— ler mais..

Um estudo divulgado a semana passada dá conta do preocupante aumento da indisciplina nas escolas portuguesas. O contrário, reconheço, é que me espantaria. Oito em cada dez professores concordam no ..." /> — ler mais..

Um estudo divulgado a semana passada dá conta do preocupante aumento da indisciplina nas escolas portuguesas. O contrário, reconheço, é que me espantaria. Oito em cada dez professores concordam no ..." /> Quinta do Careca - Record

Quinta do Careca

Crónicas da Sábado: os culpados pela indisciplina nas escolas

18 Abril, 2014 0

Um estudo divulgado a semana passada dá conta do preocupante aumento da indisciplina nas escolas portuguesas. O contrário, reconheço, é que me espantaria. Oito em cada dez professores concordam no agravamento do problema, dividindo as responsabilidades, quase em partes idênticas, pelos pais, pelas políticas governamentais e pelos alunos. Apenas 3% dos inquiridos atribui as culpas pelo triste fenómeno aos próprios docentes.

O tema é complexo e merece análise profunda, pelo que me limito a dar uma simples opinião. Quanto ao envolvimento dos progenitores, ele é evidente e compreende-se até que as dificuldades aumentem na medida em que o dinheiro vá faltando para as despesas familiares básicas. A desilusão e a amargura no que respeita às perspectivas de futuro igualmente não contribuem para um ambiente saudável. Mas a verdade é que a indiferença dos pais, a falência dos princípios – ai, a sofreguidão pelo consumo! – e o desprezo pelos valores já vêm detrás. É um longo percurso de demissão.

Se as políticas dos governos têm sido erradas, e não o serão por escassez de currículo dos últimos titulares da pasta da Educação, os cortes orçamentais, a redução de pessoal e a guerra eterna com os sindicatos só podem ter gerado maior insatisfação e revolta. A tempestade social tem custos elevados.

Finalmente, apontar o dedo aos alunos pela indisciplina é quase o mesmo que atribuir aos pobres as culpas por se encontrarem na miséria. As crianças e os jovens são muito aquilo que lhes é permitido ser – é a velha história do tempo, que vai desgraçado, e das circunstâncias, que são dramáticas. Não vivemos no melhor dos mundos, exige-se o que não existe para dar.

Mas os alunos são, também, muito do que vêem fazer os mais velhos. E sendo hoje a televisão – o mestre que todos têm em casa – cada vez menos um veículo de formação e cada vez mais uma janela aberta para a futilidade e para a violência, que esperar de jovens desenraizados, sem horizontes e que têm na caixa mágica o único divertimento? Por ela, conseguem acompanhar, aliás, o deplorável comportamento e o soez palavreado de alguns professores, quando se manifestam. E com exemplos desses não há disciplina que resista.

Nota – A propósito da crónica sobre Adolfo Suárez, o leitor José Leite de Oliveira alerta-me para o facto de, segundo as suas fontes, também Santiago Carrillo, secretário-geral do Partido Comunista espanhol, ter enfrentado os golpistas, no Congresso de Deputados, em 1981. Não me custa acreditar, pelo que deixo o reparo e renovo a admiração por todos aqueles, de direita ou de esquerda, que em nome da sua consciência vencem o medo para dizer não.

Observador, Sábado, 17ABR14

Há afetos no “Kids” de “A tua cara não me é estranha”

14 Abril, 2014 0

Apontei aqui, há semanas, a componente perversa dos concursos com crianças, mais propriamente o caso de “A tua cara não me é estranha – Kids”. A desilusão que sofrem as que não saem vencedoras constitui uma violência para a qual nunca estarão preparadas – e isso é um fator negativo.

Mas manda a verdade que se reconheça, no mesmo programa da TVI, o esforço desenvolvido para criar um ambiente saudável e até de carinho. Para esse objetivo contribuem os jurados, que se desfazem em elogios, os apresentadores, sempre prontos para mimos, e os chamados mentores, que se “derretem” totalmente com os seus protegidos. É uma aura de exagero? É. Só que é, também, um fator positivo, mais relevante agora, quando as crianças são as principais vítimas da hecatombe social em que mergulhámos.

