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A controvérsia vem de 1960, quando o central brasileiro Lúcio e o médio sul-africano David Julius (depois Júlio), do Sporting, se naturalizaram e foram chamados à seleção de Portugal. Prossegue hoj..." /> — ler mais..

A controvérsia vem de 1960, quando o central brasileiro Lúcio e o médio sul-africano David Julius (depois Júlio), do Sporting, se naturalizaram e foram chamados à seleção de Portugal. Prossegue hoj..." /> Quinta do Careca - Record

Quinta do Careca

Fernando: sim ou não à Seleção?

30 Novembro, 2013 0

A controvérsia vem de 1960, quando o central brasileiro Lúcio e o médio sul-africano David Julius (depois Júlio), do Sporting, se naturalizaram e foram chamados à seleção de Portugal. Prossegue hoje a estéril polémica, com a eventualidade do recurso a Fernando, trinco do FC Porto. Também brasileiro – como Celso, Deco, Pepe e Liedson, os senhores que se seguiram – o portista irá beneficiar do estatuto de dupla-nacionalidade e com isso poderá ser uma opção para o Mundial.

De um lado da trincheira, os conhecidos “patriotas”, que exigem o produto nacional “à outrance”, ou seja, desprezando as consequências. Na barricada oposta, os habituais “vende pátrias”, sempre dispostos a aceitar tudo. Não precisamos de tomar partido pelo fundamentalismo de uns ou de outros.

A Seleção não é menos portuguesa se entre 23 escolhidos houver um ou dois jogadores oriundos de país estrangeiro. Dispomos, na história do nosso futebol, e para além dos naturalizados que referi, de tantos internacionais nascidos fora do território que seria uma estupidez defender agora a tese que contrariaria o que é uma verdadeira cultura. E se Lúcio, Celso ou mesmo Liedson não foram determinantes para o sucesso da equipa nacional, já sem Deco e sem Pepe não teríamos os êxitos que alcançámos. A Seleção vive até na saudade daquele “10” magnífico que fazia as transições para a frente, driblando os adversários, e não para os lados, evitando-os. Quanto a Pepe, não sei o que nos aconteceria se o dispensássemos para dar o seu lugar, demagogicamente, aos “jovens” e aos “portugueses”.

Nada de exageros. Convocar naturalizados é um ato que obriga a usar pinças. Se o jogador em causa tiver talento, se tiver carácter, se ocupar uma posição em que possamos estar mais fragilizados não deve ser chamado em nome de quê? Vamos aos mundiais e aos europeus para competir ou só para participar? Se os resultados não contassem, aí sim, qualquer um serviria. O caso de Fernando é, assim, simples: se quiser e estiver disponível, basta que Paulo Bento o convoque, ou não o convoque, como entender que melhor serve os interesses da Seleção.

Canto direto, publicado nas edições de Record de 30 novembro 2013

Crónicas da Sábado: A propósito da 500.ª edição

29 Novembro, 2013 0

500. Edições da SÁBADO. Fui responsável, com muitos companheiros de redação, por quase 3 800 edições de Record e por outros milhares ao longo da carreira, pelo que sei bem que enviar para impressão as cinco centenas que ora se completam, para mais com a qualidade a que esta revista habituou os seus leitores, significou que dezenas de jornalistas, técnicos de apoio e profissionais de diferentes áreas da Cofina trabalharam muito, com rigor e total empenhamento. O próximo objetivo, já em maio, é comemorar o 10.º aniversário com a mesma competência e o mesmo entusiasmo.

3. São os diretores que a SÁBADO já regista na sua curta história. Esta é a primeira edição da responsabilidade de Rui Hortelão, que sucedeu a Miguel Pinheiro, que por sua vez substituiu João Gobern. Não nasceu por acaso o sucesso da SÁBADO, pois qualquer desses jornalistas é do melhor que temos em Portugal. A seguir, perfil, opções, tempo e circunstâncias determinam o resto.

