INE confirmou hoje que economia contraiu 0,1% no primeiro trimestre. A equipa do NECEP sublinha que estes dados são um bom arranque de ano, mas não alteram significativamente o diagnóstico sobre a economia portuguesa: PIB está a cair há seis trimestres consecutivos e deverá continua a cair e o único suporte da economia são as exportações. Com este bom arranque de ano, Rui Bernardes Serra, do Montepio, revê a estimativa de recessão para -2,5%, mas avisa para riscos elevados decorrentes, nomeadamente, dos gastos com investimento terem aumentado muito este trimeste, um comportamento que não deverá ser sustentável. Paula Carvalho, do Banco BPI, destaca o sector externo, sublinhando que “exportações são melhor notícia”. O BPI aponta para uma recessão de 3%. Bárbara Marques do Millennium bcp evidencia também o contributo de uma recuperação em cadeia do sector da construção, aconselhando, tal como o NECEP, cautela na leitura dos bons resultados do primeiro trimestre.
Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium bcp, BPI e NECEP (Universidade Católica), isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.
Bárbara Marques – Gabinete de Estudos do Millennium bcp
1. O INE confirmou hoje o valor da taxa de crescimento do PIB no 1º trimestre de 2012, tendo esta sido de -2,2% em termos homólogos e de -0,1% em termos trimestrais, tratando-se de uma evolução mais favorável da economia portuguesa face ao antecipado.
2. A decomposição do PIB revela um contributo menos negativo da procura interna (-6,4 p.p., +4 p.p. que no 4º trimestre de 2011) e o enfraquecimento do contributo da procura externa líquida (4,2 p.p., -3 p.p. que no 4º trimestre de 2011). Para esta evolução destaca-se: (i) o contributo menos negativo das existências (componente volátil mas que vinha a registar ajustamentos negativos muito significativos ao longo de 2011) , e que atenuou a quebra do investimento e das importações no trimestre; e (ii) a recuperação em cadeia na atividade da construção, parcialmente atribuível ao aproveitamento das condições climatéricas menos rigorosas nos primeiros meses do ano, mas ainda num contexto fortemente recessivo neste setor de atividade.
3. A evolução muito favorável dos termos de troca e as dinâmicas subjacentes ao comportamento das exportações e importações proporcionaram uma redução significativa das necessidades de financiamento da economia para 2.5% do PIB no primeiro trimestre face ao período homólogo (7.2% do PIB). Todavia, este valor é inferior ao verificado no último trimestre de 2011 (0.3% do PIB), sugerindo que os ganhos nas contas externas derivam, numa componente importante, do efeito cíclico, não constituem ainda evidência forte de alterações estruturais neste domínio.
4. Tendo em conta a natureza de algumas das componentes que impulsionaram o PIB no primeiro trimestre e o comportamento mais recente de algumas variáveis económicas, não se poderá excluir alguma reversão destes efeitos nos números do PIB no segundo trimestre.
Paula Gonçalves Carvalho – Departamento Estudos Económicos do Banco BPI
1. O detalhe do andamento do PIB no primeiro trimestre, divulgado pelo INE, veio confirmar a nossa apreciação inicial: o melhor comportamento da procura interna foi sobretudo justificado por alguma recomposição de stocks, movimento que deverá ter sido pontual, de correcção à queda excessiva verificada no 4T2011; o consumo privado manteve uma queda expressiva, ainda que menos acentuada (-5.6% em termos homólogos, face a -6.6% antes); as exportações continuam a constituir o único motor de crescimento da actividade.
2. O andamento das exportações constitui claramente a melhor notícia e deverá ser destacada. De facto, em termos reais, as exportações aceleraram, de 6.6% para 7.9%, devido sobretudo às exportações de bens, que aumentaram 9.7% em termos homólogos. Mais uma vez se verifica o resultado do esforço de diversificação, pois o principal contributo para o crescimento tem sido para destinos fora da União Europeia, ganhando peso as exportações para Angola (4º maior destino), China, Brasil, Rússia, Moçambique e Turquia. E não é apenas num grupo de produtos mas em vários que se regista o andamento favorável das vendas ao exterior: automóveis, têxteis, combustíveis, moldes (obras de plástico e ferro), máquinas e equipamento, agro-industriais. Esta é a principal tendência a destacar e que deve ser acompanhada, pois corresponde ao que se pretende: uma retoma assente no sector transaccionável que, mais tarde, trará mais investimento e mais consumo das famílias.
3. No conjunto do ano a actividade económica deverá recuar cerca de 3%, menos do que antes fora antecipado, mas tal decorre sobretudo do efeito matemático induzido pelo comportamento do PIB no primeiro trimestre (queda homóloga de 2.1%); e também do bom andamento das exportações. Ou seja, o perfil de evolução da actividade económica vai manter-se: acentuada retracção da procura interna, compensada parcialmente pela parte externa.