Se criticamos os desgraçados sinais dados aos mais novos, em serões de “divertimento” com forte carga deseducativa, devemos aplaudir o oposto: a valorização do trabalho, o elogio dos valores e a dádiva dos afetos. Nesse particular, esta versão “Kids” tem sido exemplar.

Antena paranoica, CM, 12ABR14

Cardozo não partirá…

13 Abril, 2014 0

Com a marcação de duas grandes penalidades caídas do céu, em 15 minutos apenas, Cardozo colocou fim numa seca de golos que durava há cinco meses. Uma tortura para um avançado que foi, já por duas ocasiões, o melhor marcador do nosso campeonato e até, há quatro anos, o concretizador maior da Liga Europa.

Aproxima-se agora aquela altura da época, de todas as últimas épocas, aliás, em que não faltarão, na comunicação social, certezas e boatos, manchetes e contra-manchetes com a eventual transferência do ponta-de-lança, cada vez mais não direi uma missão impossível mas algo de altamente improvável. Cardozo terminará a temporada com 31 anos e um passado recente – de lesões e de ausência de golos – que fará desconfiar qualquer investidor. E ainda que os encarnados se disponham a perder três ou quatro milhões dos quase 12 que deram pelo internacional sul-americano, não parece natural que apareçam interessados em pagar tanto dinheiro.

Talvez venha a suceder com Cardozo o que, para bem do Benfica e do futebol português, aconteceu com Luisão, que – vendo a sua mudança de emblema dada como certa “n” vezes – foi ficando, ficando e é hoje uma daquelas referências que uma grande equipa não deve dispensar. Porque num plantel que tem Lima, igualmente na casa dos 30, e Rodrigo, apontado para um negócio incontornável, a utilidade do paraguaio na manutenção do poder do ataque encarnado é indiscutível. E não sendo um jogador móvel, nem estando disponível para suportar o desgaste da marcação e da pressão sobre os adversários, o seu perfil calça como uma luva em determinadas partidas “complicadas” e que só se resolvem à “bomba”.

Só é pena, para o Benfica e para os seus adeptos, claro, que se mantenha a frieza na relação de Cardozo com o seu treinador, e vice-versa, e que a desavença do final da última época não tenha sido enterrada de vez. Mas até essa tensão pode ser eliminada muito em breve se o Benfica conseguir fechar o próximo mês de maio com a conquista dos quatro títulos que perdeu, sobre a meta, vai fazer um ano. Querem ver que ainda é Jorge Jesus que parte, atrás de proposta milionária, e Cardozo que permanece na Luz? Tinha muita piada, mesmo.

Canto direto, Record, 12ABR14

Crónicas da Sábado: o Rodrigues dos Santos

11 Abril, 2014 0

Confesso-me espetador fiel da charla dominical de Marcelo Rebelo de Sousa, na TVI, e do plus que constituiu o contraponto leal e sereno, e ao mesmo tempo vivo e profissional, de Judite Sousa. As audiências, aliás, confirmam que faço a escolha certa. Mas as boxes milagrosas permitem que, finda a lição do professor, se assista ao desempenho integral de José Sócrates, na RTP1, agora valorizado pelo sal e pimenta, muita pimenta, que José Rodrigues dos Santos trouxe à antena para substituir a simpatia de Cristina Esteves – com menor capacidade para contrariar o poder de comunicação e as técnicas de combate no uso do verbo do grande performer que é o ex-primeiro-ministro.

Sócrates perde para Marcelo, é sabido. Afinal, um governou no período em que o Mundo desabou e a Europa mandou gastar, enquanto o outro se transformou em instituição nacional a criticar a interminável azelhice alheia. Mas o antigo líder do PS perde também porque insiste em acertar contas com os que se opuseram à sua austeridadezinha para imporem a austeridadezona que nos afoga. A vida é o que é, os rios não correm para a nascente e o que importa é o que há-de vir. Descobrir janelas de esperança para o futuro é o que devíamos poder esperar de Sócrates e do conhecimento que tem dos problemas.

