Olhos de ver

Jesus não tem emenda

14 Março, 2014 0

Depois de uma vitória tão sensacional como justa em Londres, diante de um Tottenham que mais parecia uma formação de segunda linha do futebol inglês, o Benfica está a ver muita da atenção devida ao seu feito ser relativizada porque Jorge Jesus, mais uma vez, mostrou que tem tanto de bom treinador como pouca classe para liderar um emblema da dimensão do clube da Luz.

Apesar das inúmeras demonstrações de humildade nas conferências de imprensa de antevisão dos encontros esta época – enaltecendo sempre o valor dos opositores, destacando as dificuldades que a sua equipa terá de enfrentar e nunca embandeirando em arco com, por exemplo, o largo avanço pontual que possui no Campeonato -, Jesus não se consegue conter quando está no banco. E de vez a vez lá sai um disparate que, mais do que a própria atitude, acaba por o marcar. Negativamente. Em Portugal e lá fora. As palavras de Tim Sherwood apenas o confirmam.

O gesto do treinador do Benfica em White Wart Lane, após o terceiro golo encarnado, não tem qualificação. Nem tão pouco justificação, apesar de Jesus, de forma desajeitada, a ter procurado quando, no final do encontro, foi questionado pela imprensa.

Ao repetir este tipo de provocação – já tínhamos visto algo do género num Benfica-Nacional, então com Manuel Machado a ser a vítima -, Jesus confirmou que o primeiro deslize não resultou de um mero momento de falta de discernimento. E é grave que assim seja, pois como muitos defendem, mais do que saber perder, é preciso saber ganhar.  

Jesus, depois de uma longa carreira em que as grandes conquistas não iam além de classificações honrosas, continua a ter dificuldades para se saber posicionar à frente de um clube talhado para lutar em todas as frentes. Bem pior do que isso: revela uma falta de respeito tremenda por adversários que, por falta de oportunidade ou por estarem ainda a começar a função, não possuem um currículo por aí além.

Jesus podia e devia ser mais comedido. Podia e devia, de tempos em tempos, lembrar-se do seu passado relativamente recente em equipas de menor dimensão; podia e devia recordar-se que as eliminatórias não se ganham ao primeiro jogo e também podia e devia ter em atenção que ganhar dezenas de jogos a meio de uma época não garante, necessariamente, a conquista de troféus no final da mesma. Se calhar até devia rever as imagens que protagonizou no Dragão, na última jornada da Liga passada…

Jesus, com toda a justiça, gosta de falar da qualidade futebolística que recuperou no Benfica; não se esquece de enumerar os vários casos de jogadores que ajudou a valorizar no clube e destaca que o primeiro passo para se poder ganhar é chegar ao final das competições com reais possibilidades de vencer. Tem razão em tudo. Contudo, nunca se deu ao trabalho de contabilizar o número de troféus que arrebatou e perdeu ao comando das águias, nem sequer de ver a sua percentagem de sucesso em comparação com outros treinadores que passaram pela Luz. Se algum dia o fizer, talvez perceba que não é assim tão iluminado quanto pensa.

PS – Os clubes, que costumam ser tão céleres a multar jogadores quando estes “pisam o risco”, deviam fazer o mesmo quando são os técnicos a disparatar. Não quero acreditar que a maioria dos dirigentes do Benfica tenha gostado de ver mais este deslize de Jesus. E menos ainda que fiquem indiferentes à forma absurda como o técnico tratou Raul José, Shéu e Rui Costa logo após o momento da discórdia. E Rui Costa é “só” administrador da SAD.

PS1 – É uma pena que Jesus, indirectamente, tenha retirado protagonismo ao desempenho dos seus jogadores em Londres. Luisão, principalmente, mas também Fejsa ou Ruben Amorim (entre outros) mereciam ser os únicos focos de atenção após o termo do encontro. E até o próprio treinador devia, hoje, estar a ser falado pelo banho táctico que deu perante um dos mais fortes candidatos à conquista da Liga Europa e não pelas razões atrás citadas.