das vezes que escrevi sobre o facto de haver milhares de pensionistas que, apesar de suportarem a contribuição extraordinária de solidariedade (CES), não vão deduzi-la no IRS devido à forma como a dedução específica está desenhada, fui desafiada pelo leitor Manuel Torres da Silva a apresentar simulações que indiquem exactamente os níveis de rendimento a partir dos quais a CES começa a abater ao rendimento bruto para efeitos de tributação.

 

Porque, argumenta Manuel Torres da Silva, e bem, não é só quem recebe até 22.500 euros por ano (1.607 euros) que não pode fazer qualquer dedução adicional e absorver fiscalmente a CES – a partir desse patamar de 22.500 euros, há ainda um conjunto de pensões que, devido à formula de cálculo da dedução específica, não incorporarão a CES no IRS.

 

Vamos então a isso, começando por recordar o que dizem as regras.

 

Desde 2011, o primeiro ano em que a CES surgiu (na altura apenas para pensões a partir de 5.000 euros), considerou-se que ela seria equiparada a uma contribuição obrigatória para a Segurança Social. Este entendimento é oficioso porque, apesar do interesse geral de que a informação se reveste, as instruções não foram tornadas públicas pela Autoridade Tributária e Aduaneira. Demos conta das regras, na altura, em artigo noticioso.

 

Em termos fiscais, isto significa que aquilo que se paga a título de CES é considerado uma dedução específica no IRS (a dedução específica é um abatimento automático ao rendimento bruto, que reduz logo à cabeça o rendimento que é sujeito à taxa de IRS).

 

As regras da dedução específica estão consagradas no artigo 53º do Código do IRS e é preciso olhar para elas para perceber em que medida se beneficia delas.

 

Segundo este artigo, quem tem uma pensão até 22.500 euros brutos (1.607 euros mensais) tem uma dedução específica fixa no valor de 4.104 euros. Para estes pensionistas, pagar ou não pagar CES em nada interfere no IRS.

 

De 22.500 euros em diante (1.607 euros/mês), a CES pode ser abatida, mas só quando exceder o valor da dedução específica que está prevista. Vamos ver o que isto significa para diversos patamares de rendimento.

 

Quadro: Dedução Específica no IRS, com e sem CES 

(valores em euros)

 

 

 

Das contas feitas pelo Negócios a partir das regras definidas nos Orçamentos do Estado e no Código do IRS, retiram-se três grupos de conclusões:

 

– até 22.500 euros brutos anuais (1.607 euros/mês) de pensão está-se excluído, à partida, da possibilidade de fazer qualquer dedução adicional devido à CES suportada.

 

– quem ganhe uma pensão (ou conjunto de pensões) entre 1.607 euros/mês e 2.330 euros brutos/mês também não terá qualquer abatimento adicional no IRS pelo facto de ter um encargo adicional com a CES. A dedução específica “original”, chamemos-lhe assim, não ultrapassa a CES, e, por isso, a CES não pode ser aproveitada.

 

– de 2.330 euros brutos/mês em diante, a CES passa a poder ser deduzida parcialmente. Quanto, varia de caso a caso. Considerando por exemplo uma pensão de 2.500 euros brutos por mês. Até agora, a dedução específica em IRS era de 1.604 euros, mas, como paga 2.450 euros de CES, a dedução específica passa a ser de 2.450 euros. Tem direito a abater 846 euros ao IRS além do que vinha abatendo até aqui. 

 

– a partir dos 3.100 euros brutos por mês a CES passa a poder ser integralmente deduzida. Isto ocorre porque deste valor em diante os reformados já não têm direito a qualquer dedução específica em IRS (nos últimos anos as regras de cálculo desta dedução foi revista de modo a esbater a vantagem que os pensionistas tinham em relação ao trabalho dependente, em matéria de dedução específica. Mas, na prática, o resultado final é que as pensões médias/altas acabaram por ficar prejudicadas, como já assinalámos em artigos, aqui).

 

Note-se que estas são simulações para a CES cobrada em 2013, a incluir na declaração de IRS deste ano. A CES que vai ser cobrada em 2014 (e que será declarada para o ano) tem regras ligeiramente diferentes.

 

 

II – Onde declarar a CES no IRS?

 

A declaração de IRS não tem um campo específico para se indicar o valor pago a título de CES. Mas, pelo facto de ser considerada uma contribuição para a Segurança Social, a CES é incluída no conjunto dos descontos que são indicados  no campo “Contribuições”, do quadro 4A, do anexo A, da declaração modelo 3 de IRS”, tal como já tivemos oportunidade de explicar.

 

À partida, as Finanças já devem preencher automaticamente o campo, a partir das informações por si recolhidas junto das entidades pagadoras. Mas convém verificar se os valores estão correctos. 

Elisabete Miranda