Acontece que o seu espaço televisivo se tornou mais irresistível desde que “o Rodrigues dos Santos”, como letalmente trata o interlocutor, resolveu – ou alguém por ele – brindar-nos com a sua fabulosa inteligência e argúcia inquiridora. E as hostilidades abertas entre os dois, a 23 de março, conheceram no último domingo um autêntico happening, com Sócrates a enfrentar um bombardeamento – com material dos “seus arquivos” como depreciativamente classifica, de dois em dois minutos, o arsenal jornalístico do pivô da RTP – e a ripostar com tiros de canhão como “o Rodrigues dos Santos ouviu mal, se tivesse ouvido com atenção…” ou “tem andado distraído” e “está equivocado”, ou ainda “mais uma vez os seus arquivos deviam ter dado nota disso”.

Sem conseguir esconder a irritação que lhe provoca o facto de ser contrariado, o chefe do anterior Governo aproveitaria a referência de José Rodrigues dos Santos ao seu papel de “advogado do diabo” – inoportuna justificação – para detonar a bomba atómica: “Até o advogado do diabo pode ser inteligente e pode perceber, não basta papaguearmos tudo o que nos dizem…”

A face do autor de sucesso fez-se pedra, até final da rubrica. A réplica, “fica registado o seu insulto, ao qual não vou responder”, teve classe, mas dececionou quem gosta de sangue. Se fosse a Rodrigues dos Santos, escrevia um novo best seller. Entre Vilar de Maçada e Chelas, nada de Constantinoplas.

Observador. Sábado, 10ABR14

Caldo entornado no Masterchef Portugal

7 Abril, 2014 0

Sempre que há uma estreia, como aconteceu agora com “The Voice Portugal”, o foco aponta-se ao júri e à sua capacidade para dar dimensão ao programa. E tal como a TVI, com “Masterchef”, também a RTP acertou na escolha, um misto de irreverência e conhecimento, popularidade e talento. Mas não são só os jurados que fazem o êxito de um concurso, há que selecionar com o mesmo cuidado os outros protagonistas.

No caso de “Masterchef Portugal”, o casting não reservou o “direito de admissão” e a cozinha parece por vezes inundada pelo caldo de labreguice da “Casa dos Segredos”. Desde o cromo da “cremalheira” imprópria para grandes planos a meninos que largam palavrões, escorrem suor ou se sentam no chão, o que não faltam são exemplos de crivo largo e ausência de pedagogia.

Até a realização se deixa ir, permitindo o que no “Masterchef Australia” se proíbe sob pena de prisão: talheres à vista depois de utilizados para provar a comida e bancadas caóticas, mais sujas do que o necessário ao longo de toda a elaboração dos pratos. Se a ASAE lá entra…

Antena paranoica, Correio da Manhã, 5ABR14

Ricardo Quaresma, o jogador maldito

6 Abril, 2014 0

Não tenho especial simpatia por Ricardo Quaresma. Desde o dia de 2003 em que o então jogador do Sporting deixou o jornalista Bernardo Ribeiro “pendurado” junto à Porta 10-A do velho estádio de Alvalade, após ter combinado um trabalho para este jornal, que sei o que se pode esperar do homem. Mas como nunca me condiciono por sentimentos de caráter pessoal que a nada conduzem e nada acrescentam, também neste caso, aos leitores de Record, analiso com frieza a polémica em que se vê metido um futebolista maldito, perseguido por algo mais do que o seu desempenho em campo. E quando se mete o preconceito, é sabido que estou contra.

Começo por dar a mão à palmatória depois do texto que publiquei aqui, a 5 de janeiro, e no qual levantava dúvidas sobre a capacidade de Quaresma para “recuperar a velocidade, “trivelar” pouco e servir a equipa com humildade”. A verdade é que continua veloz, na execução e no raciocínio, “trivela” muito mas com êxito – como se viu na quinta-feira – e tem feito por se mostrar humilde, prestando à equipa, ele que não é um jogador de marcação, solidariedade e o esforço possível.

