Será que o BCE deixará Portugal para trás?

08/10/2012
Colocado por: Rui Peres Jorge

 

Cadeira de Mario Draghi na sala de conferências de imprensa em Frankfurt Fonte: Hannelore Foerster/Bloomberg
 

 

A recém anunciada disponibilidade do BCE para intervir nos mercados de dívida pública da Zona Euro foi vista como uma ajuda importante para o regresso de Portugal aos mercados até ao final de 2013. Recordem-se, por exemplo, as palavras do Presidente da República quando, no início de Agosto, saudava as declarações de Mario Draghi a favor da intervenção do BCE, e questionava “porque não o BCE começar a aplicar já aos títulos da dívida pública da Irlanda e de Portugal a orientação anunciada pelo seu presidente?”. Pois bem, dois meses volvidos as notícias não são animadoras. O BCE não comprou dívida até agora, nem o deverá fazer em breve ou sequer até à entrada de Portugal nos mercados por si, como escrevemos hoje no Negócios. Vejamos o que disse Draghi sobre o assunto.

 

Depois do primeiro anúncio sobre a intenção de comprar dívida, o presidente do BCE voltou ao tema na conferência de imprensa de início de Setembro, afirmando:

 

As far as Portugal and Ireland are concerned, the press statement says that Outright Monetary Transactions “may be also considered for Member States currently under macroeconomic adjustment programme when they will be regaining bond market access

 

A declaração foi animadora, e confirmava a possibilidade de países já sujeitos a programas de ajustamento poderem beneficiar de compras de dívida pelo BCE, o que seria uma ajuda importante para baixar os custos de financiamento no curto prazo (BCE comprará dívida até três anos) e para alongar as maturidades das emissões (até agora, Portugal conseguiu emitir bilhetes do Tesouro a 18 meses e fez uma troca de obrigações na semana passada que lhe permitiu a emissão de um títulos a três anos). O balde de água fria chegou na quinta-feira na conferência de imprensa seguinte. Questionado sobre porque é que o BCE não comprava dívida nacional, Draghi respondeu:

 

The OMT would not apply to countries that are under a full adjustment programme until – and that is what I believe I said last time – until full market access, complete market access has been obtained. And this is because the OMT is not a replacement for a lack of primary market access.

 

Ora, o Presidente é bem claro: o programa de compra obrigações só será activado para países que já tenham recuperado o seu acesso aos mercados. Ainda não está claro que isto significa mas ao que tudo indica, Portugal teria de conseguir emitir a custos sustentáveis dívida ao longo de toda a curva de rendimentos, ou pelo menos até aos cinco anos. Ora isso parece muito pouco provável no próximo ano. A confirmar-se, Portugal não poderá contar com o BCE para a sua estratégia de regresso aos mercados. Será que Frankfurt deixará Lisboa para trás?

 

Rui Peres Jorge