Suzy Menkes analisa a exposição Horst no londrino V&A
Linhas gráficas desenhadas a preto e branco, como num projeto, percorrem um espaço estreito, seguindo o padrão geométrico do soalho, passando pelas fotografias emolduradas de modelos graciosas e descendo até um conjunto de vestidos mostrados em manequins.
Na parede da sala de entrada desta exposição no Museu Victoria & Albert, em Londres, lê-se uma palavra em letras tridimensionais austeras: H O R S T.
A exposição é um tributo a um fotógrafo que passou do Bauhaus para a alta costura ao longo de uma frutuosa carreira de 60 anos.
O resultado é um triunfo para a curadora, Susanna Brown, cuja exposição Horst: Photographer of Style (patente até dia 4 de janeiro), capta o homem e a sua obra de uma forma clara e meticulosa.
O percurso inicia-se com uma investigação de fotográficas icónicas, mostrando o elegante chiaroscuro de luz e sombras que tornou o fotógrafo famoso na década de 1930.
A mostra prossegue, revelando a ligação de Horst a Salvador Dalí e aos surrealistas, e a sua forma rigorosa de retratar as estrelas do grande ecrã, como Rita Hayworth e Ginger Rogers. Uma explosão final de cor aparece materializada em 94 capas da Vogue e 25 fotografias gigantes, recentemente impressas a partir do arquivo da Condé Nast.
No seu conjunto, a exposição emite uma energia poderosa, demonstrando conhecimentos profundos exprimidos com delicadeza.
Susanna Brown dedicou uma pequena parte da exposição de Horst ao erotismo estilizado do trabalho privado do fotógrafo: o entrelaçamento gráfico dos corpos masculinos musculados na década de 1950 que precedeu o trabalho mais explícito de Robert Mapplethorpe na década de 1980. Reparei que as esculturas corporais vistas através da lente de Horst foram emprestadas pela coleção privada de Elton John/David Furnish.
Sinto uma afinidade muito particular com Horst, embora nunca tenha trabalhado com ele. Durante a minha investigação para escrever The Windsor Style – o meu livro sobre o duque e a duquesa de Windsor –, o companheiro de longa data de Horst, Valentine Lawford, convidou-me para visitar a sua casa em Oyster Bay Cove, Long Island, onde vislumbrei uma vida inteira marcada pelo modernismo, nascida de um estágio como aprendiz do arquiteto Le Corbusier em 1930.
Esse estilo marcado por linhas simples era intersectado por toques românticos, como desenhos de Christian Bérard, tapetes tunisinos coloridos e repletos de padrões, e o luxuriante jardim em redor.
Valentine Lawford continuava a ser o mesmo diplomata inglês impecável que era quando se apaixonaram em 1947. Acompanhada por ele, andámos por entre arquivos guardados em caixas de sapatos, examinando fotografias dos Windsor na sua mansão parisiense com vestígios de objetos reais anteriores à abdicação do duque e a coleção pessoal de pugs Meissen de Wallis a condizer com os animais vivos sentados a seus pés.
A maioria do trabalho de Horst é excecionalmente conhecido – o que significa que estas imagens icónicas são como amigos familiares: Coco Chanel reclinada num sofá, com o seu perfil cinzelado suavizado pelo seu olhar doce projetado para o infinito; Marlene Dietrich no seu sóbrio fato preto e o chapéu a condizer ensombrando-lhe os olhos esfumados.
E, como não poderia deixar de ser, a fotografia que realmente merece a descrição de “icónica”: o corpete de atilhos Mainbocher datado de 1939 que foi a última imagem captada por Horst antes da sua fuga de Paris para Nova Iorque no início da guerra.
As modelos são lendárias por si só, por vezes integradas na alta sociedade, como Gloria Vanderbilt, uma beleza de lábios carnudos na Nova Iorque de 1941. Ou a omnipresente modelo sueca Lisa Fonssagrives, tão elegante num casaco em pele de leopardo Molyneux como um Chanel preto clássico.
A curadora apelida Horst de “mágico da luz”. Ela descobriu variações das belas e familiares imagens, para podermos compreender melhor o processo da captura do retrato. Por exemplo, Carmen Dell’Orefice – a única modelo de Horst ainda viva – foi fotografada a receber uma massagem facial em 1946. A imagem foi primeiro captada de frente e depois na perspetiva dramática em que a imagem foi publicada.
Fruto de um cuidadoso trabalho de investigação, o catálogo que acompanha a exposição conta com declarações da modelo, explicando como Horst via a beleza clássica escondida atrás do seu cabelo.
As roupas mostradas na exposição são de designers da época, como Chanel, Lanvin, Maggy Rouff e Vionnet. Não sendo necessariamente cópias das que figuram nas fotografias em seu redor, evocam gestos de moda semelhantes: tecidos metálicos de aspeto líquido, fitas negras e drapeados que se refletem na parede espelhada. As peças de roupa são tão pequenas que o museu teve de encomendar manequins feitos por medida.
O choque de passar da primeira sala, composta por luzes e sombras, para os anos vibrantes e coloridos de Dalí é deliberado e eficaz. Esta secção do trabalho de Horst com Elsa Schiaparelli e Dalí sublinha o quanto as artes visuais se misturam naquele prolífico período parisiense anterior às duas guerras mundiais,
Mais uma vez, a exposição mostra surpresas, como os esboços originais desenhados a lápis por Horst para a imagem do corpete Mainbocher, e instalações digitais de outros cadernos de desenhos que folheiam as páginas automaticamente.
Outro efeito do século XXI é o acesso instantâneo ao vasto registo de casas e jardins (incluindo o seu) fotografados por Horst. Um simples toque no ecrã abre páginas de artigos publicados em revistas.
Gostava que as impressionantes capas da Vogue – a primeira datada de 1935, com a princesa Sherbatow vestindo veludo vermelho – tivessem sido acompanhadas pela digitalização dos conteúdos das respetivas revistas.
Outros elementos da obra de Horst surpreenderam-me: as imagens da natureza captadas no pós-guerra, com grandes planos de plantas, conchas e minerais – embora eu conhecesse a obsessão do casal pelo jardim da sua casa em Oyster Bay.
E quando pensamos que esta magnífica exposição está a chegar ao fim, deparamo-nos com novos brindes: um filme de Horst dirigindo uma sessão fotográfica, ainda parecendo o jovem alemão que cativou Luchiano Visconti e o Barão George Hoyningen-Huene, que serviram de mentores ao seu protegido até o aluno superar o mestre.
Não tenho conhecimentos fotográficos suficientes para compreender todas as implicações da impressão em platina-paládio.
Contudo, qualquer amante de arte, fotografia e moda sairia da exposição admirando a profundidade deste trabalho aparentemente superficial e a excelente forma como o V&A o apresentou.