Ainda o dérbi
Bom dérbi: esta pode ser a primeira ideia a reter da noite de ontem. Segunda? Se já se sabia que o Benfica era candidato ao título – os 22 jogos sem perder dizem tudo sobre o momento vivido pelos encarnados – ontem percebeu-se que os leões também podem acreditar. É verdade que perderam, que há 4 pontos de atraso para os da Luz, mas quem joga assim fora de casa, encostando o rival às cordas vários momentos, tem toda a legitimidade para sonhar.
No futebol não há vencedores justos nem injustos. Nas redes sociais no final do jogo percebia-se que os adeptos encarnados respiravam de alívio e que os leões se queixavam de falta de sorte. Mas afinal o que decidiu o dérbi? A fenomenal cabeçada de Javi, que fez a diferença no marcador e os falhanços do Sporting na hora da verdade. De La Palisse mas sempre certeiro: ganha quem marca e o Benfica foi vencedor justo. Justíssimo até pela maneira como soube sofrer, não perder a cabeça perante a adversidade de ficar com menos um aos 64’, tapando os caminhos para a baliza de Artur. E quando o leão conseguiu encontrá-los, lá estava Artur, magnífico. Que classe do brasileiro.
O Benfica de Jesus esta época não encanta, ouve-se. É verdade. Mesmo ontem não foi o que aconteceu. Mas muito mais importante, também não é o flop da época passada, em que mais do que não encantar, deixava a desejar tantas e tantas vezes. JJ parece estar agora a construir uma equipa diferente das duas primeiras épocas. Menos explosiva e dada a cavalgadas como no ano do título, mas mais cerebral e equilibrada do que as duas anteriores. Ajuda a classe e maturidade de Aimar, a agressividade de Javi, o “savoir-faire” de Witsel, os fogachos de Bruno César e a genialidade intermitente de Gaitán. O argentino é grande quando atira ao poste, ausente e irritante durante momentos da partida. Não se lhe pode pedir tudo e ali há mesmo talento. Tanto.
Domingos não teve sorte? Sim, mas também não entrou com tudo. Preferiu a abordagem cautelosa e só mais tarde arriscou. Demasiado tarde. É verdade que perdeu Matías muito cedo e com isso capacidade nas bolas paradas e no controlo do meio-campo, mas Carriço primeiro e André Santos depois cheiravam a contenção. Este Sporting não parece talhado para reflexões e momentos de acalmia. Dá-se melhor com correrias, repentismo, ataque e menos pensamento. São assim Capel, Carrillo, Elias, Wolfswinkel, Insúa e João Pereira. Schaars e Matías têm tudo o resto, mas são poucos e não há quem faça de Rinaudo como o próprio. Aliás, quem sabe não será esse o maior inimigo do leão para a candidatura desejada.
Não fossem as últimas labaredas e o dérbi tinha sido uma festa. Mas mesmo manchado foi mágico. Não há jogo como este. Viva o futebol!
Texto escrito na noite do dérbi e publicado na versão impressa do Record no dia seguinte, na rúbrica, “O dérbi visto por”… mim, claro.