A inflação abrandou, mas mantém-se acima dos 3%. Miguel Moreira, do Montepio, explica porque é que o aumento dos preços deverá continuar a cair durante este ano e o próximo.
Nota do editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, Millennium BCP, BPI e NECEP (Universidade Católica), isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.
Miguel Moreira – Departamento de Estudos do Montepio
1. Inflação registou uma desaceleração, em julho, de 3.4% para 3.2%, refletindo, em parte, o efeito base do aumento das taxas do IVA ocorrido em meados de 2010 e com a classe dos Transportes a evidenciar, uma vez mais, uma das maiores desacelerações dos preços, refletindo a própria evolução dos preços da Energia nos mercados internacionais. Tratou-se da 3ª desaceleração, confirmando da tendência descendente iniciada em maio, após um longo período de quase 2 anos em ascensão e depois de se ter observado um agravamento muito intenso em janeiro – refletindo o considerável aumento da taxa normal do IVA no início deste ano. Em termos prospetivos, continuamos a considerar que o recente aumento da Inflação deverá assumir um caráter largamente temporário, prevendo-se o seu regresso para níveis mais modestos, traduzindo uma evolução mais em linha com a dos habituais determinantes macroeconómicos, revendo-se uma Inflação média anual de 2.4%, para este ano, em linha com o recentemente previsto pelo BdP, embora se admita que a desaceleração para 2012 possa ser ligeiramente mais intensa do que a prevista por esta Autoridade (para +2.1%, quando o BdP prevê +2.2%). Note-se, que permanecem, ainda, riscos ascendentes para a Inflação, em 2011 e 2012, devido, designadamente, à instabilidade política que ainda persiste nos países produtores de Petróleo e que poderá levar a subidas dos preços dessa matéria-prima.
2. Em julho, o Índice de Preços no Consumidor (IPC) registou um crescimento homólogo de 3.2%, o que representa o terceiro recuo consecutivo e a confirmação da tendência descendente iniciada em maio, após um longo período de quase 2 anos em ascensão e depois de se ter observado um agravamento muito intenso em janeiro (+1.1 p.p.) – em consequência do considerável aumento da taxa normal do IVA no início deste ano (de 21% para 23%). Esta desaceleração reflete, em parte, o efeito base do aumento das taxas do IVA ocorrido em julho de 2010 e representa o afastar do crescimento homólogo de 4.1% em abril, o mais elevado desde fevereiro de 2003. Em termos mensais, o IPC registou o 3º decréscimo consecutivo (-0.1% vs -0.2%, em junho), bastante influenciada pelo período de saldos nos artigos da classe do Vestuário e Calçado, que, com uma variação mensal de -11.4%, apresentou uma contribuição negativa muito significativa. É de salientar, no entanto, que a grande maioria das classes apresentou contribuições positivas para a variação mensal do índice total, sendo de destacar o contributo das classes dos Transportes e da Saúde, com variações mensais de 0.9% e 1.5%, respetivamente. A Inflação Homóloga continuou a ser impulsionada, sobretudo, pela classe dos Transportes, que manteve a maior contribuição para a variação homóloga do IPC, não obstante ter voltado a desacelerar, de 8.7% para 8.1%, seguida da de Habitação, Água, Eletricidade, Gás e Outros Combustíveis, igualmente em desaceleração. A única contribuição negativa para a taxa de variação homóloga do IPC foi, uma vez mais, dada pela classe do Vestuário e Calçado, que se agravou, refletindo a referida queda mensal.
3. Já a taxa de variação homóloga do IPC Core (que exclui a Energia e os Bens Alimentares Não Transformados) foi de 2.1%, bastante inferior à do IPC geral, mas representando uma desaceleração idêntica à observada por este último (-0.2 p.p.). O diferencial entre a taxa de variação homóloga deste indicador e a do IPC continuou, assim, a assumir um valor negativo, pela 20ª vez (consecutiva) desde outubro de 2008, mantendo-se a evidenciar que as pressões inflacionistas advêm, essencialmente, dos preços das Commodities. Todavia, e como revelam estes dados, a Inflação Core também não está imune às alterações fiscais observadas (em meados de 2012 e no início do ano). O Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) registou um acréscimo mensal de 0.1%, tendo a sua variação homóloga desacelerado ligeiramente mais do que o IPC, mantendo-se num nível inferior (-0.3 p.p., para 3.0%). O IPCH português apresenta um crescimento homólogo acima do estimado pelo Eurostat para a Zona Euro (+2.5%), o que acontece pela 13ª vez (consecutiva) desde agosto de 2007, tendo-se assistido a uma diminuição dessa diferença, de 0.6 p.p. para 0.5 p.p..
4. Em termos prospetivos, continuamos a considerar que o recente aumento da Inflação deverá assumir um caráter largamente temporário, prevendo-se o seu regresso para níveis mais modestos, traduzindo uma evolução mais em linha com a dos habituais determinantes macroeconómicos, num contexto de virtual estabilização do preço do petróleo e de crescimento moderado do preço das importações de bens não energéticos e dos custos salariais. Recorde-se que as últimas previsões económicas para o país foram publicadas pelo Banco de Portugal (BdP), em meados de julho, tendo a Autoridade vindo apontar para uma Taxa de Inflação de 3.4%, para 2011 (anteriormente, era de +3.6%) – em linha com os valores previstos pelas principais entidades internacionais (+3.5%, pelo FMI, e +3.4% e +3.3% pela Comissão Europeia e a OCDE, respetivamente) – prevendo, para 2012, um regresso da mesma para níveis mais modestos (2.2%), refletindo a persistente fraqueza da Procura Interna e a dissipação dos efeitos de base relativos aos impostos indiretos e aos preços das Commodities energéticas. Esta é, também, a nossa perspetiva, para este ano, embora apontemos, para já, para uma desaceleração ligeiramente mais intensa, em 2012, para 2.1%. Note-se, que permanecem, ainda, riscos ascendentes para a Inflação, em 2011 e 2012, devido, designadamente, à instabilidade política que ainda persiste nos países produtores de Petróleo e que poderá levar a subidas dos preços dessa matéria-prima.
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