Medindo a desorçamentação

30/06/2011
Colocado por: Pedro Romano

Um dos grandes problemas na análise das contas públicas é a chamada desorçamentação. A desorçamentação consiste em grande medida na criação de entidades que, apesar de serem dirigidas pelo Estado e normalmente com propósitos de serviço público, estão fora do perímetro de controlo do Orçamento do Estado. São, por exemplo, empresas públicas, fundações e outras entidades. As Parcerias-Público-Privadas podem também ser consideradas uma forma de desorçamentação, embora o mecanismo seja ligeiramente diferente.

 

Outro problema são os atrasos de pagamentos – mesmo que esta prática seja habitual no resto da economia, ela viola um princípio fundamental da Lei do Orçamento nacional: é ao Parlamento que compete aprovar a emissão de dívida. Ora, se a dívida é criada, mesmo que formalmente não seja contraída pelo IGCP, a Lei, pelo menos no seu espírito, está a ser violada. E os níveis de despesa apurados pela Direcção-Geral do Orçamento acabarão por ser artificialmente diminuídos.

 

Uma forma de medir a desorçamentação, ou pelo menos a forma como o Estado consegue “driblar” a Lei no momento de fazer despesas, é comparar os dados da Direcção-Geral do Orçamento para o défice com os números do INE. Isto porque o INE, ao contrário da DGO, leva em conta todas as despesas assumidas – mesmo que não tenham sido pagas – e reclassifica como despesa pública todos os gastos feitos por entidades controladas pelo Estado que, mesmo que regidas pelo direito privado, não conseguem ser financeiramente autónomas. Note-se que nem todas as empresas são aqui incluídas: apenas as que dependem efectivamente do Estado para continuar a funcionar, o que aponta definitivamente para um verdadeiro caso de desorçamentação.

 

Assim, compararam-se os saldos das Administrações Públicas (Estado, Fundos e Serviços Autónomos, Segurança Social, Regiões e Autarquias) da DGO e do INE para o primeiro trimestre dos últimos oito anos. A diferença é considerada uma medida da desorçamentação. Para eliminar o ruído criado pela inflação, que empolaria artificialmente as diferenças dos anos mais recentes, todos os valores foram divididos pelo PIB do primeiro trimestre.

 

Uma nota adicional: entre 2009 e 2006, a DGO apenas publicou dados semestrais para as Autarquias e Regiões Autónomas. Neste caso, contornou-se o problema dividindo os saldos obtidos no semestre e assumindo que não houve grande oscilação do saldo entre os dois trimestres. De 2003 a 2005, a DGO pura e simplesmente não divulgou dados para estes subsectores. Assumiu-se assim que os valores foram semelhantes à média dos três anos seguintes. Em todo o caso, e dada a magnitude relativa dos valores envolvidos, o impacto nas conclusões é marginal (entre 0 a 0,2 pontos percentuais).

 

 

Diferença entre défices públicos do primeiro trimestre apurados pela DGO e pelo INE em % do PIB 

 

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