Passos Coelho em entrevista em a 5 de Maio de 2012 Fonte: Mario Proenca/Bloomberg
A julgar pela sequências de afirmações do primeiro ministro após declarações do Presidente da República há uma coisa de que não se pode acusar Passos Coelho: de fazer orelhas moucas às palavras de Cavaco Silva. O mais recente exemplo foi o discurso do 5 de Outubro…
No discurso de sábado, Cavaco Silva sublinhou a importância de se definir um rumo que dê sentido aos sacrifícios…
Por muito difícil que seja o presente, não podemos abdicar de uma linha de rumo que nos sirva de orientação, uma estratégia nacional que antecipe os desafios que iremos enfrentar num horizonte de médio e longo prazo
Se não soubermos o que queremos para amanhã, de pouco adiantam os sacrifícios que temos de fazer hoje. O nosso sacrifício tem de ter um propósito, um sentido, uma razão de ser. Não atravessamos dificuldades unicamente para corrigir os erros do passado recente, mas também para encontrar um rumo de futuro
Um dia depois Passos Coelho garante que tem esse rumo e que sabe para onde vai:
Nós sabemos para onde vamos. Nós queremos cumprir o nosso memorando de entendimento, isso é crítico para Portugal (…) Esse é o nosso objectivo e é o nosso programa, assumido com toda a clareza. E é esse que estamos a cumprir
No mesmo discurso, Cavaco Silva diz que cada um é livre de escolher emigrar mas avisa que Portugal não pode desperdiçar esses jovens:
Mas o que essencialmente importa é, sem dúvida, criar condições para que os jovens da nova Diáspora possam regressar ao seu País. Não lhes podemos negar o direito de partirem em busca de um futuro melhor, mas temos o dever de tudo fazer para que retornem e contribuam para o melhor futuro do seu País
Com os conhecimentos que receberam em Portugal, com a experiência e a abertura ao mundo que adquiriram no estrangeiro, estes jovens detêm um potencial único, ímpar, absolutamente invulgar, que não podemos dar-nos ao luxo de desperdiçar
Passos Coelho – que no passado apontou a emigração como forma de mitigar os impactos da crise – garantiu hoje que está a fazer tudo para os jovens de volta para Portugal
Esta é uma boa ocasião para recordar que nunca nesse debate a emigração foi proposta como uma política nacional, nem como uma espécie de solução genérica para os nossos males (…) É também a pensar nos milhares e milhares de pessoas que tiveram de deixar o país em resultado da estagnação da economia nacional que o Governo está a trabalhar todos os dias
Coincidência ou não, vão ficando na memória outros comentários do primeiro ministro a frases do Presidente. Um dos que salta logo à memória foram as declarações sobre os cortes nas pensões em Janeiro deste ano.
A 20 de Janeiro, Cavaco Silva diz que com cortes as suas pensões podem não chegar para despesas:
Tudo somado – o que irei receber do Fundo de Pensões do Banco de Portugal e da Caixa Geral de Aposentações quase de certeza que não vai chegar para pagar as minhas despesas, porque como sabe eu também não recebo vencimento como presidente da República (…)
No dia seguinte Passos Coelho realça que os sacrifícios são iguais para todos:
todas as pessoas, independentemente da posição que ocupam, fazem sacrifícios importantes. Sejam aqueles que têm reformas maiores sejam os que têm mais pequenas. Os sacrifícios têm que ser repartidos por todos. Não há ninguém que fique de fora (…) O que eu quero dizer aos portugueses, a começar pelo senhor Presidente da República e a acabar em qualquer cidadão em Portugal, é que esses sacrifícios vão valer a pena (…)
Fica o convite: quem se lembrar de mais exemplos da sensibilidade de Passos Coelho a Cavaco (ou vice-versa) comente…
- Carlos Costa e o colapso do BES. Negligente ou injustiçado? - 23/03/2017
- Os desequilíbrios excessivos que podem tramar Portugal - 21/03/2017
- A década perdida portuguesa em sete gráficos - 15/12/2016