A inflação disparou para 3,6% em Setembro. José Miguel Moreira, do Montepio, analisa os dados divulgados pelo INE e dá conta do que se está a passar com os preços em Portugal. Por um lado, os transportes mantêm-se como a classe que mais puxa pela inflação (mais 9% em termos homólogos em Setembro). Já os preços do vestuário e calçado dispararam mais de 20% entre Agosto e Setembro – mas ainda assim mantêm-se mais baixos que em 2010. Bárbara Marques, do Millennium bcp, realça que o aumento de preços do vestuário e calçado é em parte explicado por alterações metodológias e relembra que as prespectivas para a evolução de preços em 2012 depende em grande medida das opções do OE 2012.
Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium BCP, BPI e NECEP (Universidade Católica), isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.
Bárbara Marques – Gabinete de Estudos do Millennium bcp
1. Em Setembro, o Índice de Preços do Consumidor (IPC) aumentou 3,6% face a período homólogo (+0,8% no mês), surpreendendo na magnitude da subida. Esta evolução explica-se, em grande parte, por alterações metodológicas no tratamento dos preços dos produtos sazonais, que amplificaram o efeito da renovação de colecções de artigos da classe de vestuário e calçado (+24,5% no mês). Dada a sua natureza, observam-se subidas ainda significativas do índice de preços dos bens alimentares (+0,2%) e da restauração e hotelaria (+0.2%), e uma descida dos preços da classe de bens e serviços de lazer (-1,2%).
2. Até ao final do ano, esperam-se efeitos de sentido contrário sobre os preços. A subida da taxa de IVA sobre a electricidade e gás em Outubro constitui um significativo factor no sentido ascendente. A redução dos preços dos combustíveis (mais estáveis ultimamente), a debilidade da procura interna e os efeitos sazonais de sentido inverso aos agora verificados tenderão a moderar a subida dos preços. Um factor de risco adicional prende-se com a evolução dos preços de alguns bens alimentares frescos, tendo em conta eventuais repercussões adversas da reduzida pluviosidade que se faz sentir. Não obstante, o nosso cenário continua a prever um valor médio de inflação em 2011 em torno dos 3,5%.
3. Para 2012, a divulgação do OE2012 reveste-se de particular importância para a definição das pressões inflacionistas decorrentes de opções de política económica, do foro tributário ou do âmbito dos preços regulados, em particular, a revisão da tributação sobre o consumo (tabelas do IVA e impostos especiais) e dos preços de serviços públicos (e.g. saúde, educação, transportes).
José Miguel Moreira – Departamento de Estudos do Montepio
1. Inflação registou uma considerável aceleração, em Setembro, de 2.9% para 3.6%, representando uma interrupção da tendência descendente iniciada em Maio, um comportamento que fora bastante influenciado pela classe de Vestuário e Calçado, em que a entrada das novas coleções implicou um forte acréscimo mensal dos preços de 24.5% e um intenso desagravamento da respectiva queda homóloga (de -11.9% para -1.6%). Tratou-se de um acréscimo superior ao esperado, mas que não deverá colocar em causa a previsão de Inflação anual de 3.5%, para este ano.
2. Em Setembro, o Índice de Preços no Consumidor (IPC) registou um crescimento homólogo de 3,6%, em forte aceleração face aos 2,9% observados em Agosto e interrompendo a tendência descendente iniciada em Maio, após um longo período de quase 2 anos em ascensão. Em termos mensais, o IPC registou um forte acréscimo de 0.8%, o 1º dos últimos 5 meses (-0.4%, em agosto), bastante influenciado pela entrada da nova coleção dos artigos da classe do Vestuário e Calçado, que implicou um acréscimo mensal de 24.5%, depois do período alargado de saldos ter resultado em contributos negativos nos dois mês anteriores (-11.8% e -11.4% em agosto e julho, respetivamente). É de salientar que a grande maioria das restantes classes apresentou contribuições reduzidas para a variação mensal do índice total.