0. É a nota que espera educadores de infância e professores dos ensinos primário e secundário se, na prova de avaliação, derem 10 ou mais erros ortográficos. Confesso que ainda hoje não lhes escapo, mais desde que passei a aplicar o novo acordo e quase sempre porque, tendo dúvidas, me deixo ficar. Mas admitir, e por isso o Ministério da Educação criou a norma, que há educadores (?) capazes de entrar para o Guinness por darem erros a esse nível, diz tudo sobre a situação a que chegou o nosso ensino. O ensino e o resto.

125 000. São os euros penhorados por dia a pensionistas, por ordem dos tribunais, segundo o Negócios. Sobrecarregados pela tripla aliança mortal – não atualização das pensões, aumento do IRS e cortes sucessivos – os reformados entram em insolvência depois de terem assumido, por eles e por filhos ou netos, normalmente desempregados, compromissos que já não conseguem honrar, ou apenas porque os valores que recebem deixaram de chegar para supermercado, água, luz e farmácia. Seja pelo que for, é uma tragédia.

50,7. Milhões de euros foram os lucros dos CTT em 2012, prevendo-se que este ano exista alguma quebra, mas que o resultado final fique acima dos 40 milhões. Quer isso dizer que a privatização de 70% de uma empresa vital para o país fará com que, para faturar agora cerca de uma dezena de anos de exploração, o Estado perca uma importante fonte de rendimento. Que raio de lógica é esta? Por outro lado, a aparente não existência de um parceiro estratégico, que perceba do negócio, deixa nas mãos dos 30% de capitais públicos a gestão do privatizado. Portugal não tem ponta por onde se pegue.

25. De novembro. Passaram 38 anos sobre a data em que António Ramalho Eanes coordenou no terreno os militares que apoiaram o Grupo dos 9 e que garantiram o respeito pelos princípios democráticos do 25 de abril. Distinguido esta semana, o homem que recusou marechalato e salários retroativos permanece como exemplo do melhor que resiste ainda na terra dos bandidos: o mérito e a probidade. Mais Eanes houvesse e não estaríamos assim.

Observador, publicado parcialmente na edição 500 da Sábado em 28NOV13 

O mágico que fez as coisas acontecerem

27 Novembro, 2013 0

Na minha viagem pelo Record, procurei ser fiel à memória dos meus antecessores, que fizeram do jornal o que ele é: uma referência da informação desportiva. Gostaria, assim, de recordar nesta edição histórica quatro dos cinco jornalistas que permaneceram por mais de dez anos na liderança de Record e cuja marca aqui persistirá: Fernando Ferreira, José Monteiro Poças, Artur Agostinho e Rui Cartaxana.

Começo pelo primeiro diretor, que convidei para o almoço do 56.º aniversário. Era uma figura austera, pouco dada a convívios e que olhava para nós com a superioridade dos sábios quando encaram os ignorantes. Publicou depois aqui alguns textos, bem escritos, doutrinários mas demasiado longos, “defeito” que fez com que os seguintes ficassem por conhecer, perante a irritação do autor. Não pude, por isso, esclarecer com Fernando Ferreira a velha questão do nome Record, que ele contava ter sido inspirado numa sapataria de Londres, sendo certo que anos antes da fundação já outro jornal, com idêntico título, fora lançado em Portugal, embora sem êxito.

Artur Agostinho foi o diretor que deu ao Record, na década de 60, a visibilidade e a credibilidade definitivas. Tendo “A Bola” um grupo de jornalistas fortíssimo, tornou-se imperioso encontrar um nome que fosse em simultâneo indiscutível, do ponto de vista do conhecimento e da competência, e que tivesse a capacidade de “cimentar” um corpo redatorial formado por profissionais de diferentes artes – como era o caso do próprio Artur Agostinho – e que viam no jornalismo uma forma de aumentar o rendimento mensal. Tive a felicidade, em 2005, de trazer a lenda “de volta a casa” e de com ela poder desfrutar de alguns anos admiráveis.

