Multiplicador é o que um economista quiser

07/11/2012
Colocado por: Rui Peres Jorge

 

Olivier Blanchard, economista-chefe do FMI, assinou a avaliação do FMI aos multiplicadores orçamentais Fonte: Stephen Jaffe Bloomberg

 

A polémica em torno dos multiplicadores orçamentais – ou seja, da estimativa do custo da austeridade no crescimento  – não parece ter fim. O último desenvolvimento foi uma dura resposta da Comissão Europeia às contas do FMI. Para Bruxelas um euro de austeridade rouba menos de um euro ao crescimento, defendeu esta semana, deixando críticias metodológicas ao estudo de Washington. Para o debate em Portugal isso significa que o multiplicador orçamental que Vítor Gaspar diz estar implícito no Orçamento (0,8 pontos) é até superior ao de Bruxelas (entre 0,5 e 0,7 pontos). É caso para dizer que o multiplicador é o que um economista quiser.

 

Recapitulando:

 

1) A 8 de Outubro, no relatório semestral com previsões económicas, o FMI refaz as contas macroeconómicas da austeridade e, com base numa amostra de cerca de duas dezenas de países, diz que por cada euro de austeridade uma economia contrai não apenas 50 cêntimos (valor comummente aceite), mas entre 90 cêntimos e 1,7 euros. As conclusões são publicadas numa caixa assinada por Olivier Blanchard;

 

2) A polémica instalou-se de imediato em Portugal, como notámos aqui no massa monetária. Em causa estava um cenário de recessão muito superior ao previsto pelo Governo e troika. O próprio Presidente da República escreveu sobre os multiplicadores do FMI a dois dias da apresentação do Orçamento do Estado.

 

3) Vítor Gaspar viu-se forçado a tratar o tema na conferência de imprensa do Orçamento do Estado (15 de Outubro) de forma que, analisámos também aqui no massa monetária, podia ser desafiada. Contudo, o ministro também sublinhava que as conclusões do FMI não se podiam/deviam aplicar directamente a Portugal. O ministro não revelou o multiplicador orçamental implícito no OE 2013, e afirmou que pediria esclarecimentos ao FMI;

 

4) A 17 de Outubro, Abebe Selassie, o chefe de missão do FMI veio ao encontro da interpretação de Gaspar sobre a necessidade do país continuar a aplicar as medidas de austeridade previstas no Orçamento. Num inédito comunicado para Portugal Selassie termina afirmando: “o ajustamento orçamental é imperativo e deve continuar”;

 

5) A polémica não foi apenas nacional. Por exemplo, a 23 de Outubro, num texto no VOX, Barry Eichengreen e Kevin O'Rourke apontaram para um multiplicador de 1,6 pontos, secundando o FMI. Um dia antes, o Fundo tinha sentido necessidade de esclarecer que também na Irlanda os multiplicadores orçamentais tinham sido bem calculados, como notou o Irish Economy.

 

6) Vítor Gaspar voltou ao tema no Parlamento a 24 de Outubro. Na primeira vez que defendeu o OE perante os deputados, o ministro das Finanças avançou o multiplicador implícito na proposta de Orçamento do Estado: 0,8 pontos, um valor abaixo dos multiplicadores do FMI, como notámos aqui. (O PS pediu à Unidade Técnica de Apoio Orçamental que calculasse os referidos multiplicadores para o caso português, o que ainda não aconteceu);

 

7) A 7 de Novembro, um mês depois do seu início, a polémica ganhou um novo episódio, como escrevemos no Negócios. No relatório semestral sobre a economia europeia, a Comissão Europeia respondeu ao FMI. Também numa caixa. E além de deixar implícitas várias críticas metodológicas ao traballho do Fundo, os economistas da Comissão defendem que, mesmo em crise, o multiplicador orçamental médio na Zona Euro estará num intervalo entre 0,5 e 0,7 pontos (ver página 53 do pdf e seguintes)

 

Perante a profusão de estimativas e análises é caso para dizer: multiplicador é o que um economista quiser.

 

 

 

 

    

 

 

   

 

 

Rui Peres Jorge