3. A Inflação Homóloga continuou a ser impulsionada, sobretudo, pela classe dos Transportes, que manteve a maior contribuição, observando uma nova aceleração, de 8.5% para 9.2%, seguida da de Habitação, Água, Eletricidade, Gás e Outros Combustíveis, cuja variação homóloga permaneceu relativamente inalterada nos 4.7% (+4.8%, no mês anterior) e da Saúde. Já entre os contributos para a aceleração do crescimento homólogo dos preços destacam-se os dados pelas classes dos Produtos Alimentares e Bebidas Não Alcoólicas, do Vestuário e Calçado, da Saúde e dos Transportes. As únicas contribuições negativas para a taxa de variação homóloga do IPC foram, uma vez mais, dadas pela classe do Vestuário e Calçado, embora em natural considerável desagravamento (de -11.9% para -1.6%), refletindo o referido forte acréscimo mensal, que se viu agora também acompanhada da classe de Lazer, Recreação e Cultura, embora de uma forma muito marginal (-0.1%).
4. A taxa de variação homóloga do IPC Core (que exclui a Energia e os Bens Alimentares Não Transformados) foi de 2.5%, bastante inferior à do IPC geral, mas representando uma aceleração idêntica à observada por este último (+0.7 p.p.). O diferencial entre a taxa de variação homóloga deste indicador e a do IPC permaneceu negativa pelo 22º mês consecutivo, mantendo-se a evidenciar que as pressões inflacionistas advêm, essencialmente, dos preços da energia. Todavia, e como revelam estes dados, a Inflação Core também não está imune às alterações fiscais que têm vindo a ser efetuadas desde meados de 2010. O Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) registou um acréscimo mensal ligeiramente menos intenso (+0.6%), mas igualmente forte, tendo a sua variação homóloga acelerado o mesmo que o IPC, embora mantendo-se num nível inferior (passou de +2.8% para +3.5%). O IPCH português apresenta um crescimento homólogo acima do estimado pelo Eurostat para a Zona Euro (+3.0%), o que acontece desde agosto de 2007, tendo-se assistido a um aumento dessa diferença, de 0.3 p.p. para 0.5 p.p..
5. Em termos prospetivos, continuamos a considerar que as actuais pressões inflacionistas assumem um caráter largamente temporário, prevendo-se o regresso da Inflação para níveis mais modestos, traduzindo uma evolução mais em linha com a dos habituais determinantes macroeconómicos, num contexto de estabilização do preço do petróleo e de crescimentos moderados do preço das importações de bens não energéticos e dos custos salariais.
6. Recorde-se que as últimas previsões económicas oficiais para o país, publicadas pelo Banco de Portugal (BdP), no passado dia 6 de outubro, vieram apontar para uma Taxa de Inflação de 3.5%, para 2011, um valor relativamente em linha com os previstos pelo pelo Ministério das Finanças (+3.5%) e pelas principais entidades internacionais (+3.4%, pelo FMI e pela Comissão Europeia). Mesmo com este acréscimo superior ao esperado no mês de setembro, consideramos os 3.5% como exequíveis. Já para 2012, o BdP prevê um regresso da Inflação para níveis mais modestos (+2.4%), traduzindo uma desaceleração tanto da componente não-energética, como da energética. Esta evolução traduz, por um lado, a dissipação de efeitos de base decorrentes do aumento da taxa normal do IVA no início de 2011 e, por outro, o abrandamento dos preços de importação de bens não-energéticos, sendo que o crescimento dos custos salariais deverá ser bastante moderado, num contexto de persistente fraqueza da Procura Interna. Estas previsões de Inflação do BdP representam, no entanto, ligeiras revisões em alta face às anteriores projeções de verão (+0.1 p.p., em 2011, e 0.2 p.p., em 2012), que a Autoridade refere traduzir tanto o impacto do aumento da tributação indireta aplicável à eletricidade e ao gás, como o impacto sobre a Inflação em 2012 do crescimento superior ao antecipado dos preços de importação de bens não-energéticos em 2011. Ao nível dos riscos para a Inflação, estes apresentam-se relativamente equilibrados, sendo de destacar, do lado ascendente, o impacto das diversas medidas orçamentais (alteração das tabelas do IVA e o aumento de diversos preços fixados administrativamente, por exemplo), bem como a necessidade de especificação de medidas adicionais, que poderão determinar um aumento dos preços superior ao antecipado, e, do lado descendente, o abrandamento da economia mundial e os consequentes impactos descendentes sobre a procura e os preços internacionais de matérias-primas, que poderão conduzir a um menor crescimento dos preços das importações.
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