De Rui Cartaxana está tudo dito, não só por termos trabalhado juntos – por vezes com atritos, é verdade – mas também por ele se ter mantido ativo até ao fim, fiel às qualidades que melhor o distinguiam: uma determinação de betão e uma coragem de ferro. O Rui foi o homem da transformação do jornal em diário, do avanço decisivo da cor, da chegada do Record ao patamar de vendas de 100 mil exemplares.

Termino com mágoa: a de não ter conhecido José Monteiro Poças, um dos fundadores do jornal e o maior responsável pela sua sobrevivência. Eu não teria passado por aqui e o leitor não leria hoje estas linhas se um gestor à prova de bala não tivesse agarrado o leme nos duros tempos de desalento e penúria. Sabendo alguma coisa de gestão, aqui me curvo perante a memória de três gigantes e de um herói, Monteiro Poças, o mágico que fez as coisas acontecerem.

Publicado na edição do 64.º aniversário de Record, em 26 novembro 2013

O superintendente merecia um louvor

24 Novembro, 2013 0

Tivessem os participantes da “manif” dos polícias entrado mesmo na Assembleia da República que a estas horas não seria só o diretor nacional da PSP a demitir-se mas o próprio Governo, que depois de ter escapado à humilhação vem agora armar-se em virgem ofendida. Não por acaso, existe quem compare o incomparável: a atuação das forças de choque nesta quinta-feira com outra, de há poucos meses, em que baderneiros aproveitaram o final do protesto da CGTP para apedrejar os agentes, levando a cenas de violência inevitáveis.

A transmissão televisiva foi clara: dada a composição e dimensão desta manifestação chegou a parecer iminente a desordem total e a possível queda do Executivo. E sendo assim, respirou-se de alívio quando tudo terminou no cimo da escadaria. Deve-se, por isso, uma saudação ao bom senso dos organizadores, ao autocontrolo dos manifestantes e à gestão adequada, no fio da navalha, de quem conseguiu manter a ordem pública e a inviolabilidade da casa da democracia. O superintendente Paulo Valente Gomes merecia um louvor, não a demissão.

Antena paranoica, publicado nas edições do “Correio da Manhã” de 23 novembro 2013

Cristiano Ronaldo é global mas a vida é injusta

23 Novembro, 2013 0

Cristiano Ronaldo vive aquele que pode ser o momento mais alto da sua carreira, pese o facto de nos últimos tempos se ter repetido essa ideia a propósito das suas proezas futebolísticas. A verdade é que CR7 continua a pulverizar recordes e após o jogo contra a Suécia mais dois, pelo menos, tinham caído: alcançou Pauleta no top dos marcadores de sempre da Seleção, com 47 golos, e soma já, a cinco semanas do final de 2013, 66 remates vitoriosos em jogos oficiais, o que constitui o seu melhor ano de sempre. Também igualou Eusébio com este segundo “hat trick”, pelo que a pergunta é inevitável: irá ainda mais longe em 2014? Conhecendo “la bestia”, ninguém ousa arriscar a resposta.

Certos intelectuais de pacotilha, daqueles que falam de cátedra das mais complexas e importantes coisas, e de cenho franzido analisam os males que atormentam o Mundo, odeiam Cristiano e o que ele representa: a subida do zero através de uma bola – que veem como a vitória da matéria sobre o espírito – e como se enganam! – e o poder do futebol, que consideram desmesurado por não constituir uma arte antes de ser negócio – e assim se enganam de novo.

O que por vezes incomoda no fenómeno Cristiano é o aproveitamento que alguns fazem da popularidade do jogador, de que são exemplo os comentadores de política e literatura que gostam de alargar a sua erudição ao futebol sem nada acrescentarem, ou os ministros que misturam supostas “indignações” por uma simples bebedeira do sr. Blatter com o anúncio de mais cortes de salários e pensões, como se um qualquer “desrespeito” por Portugal se pudesse comparar à desgraça que se abateu sobre os portugueses.

