Ao centro Elena Salgado (ministra das Finanças de Espanha, por enquanto) e Mário Monti (novo primeiro ministro italiano) ladeados ontem por Olli Rehn (Comissário Europeu) e Juncker (líder do eurogrupo): é deles que depende o futuro do euro. Fonte: Jock Fistick/Bloomberg
Ontem foi a maior plataforma electrónica cambial do mundo a dizer que está a “limpar o pó” aos seus sistemas antigos e a testá-los para funcionar com dracmas (e outras moedas que não transaccionam há mais de uma década…). Hoje, são os líderes de grandes empresas multinacionais a afirmarem no Financial Times que já se estão a preparar essa contingência. Também hoje noticiamos no Negócios que alguns reputados economistas também já discutem em Lisboa o fim do euro, ou pelo menos a saída portuguesa. João Ferreira do Amaral, por exemplo, defende uma saída após uma estabilização da crise (através da emissão de euro obrigações e de uma intervenção do BCE), defendendo a entrada de Portugal no sistema europeu de taxas de câmbio II, uma decisão que precisaria do apoio das autoridades europeias, nomeadamente do BCE, de forma a garantir uma desvalorização cambial suave através de um mecanismo de crawling peg. Os dias até à cimeira da sexta-feira dia 9 serão intensos, e vamos ouvir falar muito mais do fim do euro ou, pelo menos, de possíveis saídas de certos países. Os desafios técnicos e económicos de uma saída do euro são imensos. Aqui ficam alguns dos artigos que estamos a ler (e a reler) sobre o tema:
2. O banco Nomura divulgou há dias um relatório que circulou o mundo onde analisa os riscos de redenominação do euro em novas moedas nacionais. A ideia central é a de que os investidores devem ter presente que há três elementos a ter em conta face a este risco: 1) no caso de uma saída do euro, o mais provável seria que os contratos regidos pela Lei nacional deveriam passar para a nova moeda, enquanto os contratos regidos por outra Lei, ficariam em euros; 2) um país que saia sem acordo dos parceiros, poderá ficar em apuros; 3) uma desintegração total do euro seria caótica.
3. Tyler Durden, no Zero Hedge, nota que o relatório da Nomura é mais uma peça na “retórica” dos bancos para pressionar a Merkel nesta semana decisiva, e frisa que por ali já há muito se falou nos riscos de redenominação. A questão, de facto, já foi debatida várias vezes no último ano. Veja-se, por exemplo, Ricardo Cabral no VOX em 2010. No Negócios e no massa monetária o tema também já passou em Abril deste ano enquadrado no debate associado à reestruturação de dívida. (Na mesma linha de pressão sobre Merkel e os líderes europeus, na qual também se pode incluir a peça de hoje do Financial Times, a Merrill Lynch divulgou na semana passada um artigo onde estimou novas taxas de câmbio).
4. Sobre fim, desagregação, ou saída de países da Zona Euro, poucos têm feito um trabalho tão extenso (defendendo essa caminho) como a rede Research on Money and Finance, em Londres. No seu último relatório defendem a quebra da Zona Euro. A análise é centrada na Grécia, mas é fácil imaginar os argumentos para Portugal. Aí descrevem com algum detalhe o que exigira um processo de saída. Já tínhamos referido o relatório num post anterior onde destacávamos “Propostas para partir da Zona Euro“.
5. A discussão sobre uma quebra da Zona Euro (ou pelo menos saída da Grécia) tem estado em cima da mesa durante toda a crise, especialmente por propostas de norte-americanos, onde se destaca Martin Feldstein. Essas ideias mereceram duras críticas de economistas europeus, entre eles Richard Baldwin e Charles Wyplosz no VoxEU.org. Também no VoxEU.org. Barry Eichengreen, notável historiador, escreveu um artigo (publicado em 2007 e republicado em 2010) onde afirmou que, também por razões técnicas, seria impossível regressar às moedas anteriores ao euro sem criar uma crise sem precedentes: seria a “mãe de todas as crises financeiras“, chamou-lhe.
6. A posição de Eichengreen é contudo contestada por outros eurocépticos. Uma proposta original (embora seja difícil imaginar como poderia funcionar a nível europeu) para ultrapassar as dificuldades técnicas seria passar a diferenciar as moedas e notas de euro pela sua face nacional: assim, por exemplo, as notas e moedas com face portuguesa, passariam a valer menos. Isto enquanto não se colocassem novamente escudos em circulação. A proposta é de Gabriel Stein, no think tank, adamsmith.org e vale a pena ler pelos raciocínios em torno dos desafios de uma quebra da Zona Euro.
7. Finalmente, sobre fins de uniões monetárias, Andrew Rose, uma autoridade no tema, tem um artigo de 2006, cujas principais conclusões recuperou em 2008 no VoxEU.org, onde estudou o que aconteceu em 69 países que, desde a segunda guerra mundial, deixaram uniões monetárias em que estavam inseridos. Compara com 61 países ou territórios que, no mesmo período, se mantiverem em uniões monetárias. Rose conclui que “os países que saíram tendem a ser maiores, mais ricos, e mais democráticos; tendem também a ter uma inflação mais elevada. No entanto, não há tipicamente qualquer movimento macroeconómico dramático antes, durante ou depois da saída”.
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