As medidas de contenção de despesa e os seus efeitos quantitativos serão conhecidos ao longo do tempo, ao longo do processo, sendo que uma ideia clara de conjunto será conhecida com o documento de estratégia orçamental
Vítor Gaspar, 4 de Agosto
No final de Agosto, o ministério das Finanças publicou um documento central na estratégia orçamental do Governo, a que chamou documento de estratégia orçamental (DEO), o qual beneficiou dos conselhos e da aprovação da troika. Aí o Governo estabeleceu o rumo da política orçamental nos próximos anos. Uma das partes mais relevantes, pela proximidade temporal, foi a descrição da natureza da derrapagem orçamental este ano, assim como as medidas (extraordinárias) que seriam tomadas para a compensar, e as medidas (de natureza estrutural) que seriam adoptadas em 2012.
Na página 41 do documento (43 no acrobat reader) está inscrito o objectivo, o desvio orçamental encontrado, e as medidas de correcção a adoptar. Daí se conclui, por exemplo, que o saldo de medidas extraordinárias este ano (reclassificações e BPN do lado da despesa; sobretaxa de IRS, IVA, fundos de pensões da banca e outras do lado da despesa) ronda os 0,9 pontos de PIB – este seria um montante que em 2012 teria de ser compensado com medidas estruturais.
A natureza do ajustamento estrutural em 2012 era aliás confirmada, mais à frente (página 60 do documento, 62 no Acrobat) onde se garantia que se aplicariam medidas avaliadas em 3,8% do PIB: o valor resultava de reduzir o défice orçamental de 5,9% para 4,5% (1,4%), a que se juntariam 0,6% de aumento de juros, 0,8% de efeito do ciclo económico, e os 0,9% de medidas estruturais. Em conjunto somam 3,7 pontos de PIB.
Na página seguinte do DEO estão as medidas que o governo prometia então adoptar, onde não constavam os cortes de dois salários na função pública e nas pensões, prevendo-se apenas o corte de 5% para os pensionistas acima dos 1500 euros em 2012 – o corte do 13º mês este ano também não era repetido. (nota: relativamente a 2012 a soma das medidas no quadro apresentado é de 4,6% do PIB, pois incluia o impacto de não actualizar em 2012 os salários na função pública ou nas pensões o que, na verdade, não teria um efeito adicional em 2012 já que em 2011 também não houve aumentos).
Para ajudar, o massa monetária sintetizou durante a semana a informação num quadro os objectivos e as medidas do Governo inscritas no DEO e pela troika (inscritas do PAEF).
Fonte: Negócios, FMI e Governo
Conclusões:
1) O Governo tinha contas certas para fechar os défices de 2011 e 2012 nos valores acertados com a troika, isto já incluindo o buraco de cerca de dois mil milhões de euros “descoberto” no final de Julho, confirmado pela troika, e incluido no DEO.
2) Relativamente a 2012 a redução e racionalização de de custos nas empresas públicas, nos institutos publicos e noutros daria o maior contributo para a consolidação. Seguir-se-ia o IVA e o corte no investimento. estes três itens em conjunto valeriam 3,5 mil milhões de euros.
3) Não haveria corte salarial na função publica em 2012, a eliminação do 13º mês só aconteceria este ano e as pensões sofreriam apenas um corte de 5% quando ultrapassassem os 1500 euros.
4) Dadas as medidas de consolidação apresentadas ontem, conclui-se que, afinal, o documento de estratégia orçamental, aprovado no final de Agosto, não contava para 2012. Será que conta para a frente?
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