Núcleo de Estudos de Conjuntura sobre a Economia Portuguesa (NECEP) da Universidade Católica
1. No 1º trimestre de 2012, o PIB registou uma contração de 0,1% face ao trimestre anterior e uma quebra homóloga de 2,2%, evoluindo em linha com o seu crescimento tendencial recente. Este foi o sexto trimestre consecutivo de contração em cadeia do PIB, confirmando a debilidade da situação económica nacional. No entanto, os valores do 1º trimestre de 2012 representam uma melhoria clara face aos registados na segunda metade de 2011 (por exemplo, no 4º trimestre de 2011, as taxas de crescimento foram de -1,3% em cadeia e de -2,9% em termos homólogos). Este facto torna especialmente relevante analisar o desempenho das várias componentes do PIB, no sentido de tentar perceber esta melhoria relativa e avaliar o seu significado.
2. A principal conclusão é que os dados do 1º trimestre não trazem novidades relevantes: as exportações continuam a ser o único motor efetivo da economia e os riscos negativos para o crescimento económico em 2012 permanecem basicamente intactos (embora tenha aumentado a probabilidade de uma recessão menos severa do que a inicialmente prevista.
3. Em particular, verifica-se que o principal impulso contabilístico para o crescimento do PIB no 1º trimestre de 2012 acabou por ser a reposição de stocks (contributo de +0,9 pontos percentuais para a variação em cadeia) depois da forte quebra ocorrida no final de 2011. Há ainda outros efeitos pontuais como o trimestre bissexto que pode traduzir várias realidades, mas a perceção do NECEP é de que se tratou de uma oscilação de significado pontual.
4. Reitera-se, assim, a necessidade de interpretar estes dados com prudência, parecendo certo que a “surpresa positiva” do 1º trimestre está longe de sinalizar a recuperação cíclica da economia.
Rui Bernardes Serra – Departamento de Estudos do Montepio
1. A estimativa final do INE para o Produto Interno Bruto (PIB) português do 1ºT2012 confirmou a contração de 0.1%, que recorde-se, aquando da estimativa preliminar tinha superado as nossas perspetivas e as estimativas de consenso da Bloomberg. Tratou-se de um intenso desagravamento do ritmo de contração, depois da queda de 1.3% observada no 4ºT2011, com a economia a permanecer em recessão pelo 6º trimestre consecutivo, mas apresentando o menor ritmo de contração neste período de ano e meio. Em termos homólogos o PIB contraiu 2.2%, depois do decréscimo de 2.9% observado no 4ºT2011, com esta desaceleração do ritmo de contração a dever-se, segundo o INE, ao comportamento da procura interna, que embora se continue a contrair fortemente, registou um contributo em termos homólogos menos negativo (-6.4 p.p.) do que o verificado no trimestre anterior (-10.3 p.p.). O aumento do contributo da procura interna foi parcialmente compensado pela diminuição do contributo da procura externa líquida, que passou de 7.4 p.p. no 4ºT2011 para 4.2 p.p., em resultado apenas do decréscimo menos expressivo das importações de bens e serviços, já que as exportações de bens e serviços até aceleraram.
2. Como tínhamos referido aquando da estimativa preliminar, esta elevada resiliência da economia portuguesa no arranque do ano tinha consequências para o comportamento anual, o que concorria para uma revisão em alta das nossas perspetivas, tendo-se na altura apontado para a possibilidade da contração ficar entre 2% e 2.5%, cenário que ficaria condicional à divulgação em detalhe das componentes. Neste contexto, e atendendo a que parte da resiliência da economia esteve associada ao contributo da variação de existências, componente que é extremamente volátil e que poderá voltar a apresentar um contributo bastante negativo nos restantes trimestres do ano, nomeadamente no atual trimestre, é agora bastante mais provável que a queda do PIB se fique pelos 2.5%.
3. Assim, depois do PIB português ter contraído 1.6% em 2011, a recessão acumulada no conjunto dos dois anos pode-se cifrar em pouco mais de 4%, que era justamente o que fora previsto aquando da assinatura do memorando com a troika, mas que acaba por ser um cenário mais favorável do que o apresentado pela troika no início da semana, em que a contração acumulada em dois anos foi estimada em 4.6%. Refira-se que estas previsões partem do pressuposto de que não se assistirá nos próximos meses a uma forte instabilidade nos mercados financeiros, alho que não poderá ser colocado de parte, atendendo aos receios que pairam sobre a situação política grega e sobre a economia espanhola, nomeadamente sobre o seu sistema financeiro.
4. Regressando aos dados em cadeia, e detalhando a análise, esta estimativa final veio confirmar na generalidade o que havíamos antecipado acerca do comportamento das diversas componentes do PIB na ótica da despesa, com a economia a ver-se penalizada no 1ºT2011 por todas as componentes da procura interna, com exceção do investimento, que subiu uns impressionantes 9.6%, embora após uma ainda mais expressiva queda de 13.4% no trimestre anterior, evidenciando um contributo amplamente favorável para a evolução trimestral do PIB (+1.4 p.p.). Já o consumo privado, como esperado, apresentou o contributo mais negativo (-1.4 p.p.) e superior ao que fora antecipado. O consumo público acabou por cair menos do que havíamos admitido, contraindo 0.6%, mas com as quedas dos dois trimestres anteriores a revelarem-se mais intensas do que o anteriormente estimado pelo INE. Em resultado da forte subida do investimento, as importações também acabaram por crescer, anulando o contributo das exportações, pelo que o contributo das exportações líquidas foi inesperadamente nulo.
