BCE corrige: Ao contrário do inicialmente comunicado pelos serviços do banco central, a maior parte dos lucros com as compras de dívida pública ao abrigo do programa de Expansão Quantitativa vão, afinal, ser nacionalizados, alinhando-os com o tratamento dado aos riscos que também ficarão na sua maior parte com os bancos centrais nacionais. As consequências são positivas para as contas públicas nacionais, como mostramos neste post.
O Negócios foi um dos jornais na Europa que, com base em informação prestada pelo BCE, escreveu que o BCE nacionalizaria os riscos das compras feitas ao abrigo do novo programa de alívio quantitativo, mas partilharia os lucros. Em entrevista ao Negócios Peter Praet, um dos membros do Conselho Executivo do BCE diz que, afinal, já não vai ser assim:
Decidiram que cerca de 90% do risco das obrigações adquiridas será nacional, e que 10% ficará no Eurosistema. No entanto, os lucros deverão ser partilhados …
Considerando todas as compras adicionais, obrigações de dívida soberana e de instituições europeias, cerca de 20% do risco será partilhado e 80% será suportado pelo Banco Central Nacional. Os documentos legais ainda não foram publicados. Várias opções foram consideradas, mas para a parte do portfólio que não é partilhada, a intenção do Conselho é ter essencialmente a mesma abordagem para lucros e prejuízos.
O melhor talvez seja esperar por todas as decisões em Frankfurt até o programa chegar ao terreno, mas é já certo que esta opção favorece os cofres nacionais. Vejamos.
Vamos assumir que o Eurosistema compra 11,1 mil milhões de euros de dívida pública e que 90% dos lucros (e dos riscos) ficam com o banco central nacional, que os passa ao Governo em forma de dividendos. Isto significa que:
– O Estado paga ao Eurosistema, por ano, cerca de 388,5 milhões de euros em juros (assumindo uma taxa de juro de 3,5% aplicada sobre os 11,1 mil milhões de euros).
– Mas recebe de volta cerca de 350 milhões de euros (3,5% aplicados a 90% dos 11,1 mil milhões de euros).
Esta situação é positiva para Portugal face à solução inicial em que os lucros são mutualizados, essencialmente porque a taxa de juro nacional é superior à média da Zona Euro – Como mostrámos antes, caso os lucros fossem mutualizados, o BCE juntaria os lucros conseguidos com todas as compras de obrigações na Zona euro que depois devolveria com base na chave de capital. Tal o que implicaria uma remuneração à taxa de juro média, que vamos admitir é metade da nacional. Ou seja, nesse cenário Portugal pagaria na mesma os cerca de 388,5 milhões de euros ao BCE, mas receberia de volta apenas 175 milhões de euros (1,75% aplicados a 90% dos 11,1 mil milhões de euros).
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