Cristiano Ronaldo deve ser tratado com conta, peso e medida, sendo seguro que essas variáveis ascenderam a quotas altíssimas. Eu adorava que Mariza, Joana Vasconcelos ou António Damásio, com a devida vénia, fossem conhecidos na China ou na Austrália, nos casinos de Las Vegas ou na mais recôndita aldeia da Indonésia. Acontece que não são, a vida é injusta. Mas é o que se passa com Cristiano, pelo profissional que é e pelo artista global em que se tornou. O resto é conversa.

Canto direto, publicado nas edições de Record de 23 novembro 2013

A princesa da Malveira

22 Novembro, 2013 0

Se a qualidade fosse sinónimo de quantidade, Mariza venderia mais discos do que Toni Carreira, ele que me desculpe a comparação, pois é bom, muito bom, naquilo que faz. Nos gloriosos tempos do Diário de Lisboa, em finais dos anos 60 e início da década de 70, aprendi a ver televisão com Mário Castrim, passei a desfrutar de melhor cinema através das opiniões de Lauro António, compreendi que havia bom e mau teatro lendo as críticas de Carlos Porto, descobri o melhor da música com os textos densos mas esclarecedores do meu amigo Nuno Barreiros. Curiosamente, essa foi a época em que os dois concorrentes do DL no mercado vespertino – é verdade, pelas 4 horas da tarde tínhamos três jornais na rua… – o Diário Popular e A Capital, que apostavam já num conteúdo mais ligeiro e próximo dos problemas dos leitores, ultrapassaram em tiragens e vendas, ainda que sem destino mais feliz no final, como sabemos, o título dirigido por António Ruella Ramos.

A história repete-se nos nossos dias, tanto nos projetos como nos protagonistas. Veja-se, a título de exemplo, os casos de três profissionais de méritos firmados, como Bárbara Guimarães, que chegou a fazer programas com António Vitorino de Almeida antes de ter de se render ao popular, de Alexandra Lencastre, que está hoje nos bastidores da Casa dos Segredos, ou de Rita Ferro Rodrigues, que passou da informação séria para o convite aos telespetadores para que liguem o telefone tal e tentem ganhar milhares de euros.

O tempo proporcionou-me a lição seguinte às que recebi com a leitura do Diário de Lisboa e mais tarde com a minha integração na sua redação: profissional bom é o que faz bem aquilo que deve ser feito – e que aceitou fazer. Há, seguramente, na revista Maria alguns jornalistas melhores do que outros que assentam praça no Público, como haverá piores também, é assim a vida.

Há semanas, uma concorrente da Casa dos Segredos classificou Cristina Ferreira como pindérica, o que levou a imprensa da especialidade a anunciar que a apresentadora iria processar a moça, de si, aliás, inimputável. Como se estivéssemos perante uma ofensa ou o comentário fosse pior do que muitos chamam à princesa da Malveira. E depois? E se ela for pindérica para metade do país e a outra metade, porque gosta do estilo e da personalidade de Cristina, se colar à TVI e com isso rebentar com as audiências da concorrência?

Perguntarão leitores dados ao preconceito: mas a pequena não tem um riso brega, não diz frases ocas, não gosta de brejeirices, não é apresentadora de programas de futilidades? Digam o que quiserem. A verdade é que faz bem o seu trabalho e isso dói a quem não sabe ou não é capaz. Chapeau, Cristina! 

Observador, crónica publicada na edição impressa da Sábado de 21 novembro 2013. Tema de Sociedade da semana: entrevista de vida a Cristina Ferreira

Nada como picar “la bestia”!

19 Novembro, 2013 0

Este é o talento dos grandes jogadores da história do futebol: fazerem aquilo de que outros não são capazes. A exibição de hoje do CR7 só é comparável, a nível da Seleção Nacional, com a que Eusébio rubricou frente à Coreia, no Mundial de 1966.