5. O consumo privado foi o principal responsável pela queda do PIB no 1ºT2012, tendo registado uma contração em cadeia de 2.1%, superior à que havíamos admitido, contabilizando já o seu 5º trimestre consecutivo de queda (-3.0% no 4ºT2011). Com este registo, o consumo privado caiu para níveis mínimos desde o 3ºT2003, refletindo as penalizadoras medidas de austeridade constantes no OE para 2012 (onde se destaca a mediática eliminação dos subsídios de férias e de Natal para os funcionários públicos e pensionistas), que tendem a provocar uma atitude ainda mais cautelosa por parte dos consumidores, particularmente visíveis nas componentes do consumo mais cíclicas, nomeadamente no consumo de bens duradouros.
6. O investimento foi quem mais contribuiu para a resiliência da atividade económica no primeiro trimestre do ano, com um contributo de 1.4 p.p. para a evolução trimestral do PIB, resultante de um impressionante crescimento de 9.6%, embora após uma ainda mais expressiva queda de 13.4% no trimestre anterior. Esta foi a 1ª subida do investimento em 10 trimestres, recuperando de mínimos desde o 4ºT1987 e tendo sido suportado tanto pelo investimento em capital fixo, como pela variação de existências, esta última apresentando um contributo positivo de 0.9 p.p., depois de no 4ºT2011 ter contribuído negativamente para o crescimento do PIB (-1.1 p.p.). O investimento em capital fixo (FBCF) beneficiou um pouco menos a dinâmica da atividade, tendo apresentado um contributo positivo de 0.5 p.p. (-1.2 p.p. no trimestre anterior), refletindo uma subida em cadeia de 3.2%, mas não anulando sequer metade da queda do trimestre anterior (-6.9%), que fora ademais a 7ª consecutiva. Esta subida da FBCF refletiu um comportamento misto da generalidade das suas componentes, tendo a queda mais expressiva se observado no material de transporte, que viu significativamente agravado o ritmo de queda (de -5.4% para -17.2%), permanecendo em contração pelo 5º trimestre consecutivo e ficando no nível mais baixo desde pelo menos 1995. Já nas máquinas e equipamentos o investimento subiu 8.1%, após 5 quedas consecutivas (-10.6 % no 4ºT2011), sendo igualmente de realçar a subida de 4.2% no investimento em construção, após 3 quedas consecutivas (-6.4% no 4ºT2011), com estes dois segmentos da FBCF a recuperarem de níveis mínimos desde pelo menos 1995.
7. À semelhança do consumo privado, o consumo público também continuou a cair, pese embora acabando por descer menos do que o que havíamos admitido, contraindo 0.6% e contribuindo com -0.1 p.p. para o crescimento trimestral do PIB. Isto depois de no 4ºT2012 ter caído 0.9% (valor revisto em baixa em 0.3 p.p.) e de no 3ºT2011 já ter descido 2.3% (-2.2% anteriormente). Com esta descida, o consumo público ficou no valor mais baixo desde o 2ºT2008, bem melhor do que o comportamento do PIB, que ficou no nível mais baixo desde o 4ºT2004.
8. Finalmente, as exportações líquidas acabaram por inesperadamente apresentar um contributo nulo para o crescimento da economia portuguesa no primeiro trimestre do ano (+3.2 p.p no 4ºT2011), com o contributo positivo das exportações (+0.6 p.p.) a ser anulado pelas importações (-0.6 p.p.). As importações acabaram por subir 1.7%, mas após terem caído uns intensos 8.8% no 4ºT2011. Este acréscimo das importações no 1ºT2011 ficou a dever-se apenas às importações de bens, que subiram 2.7% (-9.7% no 4ºT2011), devendo ter refletido os aumentos nas importações de bens de investimento e de existências, enquanto as importações de serviços contraíram pelo 3º trimestre consecutivo (-3.4% vs -4.1% no 4ºT2011), mas não conseguindo ainda corrigir totalmente o enorme acréscimo de 12.4% observado no 2ºT2011 (refletindo, em grande parte, o pagamento de serviços financeiros ao exterior, associados ao programa de assistência financeira ao país). As exportações também avançaram, recuperando da única queda dos últimos 5 trimestres (+1.8% vs -1.0% no 4ºT2011) e renovando níveis máximos históricos, algo sem paralelo em qualquer outra componente do PIB. Observaram-se subidas quer nas exportações de bens, quer nas de serviços, de forma pouco mais intensa no 1º caso (+2.2% e +0.6%, respetivamente), com as exportações de serviços a não conseguirem bater os níveis máximos históricos do 3ºT2011.
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