Recessão à porta

21/01/2011
Colocado por: Rui Peres Jorge

Nota editor: No “Reacção dos Economistas” pode ler, sem edição do Negócios, a análise aos principais indicadores económicos pelos gabinetes de estudos do Montepio, MillenniumBCP e NECEP (Universidade Católica), isto sem prejuízo de outras contribuições menos regulares. Esta é parte da “matéria-prima” com que o Negócios trabalha e que agora fica também ao seu dispor.  

 

Crédito desacelera e a economia terá entrado em terreno negativo em Dezembro, mede o Banco de Portugal. João César das Neves professor na Universidade Católica, e Rui Serra, economista-chefe, e José Miguel Moreira, do Montepio, analisam os indicadores de conjuntura do BdP.

 

João César das Neves – professor da Universidade Católica

 

1. São sinais que indicam o começo de uma evolução desfavorável na actividade económica. Evidentemente que ainda é cedo para falar em recessão, mas pode dizer-se que «está a bater à porta», como afirma, simplesmente porque estamos à espera dela. É significativo o mau comportamento do orçamento, que supostamente devia ter sido de austeridade, e positivo o comportamento da balança comercial.

 

Rui Serra – Departamento de Estudos do Montepio

 

1) Em Dezembro, o Indicador Coincidente mensal para a evolução homóloga tendencial da Actividade Económica portuguesa, calculado pelo Banco de Portugal (BdP), apresentou uma diminuição, de 0.2% (valor revisto em baixa, em 0.1 p.p.) para -0.1%, entrando em terreno negativo pela 1ª vez desde Novembro de 2009. Trata-se de um comportamento que, a avaliar pela informação divulgada nos Indicadores de Conjuntura do BdP, reflecte, essencialmente, os dados desfavoráveis do Consumo, já que, ao nível do Investimento, assistiu-se a um comportamento, em média, mais favorável. Com efeito, no mesmo período, o Indicador Coincidente para a evolução homóloga tendencial do Consumo Privado, igualmente calculado pelo BdP, registou a sua 8ª desaceleração consecutiva, de -0.1% (valor revisto em alta, em 0.3 p.p.) para -0.5%, encontrando-se pela 2ª vez consecutiva em terreno negativo e num mínimo desde Julho de 2009, após 14 meses a apresentar valores positivos.

 

2) Assim, em resultado da desaceleração do Indicador Coincidente da Actividade Económica, este encontra-se a sinalizar, para o 4ºT2010, uma forte contracção de 1.4% da economia face ao trimestre anterior. Terá sido com base nas indicações dadas por este indicador que o BdP, no seu Boletim Económico de Inverno, veio prever um crescimento médio anual de 1.3%, em 2010, o que tem implícita uma contracção trimestral entre 0.7% e 1.1%, no 4ºT2010. Todavia, continuamos a esperar que o 4ºT2010 tenha sido menos desfavorável do que perspectivado pela maioria das entidades, acreditando-se que a economia possa ter estagnado, ao ser suportada pelo efeito de antecipação nas aquisições de Bens Duradouros por parte de alguns agentes, atendendo ao agravamento da carga fiscal neste início de ano.

 

3) Neste contexto, e ao contrário da indicação dada pelo Indicador Coincidente do Consumo Privado do BdP, que aponta para uma contracção trimestral de 0.6% do Consumo, continuamos a estimar que o Consumo Privado tenha expandido cerca de 0.6%, no 4ºT2010, conseguindo contrariar o contributo negativo que esperamos ter advindo das Exportações Líquidas – cujas Importações terão registado um forte acréscimo, impulsionadas pelo extraordinário aumento das Vendas de Carros, observado no final do trimestre -, o que terá permitido ao PIB manter-se relativamente estagnado, no âmbito de um contributo do Consumo Público que esperamos negligenciável e de um Investimento que deverá ter sido algo beneficiado na sua componente de Material de Transporte, mas, por outro lado, penalizado pela de Construção – conforme evidenciam os dados da Produção na Construção.

 

José Miguel Moreira – Departamento de Estudos do Montepio

 

1) Os Empréstimos Bancários Concedidos ao Sector Não Monetário (excluindo administrações públicas) registaram, em Novembro, um crescimento homólogo de 1.7%, uma considerável desaceleração (a 2ª consecutiva) de 0.6 p.p., reflectindo, sobretudo, a queda de 1.5% dos Empréstimos às Instituições Financeiras Não Monetárias (+8.3%, em Outubro), mas, também, uma ligeira desaceleração nos Empréstimos Concedidos ao Sector Privado Não Financeiro (de +2.0% para +1.9%, o menor ritmo de crescimento desde Maio). Por seu lado, a desaceleração destes últimos resultou de uma diminuição do crescimento tanto dos Empréstimos às Sociedades Não Financeiras (de +1.5% para +1.4%), como dos Empréstimos a Particulares (de +2.4% para +2.2%), estes, reflectindo o comportamento menos favorável no Crédito à Habitação e no Crédito para Consumo e Outros Fins, que mantiveram a tendência de desaceleração evidenciada nos últimos meses, registando crescimentos de 2.6% e 0.3% (+2.8% e +0.7%, em Outubro).

 

2) Estes últimos dados sobre o Mercado de Crédito em Portugal continuaram, assim, dar conta da tendência de desaceleração do Crédito ao Sector Privado, com a principal novidade da leitura de Novembro a ser o facto de esta desaceleração ter resultado de um comportamento menos favorável tanto do habitual segmento de Particulares, como, desta vez, também de Empresas (o 1º abrandamento do últimos 3 meses), evidenciando, desta forma, um certo retrocesso nos sinais de melhoria que se vinham a observar nos meses anteriores. Estes dados permaneceram, neste sentido, a revelar uma fraca dinâmica do Mercado de Crédito, o qual se encontra afectado pela deterioração das condições de financiamento da economia portuguesa nos mercados internacionais, permanecendo, assim, tal como a situação deteriorada em que se encontra o Mercado Laboral, como um importante constrangimento a uma recuperação mais célere da actividade económica.

 

3) Estes dados parecem, assim, vir confirmar os resultados do último Inquérito aos Bancos sobre o Mercado de Crédito, realizado em Outubro passado, em que os cinco maiores grupos bancários portugueses anteciparam, para o 4ºT2010, uma maior restritividade dos Critérios de Concessão de Empréstimos, sobretudo no segmento de Empresas, perspectivando, no de Particulares, um aperto ligeiro no Crédito à Habitação e uma quase estabilização no Crédito ao Consumo e Outros Fins. Quanto à Procura de Empréstimos, os bancos anteciparam, em média, uma ligeira redução nas Empresas, salvo no segmento a curto prazo, prevendo, no caso dos Particulares, uma diminuição considerável na procura de Crédito à Habitação e um decréscimo ligeiro na de Crédito ao Consumo e Outros Fins.

 

4) Neste sentido, para o último mês do ano, não se esperam grandes melhorias da actividade creditícia, pese embora admitir-se subidas pontuais em alguns segmentos, designadamente no Crédito ao Consumo e Outros Fins, associado ao forte acréscimo de Bens de Consumo Duradouro que estimamos para esse mês, designadamente de veículos automóveis – em antecipação ao agravamento da carga fiscal observada no início deste ano.

Rui Peres Jorge