Nos dois decisivos confrontos com a Suécia – decisivos para Portugal, para a Seleção, para a Nike e para ele, entre outros – Cristiano Ronaldo marcou quatro golos, três deles no campo do adversário e os dois últimos depois do “bis” de Ibra ter parecido ser o princípio do cheque-mate à nossa equipa.

Faltou o quarto golo, que esteve iminente, para a coroação de Cristiano ser ainda mais brutal e deixar totalmente de rastos aqueles que se desesperam com o poder deste apaixonante jogo global. Como disse alguém, o futebol é a mais importante das coisas menos importantes da vida.

Hoje, puxou o País para cima, muito graças a um rapaz da Madeira que leva 55 jogos oficiais disputados em 2013, tendo marcado 66 golos, uma média de 1,2 golos por desafio. Curiosamente, essa média sobe para 2,2 se considerarmos que apontou 13 golos nas derradeiras seis partidas, ou seja, desde que Blatter fez a rábula vinícola do “comandante”…

Nada como picar “la bestia”!

Tempo de insultos

17 Novembro, 2013 0

Quatro guardas da GNR meteram-se numa alhada: terão dirigido, no calor de protesto frente ao MAI, uns nomes feios ao ministro. Como se nunca tal se tivesse ouvido no quotidiano dos telejornais.

O problema reside menos no que os militares disseram e mais no tempo de antena que os canais sempre dão aos desmandos, fiéis ao princípio de que quanto maior o desvario maior a curiosidade e maior a audiência. Divulgados os insultos, a espada da lei cai sobre o pormenor e ignora o verdadeiramente insultuoso: o desrespeito pelas pessoas e pela sua dignidade. São os dias de tensão social que atravessamos.

Desde a hora em que gente em fúria chamou “fascista” a Jorge Sampaio – talvez o cúmulo da linguagem desbragada sem palavrões – que já nada nos admira. Termos como “gatunos” ou “assassinos”, recorrentemente com endereços errados, tornaram-se prática habitual. Basta ver, aliás, uma “manif” de professores, para se verificar o nível a que descem a agressividade e o desespero. Agora, claro, apareceram os guardas, a carne ideal para canhão. Pobre país.

Antena paranoica, publicado nas edições do CM de 16 novembro 2013

Noite de Seleção sem angústia para o jantar

16 Novembro, 2013 0

Começo por pedir desculpa aos leitores por ter renunciado à escolha do jogo de ontem da Seleção para tema desta crónica. Escrevo quase sempre focado na atualidade e não me debruçar aqui sobre um confronto importante para o nosso apuramento para o Mundial é algo que não me agrada.

Acontece que redijo estas linhas a meio da tarde, antes do desafio da Luz, porque vou ver o Portugal-Suécia em casa de um amigo e teria de abdicar do jantar que se seguirá – e da conversa! – para me isolar, agarrar ao computador e analisar as incidências da partida, repetindo dessa forma o que muitos, nesta edição de Record, fazem melhor do que eu.

Perguntarão: mas então os leitores não mereciam esse esforço? Claro que a resposta é sim, na verdade os leitores deram-me tudo. Mas não é menos verdade que, não tendo já responsabilidades editoriais, os leitores também me proporcionaram outra coisa: a possibilidade de dispor do meu tempo. Afinal, deixei de me sentir obrigado a viver em cima da hora e do que está a dar, podendo finalmente dedicar-me ao prazer – lúdico e insubstituível – de escrever ao correr dessa pena que se chama hoje teclado.

Como se sabe, venho de longe, das épocas dos grandes clássicos das Amoreiras, do Lumiar ou das Salésias, de seis décadas a ver futebol, pelo que ter assistido ontem a um embate quase decisivo – espero que o tenha sido e para as nossas cores – com tranquilidade, desfrutando do talento dos artistas, dos erros do árbitro, dos caprichos da própria bola e das emoções à solta numa sala confortável transformada em bancada VIP, é um privilégio que julgo merecer.