Dito isso, não embarco na tese da “desgraça” de Quaresma junto do selecionador por causa das “cenas” na Madeira. Paulo Bento preocupa-se mais com a floresta do que com a árvore e, mesmo exibindo o extremo portista qualidade para integrar o lote dos 23 do Mundial, para o chamar há que dispensar alguém, arriscando-se com isso a coesão do grupo. A sua convocatória está, assim, mais dependente do xadrez das lesões e do eventual “excesso” de gente para as alas do que de outros fatores, sendo certo que o “filme” da Choupana assustou um bocado os defensores do Planeta, que se dividem entre o chilrear dos passarinhos, o murmurejar das fontes e a beleza das flores.

Pelo mediatismo dado às suas atitudes no final do Nacional-FC Porto, esperava pior castigo para Quaresma do que a repreensão. Mas faltou coragem e sobrou arte. E sabem porquê? Porque quem relatou os factos não pode ter deixado de ver as provocações, de ouvir os insultos que levaram o jogador a cair na armadilha e a indignar-se. Sobre isso, zero, nem uma palavra, apenas um novo assobio para o ar. Compreende-se, num país onde se segregam os velhos, os diferentes e os mais fracos, também não se deve permitir o sucesso de um cigano.

Canto direto, Record, 5ABR14

Crónicas da Sábado: roubados em definitivo

4 Abril, 2014 0

Aquilo que o professor Adriano Moreira classificou como neoliberalismo repressivo exibe no ataque às reformas a sua expressão mais selvagem. Não pertenço ao clube dos poetas vivos que vê como sagradas as verbas a que têm direito os pensionistas do Estado ou da Segurança Social, ainda que elas façam parte de um contrato que se prolongou por décadas e que foi rasgado unilateralmente pelo mais forte quando lhe conveio, primeiro com a revisão do modo de cálculo, em 2007, a seguir com a brutal onda de cortes dos últimos três anos. Não nos enganemos: Portugal perdeu uma guerra financeira e ficou em ruínas. Recuperar o País – com esta política dos candidatos aos chorudos empregos da alta finança internacional ou com a dos vendedores de ilusões que se escondem atrás dos chavões da reanimação da economia ou da renegociação da dívida – é o caminho a seguir. A célebre frase de Vítor Gaspar, de que “não há dinheiro”, perdurará por gerações, a realidade é o que é.

O que me choca, sim, é a falta de vergonha, evidente na forma como se joga com a opinião pública e com a inveja social, tentando que os não reformados, que apesar de tudo são a maioria, se convençam que mais vale continuar a tirar rendimento à velharia indefesa, uns parasitas que já nada produzem, do que agravar os pesados impostos dos honrados portugueses que trabalham. É com esse intuito salvador, de uma política e de uma face, que se avança agora com os roubos definitivos das pensões.

Mandaria a lógica e uma noção mínima de equidade que se encontrasse uma fórmula que permitisse manter o corte nas reformas enquanto o equilíbrio das contas o impusesse, mas que concedesse a futuros governos a possibilidade de ir repondo os valores antes contratados – nem que fosse ao fim dos 20 anos que Cavaco Silva referiu – aos que vivessem, claro. Não é isso que se entende das frases soltas que a clique governante vai deixando cair, o que se percebe é a intenção de tornar o saque perene e a esperança morta.

Se o que escrevo parece uma evidência, por que é outra, a do absurdo, a escolha de quem manda? Porque a insensatez se instalou na nossa sociedade. Vi há dias uma reportagem num telejornal, com um senhor que escreveu um livro no qual afirma demonstrar que o Serviço Nacional de Saúde não é viável. Cá está, como os malucos, cada um diz o que quer. Mesmo que seja que o senso é errado e o insano certo – com garantia de que a comunicação social logo ampliará a estupidez. Por este andar, em breve veremos quem defenda que os bombeiros só dão prejuízo e que, antes de apagarem os fogos, devem ser obrigados a vender bilhetes. Estamos doentes, caramba.

Observador, Sábado, 3ABR14