O Senhor Ferreira
Conheci-o numa TV a preto e branco e a cores nos cromos da bola que vinham a embrulhar rebuçados.
Era o tempo em que havia vacas na leitaria, afiadores de facas nas ruas e campos de futebol um pouco por todo o lado.
Eusébio era igual a Benfica. Benfica era igual a Eusébio.
Mas havia mais jogadores. Eu, por exemplo, sempre gostei mas do Coluna que do Eusébio. O primeiro era mais parecido com o meu avô Queirós. Se calhar era isso.
Mais tarde, vi Eusébio jogar salvo erro com a camisola do Beira-Mar. Estive quase a vê-lo jogar com a camisola do U. Tomar mas o meu avô Ferro preferiu dar um passeio pelas margens do Nabão depois de um almoço naquelas pensões onde as criadas andavam de avental.
O tempo passou e finalmente conheci-o pessoalmente. Foi no Euro 84, em França. Eusébio integrava a comitiva dos Patrícios e queria um carro. Bruno Santos, o responsável pela comunicação e não só, não deixou. O assunto era delicado e quase passava incólume. Mas como eu tinha apenas 22 anos na altura…revelei-o. Parece que nem o Bruno nem o Eusébio gostaram.
Nunca almocei nem jantei com o “King” – ao contrário de 156.789 pessoas que já o confessaram – mas tenho muitos amigos que o conheciam bem. O Ferreira era um boémio, como se diz: um homem da noite. No fundo era o Pantera Negra. Em síntese, “um gajo porreiro”.
Aos 71 anos, o fim do caminho. Sim, mas também o princípio da lenda. Eusébio nasceu no dia em que morreu.