Mesmo profissionalmente falando, foram 50 anos de obrigações, de chamadas permanentes – e por vezes cruéis – do sentido do dever a sobrepor-se ao usufruir da própria vida. Ter a oportunidade de não precisar de me preocupar com planos, com manchetes, com casos do jogo ou seja com o que for e impor-me o trabalho de elaborar meia dúzia de considerações seria um absurdo.

Vou, por isso, jantar descansado e sem angústia, com a bênção do leitor. Quer dizer, rezemos para que o Cristiano esteja em dia sim, Alberto.

Canto direto, publicado nas edições de Record de 16 novembro 2013

Quatro reclamações para (não) fazer à DECO

15 Novembro, 2013 0

Duvido que a DECO me aceitasse as reclamações mas é pena então que não exista outra organização capaz de lhes dar o merecido andamento. Podia apresentar umas boas dezenas delas e só as limitações de espaço reduzem o leque às quatro que escolho para esta crónica. Ora vamos lá.

1. Na primeira linha da minha irritação encontro a continuação da revoltante política que o Estado Novo cultivou, ainda que não ao nível da indigência a que chegámos, e que em 40 anos de democracia não parou de florir: a nomeação de boys para a administração pública. Nem a crise profunda, já que de pudor nem é bom falar, leva o poder a abdicar dos seus serventuários e de servir a clientela. Esta semana, tivemos a notícia de que o secretário de Estado da Cultura contratou para assessor, por 3 mil e tal euros por mês, um consultor de comunicação do PSD. O felizardo, que tem 24 anos e frequentou três workshops – notável currículo – junta-se assim aos três adjuntos e sete técnicos especialistas da secretaria. Calcula-se o nível dessa especialidade.

2. A segunda reclamação vai para a irracional pressão que cavalheiros de posição exercem sobre os árbitros de futebol. Dirigidos por uma clique, os apitadores são escolhidos por critérios duvidosos e preparados de forma ineficaz, exibindo depois alguns deles, no terreno, as incapacidades naturais, a falta de jeito e a incompetência que conduzem os adeptos da bola ao desespero. Ignorando o sofrimento por que os pobres passaram até alcançar o escalão principal, os contestatários – em boa parte para esconderem mediocridades próprias – desancam-nos. Mas poupam, curiosamente, o sistema que gere o monstro.

3. Volto a recordar o guarda Hernano, condenado a nove anos por disparar a arma de serviço na perseguição a um criminoso e ter morto, por fatalidade, uma criança. É que o Supremo Tribunal acaba de reduzir, de nove para seis anos e meio, a sentença de um anormal pelo abuso sexual de uma sobrinha de 11… ao longo de dois anos! Não me conformo com esta justiça.

4. Gostaria, finalmente, mais em modo de petição que de protesto, que Passos Coelho resistisse aos pedidos da sua gente para que cale a boca aos ministros e os impeça de falarem a destempo, dizerem o que não interessava nada que dissessem – e que pode ser mesmo o contrário do que outros já afirmaram, primeiro-ministro incluído. Precisamos de saber as verdades. A derradeira marca de excelência veio de Rui Machete, que revelou há dias, metendo-se por seara alheia, que se os juros das obrigações da dívida pública a 10 anos, que estão nos 6%, não caírem para 4,5% ou menos, Portugal terá o tal segundo resgate que nos garantiram que nunca iria acontecer. Como de imediato se ergueu um coro de críticas, Machete voltou a terreiro com explicações e a meter as mãos pelos pés. Passos não consegue largar a escada Magirus. E sejamos justos: como bombeiro, tem feito um trabalho jeitoso. 

Observador, crónica publicada na edição impressa da Sábado de 14 novembro 2013. Tema de Sociedade da semana: queixas à DECO