Se Jesus fosse um psicopata, a loucura seria divina
Tal como ficou demonstrado no filme “Bodyguard”, com Kevin Costner e Whitney Houston, nem sempre sinais evidentes de psicopatia apontam para o criminoso.
Não raras vezes o bastardo está no meio de nós e até nos dá palmadinhas nas costas.
Jorge Jesus, apresentado na sua biografia como “O Carinhas”, mais uma vez é notícia não propriamente pelo que é como treinador mas pelo que é como agitador embora as duas coisas às vezes se confundam.
Que se saiba, o técnico do Benfica não deu um cachaço a um bandeirinha nem mordeu um apanha-bolas. Apenas exorbitou, o que está dentro das suas funções e se enquadra perfeitamente no seu perfil psicológico.
JJ é aquele homem que caldeia o sagrado com o profano e, atente-se, não tem culpa de se chamar Jesus. Podia chamar-se Antunes e era a mesma coisa.
Quem por aqui anda sabe bem que é um dos meus treinadores preferidos. Apanhei-o em Guimarães e em Braga, nunca joguei à sueca com ele, nunca lhe telefonei, mas foi sempre uma pessoa afável quando o contactei pessoalmente. Conheço quem o conhece bem e registo o quanto o apreciam.
JJ é provavelmente o antigo jogador português que atingiu algum nível que jogou em mais clubes e como treinador também foi um globetrotter.
Como jogador, recorde-se, finalizou a sua carreira no Almancilense, na época de1989/90, o que hoje é um facto relevante da história deste clube algarvio, onde chegou depois de passagens por grémios de vários latitudes, do Riopele ao Benfica de Castelo Branco.
Como treinador, começou no Amora, quando a equipa da margem sul fazia algum furor, e seguiu-se o Felgueiras. No primeiro clube esteve 4 época e no segundo 4 épocas e meia. Um primeiro sinal de que é um treinador perene nos clubes por onde passa, o que também é uma raridade no nosso futebol
Até chegar ao Benfica, ainda foi a tempo de ser o salvador do V. Guimarães e no Belenenses fez o tal trabalho que, apesar de um défice que nunca resolverá em termos de comunicação, o catapultou finalmente para o estatuto de candidato a treinador de uma equipa de primeira linha.
O resto da história não é preciso lembrar pois ainda está tudo muito fresco. Cinco épocas no Benfica, dois campeonatos e duas finais europeias, o que acho que chega para justificar a aposta. Apenas se acrescenta que pelo meio várias vezes Pinto da Costa o tentou desviar para o Dragão – não tanto por o considerar o supra sumo dos treinadores mas sobretudo para evitar o que viria a acontecer no Benfica.
Tem agora Jesus pela frente mais um grande desafio. Mas quem o conhece sabe que é disso mesmo que ele gosta. Porque para Jesus o futebol é uma forma de estar na vida, uma profissão de fé.
Convenhamos, isto sem ele não teria a mesma piada. Só ele e Manuel Machado, embora este num registo de profunda erudição, nos conseguem fazer esperar por uma flash ou uma conferência de imprensa.
Voltando ao início, o que Jesus representa no nosso futebol é, para mim, uma espécie de brisa de loucura que por momentos até nos faz acreditar no divino, como se tudo se não resumisse, afinal, a um sopro na história do Universo. Ou se calhar nem isso.
Mais a mais, JJ tem como factótum José António Saraiva, também ele uma espécie de pária no mundo do jornalismo, onde tem um percurso marcado pelo sucesso e pela originalidade.