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O “Caso Spotlight” venceu a categoria mais importante da edição deste ano dos Óscares. Confesso que, não sendo grande cinéfilo, fiquei surpreendido com a decisão dos especialistas. Essencialmente ..." /> — ler mais..

O “Caso Spotlight” venceu a categoria mais importante da edição deste ano dos Óscares. Confesso que, não sendo grande cinéfilo, fiquei surpreendido com a decisão dos especialistas. Essencialmente ..." /> Olhos de ver - Record

Olhos de ver

Um óscar para o jornalismo

29 Fevereiro, 2016 0

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O “Caso Spotlight” venceu a categoria mais importante da edição deste ano dos Óscares. Confesso que, não sendo grande cinéfilo, fiquei surpreendido com a decisão dos especialistas. Essencialmente porque o filme não tem imagens espectaculares, grandes cenários ou interpretações particularmente exigentes. Admitindo a minha escassa (para não dizer nenhuma) competência em torno do assunto, creio que tecnicamente é um filme relativamente fácil de fazer. A única coisa que imagino ter sido complicada foi condensar em cerca de duas horas a muita informação relevante que o argumento possuía. Dito isto, e provavelmente indo contra a ideia que já possa estar a formar, adorei o filme.
Não sou religioso, mas não tenho rigorosamente nada contra quem o é. E isso é válido para os católicos, como para os muçulmanos, hindus e todos os outros credos. Saber que os meus familiares, amigos ou vizinhos acreditam nisto, naquilo ou em nada é algo que não mexe comigo. É um assunto que só lhes diz respeito. Contudo, sempre me fez imensa confusão ver gente que, publicamente, defende a paz, a solidariedade, o respeito, a ajuda aos mais fracos e desprotegidos, mas que, em privado, esquece toda a conversa que apregoa e actua com verdadeiros requintes de malvadez. Mais valia, pura e simplesmente, estarem calados. Pelo menos não eram hipócritas.

O tema que está na origem do “Caso Spotlight” é, pelo que atrás referi, algo que me interessa muito. E que tem o condão de me deixar tão perplexo, como revoltado. O abuso sexual de crianças é algo que nem quero adjectivar, tal como provavelmente a grande maioria dos pais prefere fazer para não correr o risco de desatar a gritar (ou a escrever) expressões ordinárias. Aproveitar a debilidade alheia, elegendo preferencialmente para os seus devaneios crianças oriundas de famílias disfuncionais e de meios sociais carenciados… só torna tudo pior. A prática é abjecta, o “modus operandi” realça o nível de quem tem estes hábitos. Perceber que tantos membros da Igreja Católica, em Boston e em tantos outros locais pelo Mundo fora, foram capazes de fazer tamanhas atrocidades é algo que, imagino, deve fazer corar de vergonha todos os católicos. E saliento isto tendo perfeita noção que a esmagadora maioria condena de forma veemente estes comportamentos.

Já conhecia há muito o “Caso Spotlight” e, claro, aproveitei este filme para refoçar a minha convicção de que o mundo está repleto de gente que não interessa, como diz o povo, nem ao Menino Jesus. Mesmo que alguns teimem em dizer-nos que são seus seguidores…

Mas, se a exposição maciça deste tema é algo que me agrada, pois nunca se fará o suficiente para desmascarar e denunciar quem alinha nesta pouca vergonha – molestando as crianças ou abafando a situação -, o que me fez adorar o filme foi ver, de novo, muita gente a olhar com respeito para os jornalistas. E eu, que pertenço à classe literalmente desde o século passado, já tinha saudades disso.

Não sou corporativista ao ponto de pensar que todos os jornalistas, nos Estados Unidos ou em Portugal, são bons. Dizer isso seria uma mentira. Há maus, péssimos e satisfatórios, mas também bons, muito bons e excelentes. Mas, pelo menos por cá, desde o aparecimento da internet e das redes sociais, a maioria das pessoas vê nos jornalistas um grupo de pessoas pouco qualificada, sem regras nem escrúpulos, com um trabalho menor. Não é bem assim.

O jornalismo continua – e continuará sempre – a ser uma missão nobre, capaz de desempenhar na sociedade um papel fulcral, que começa na simples função de informar, mas que também deve denunciar, provocar debate, transmitir conhecimento, convidar à reflexão ou defender causas entre tantas outras coisas. Hoje, é verdade, qualquer pessoa pode ter um site ou blogue ou escrever o que lhe apetecer no twitter ou no facebook. Contudo, não é por isso que passam a poder equiparar-se aos jornalistas. E não estou com isto a dizer que não há por aí que faça um trabalho tão válido quanto os profissionais ou que não há jornalistas que se demitem das funções e validam todas as informações que apanham por aí. O que pretendo dizer é que sendo verdade que todos podem ser jornalistas, não é jornalista quem quer…