Laffer contra troika

26/01/2012
Colocado por: Rui Peres Jorge

 

Vítor Gaspar, a 14 de Julho, quando anunciou a sobretaxa de IRS e a antecipação do aumento do IVA sobre a energia Fonte: Mário Proença/Bloomberg

 

A curva de Laffer é um dos termos preferidos e mais polémicos no debate económico. A ideia teórica é intuitiva: taxas mais elevadas de imposto rendem mais receita apenas até um determinado ponto. Isto porque há um momento a partir do qual um aumento das taxas gera perda de receita fiscal, devido a maior evasão e ao estrangulamento da economia. Não é assim de estranhar que sempre que há um aumento da pressão fiscal sobre a economia, o debate sobre se arriscamos passar esse ponto teórico retorne – normalmente alimentado pelos que mais receiam o excessivo peso da carga fiscal e para irritação dos que defendem um papel importante do Estado na provisão de serviços públicos.

 

Mas esta semana no Parlamento aconteceu algo pouco frequente: perante os últimos dados de execução orçamental, direita e esquerda admitiram implicitamente esse risco. E o governo não o afastou. Os maus resultados em termos de receita de IVA e de contribuições sociais no final do ano fazem temer o pior. E podem ajudar a perceber o que levou Gaspar a desafiar o Banco de Portugal e a troika (o FMI em particular) nas várias propostas de desvalorização fiscal.  

 

Num contexto de uma forte recessão, o Governo decidiu aumentar impostos de forma violenta. Antecipou para 2011 uma sobretaxa de IRS sobre 13º mês e um aumento do IVA sobre produtos energéticos. Para este ano, reduziu de forma significativa do número de produtos sujeitos a taxas reduzidas, subiu impostos sobre vício e reduziu as deduções possíveis em sede de IRS. Este é um factor central da estratégia de consolidação orçamental. Mas então o que nos dizem os dados de receita fiscal do final do ano? E o que nos podem indicar para este ano?

 

Como o Negócios avançou, as receitas de IVA e contribuições sociais ficaram cerca de 400 milhões de euros abaixo do previsto nas previsões inscritas no relatório do Orçamento do Estado para 2012 (cerca de 100 milhões de euros no IVA e 300 milhões nas contribuições). Além disso, se compararmos as receitas de IVA e IRS efectivas com as inscritas nos mapas do Orçamento Rectificativo que o Governo entregou na AR também em Outubro – para incluir os efeitos das sobretaxas de IRS e o IVA na energia – então o desvio negativo aproxima-se de mil milhões de euros.

 

Perante isto, o PCP falou em “exaustão fiscal”, o CDS em “carga fiscal insustentável” e o secretário de Estado em “nuvens no horizonte” que “irá acompanhar”. Está assumido mais um sério risco à execução orçamental de 2011 (sobre outro risco significativo, veja-se, por exemplo, as garantias do Estado à CP, Carris e Metro).

 

O mau desempenho no IVA e nas contribuições podem ajudar também a perceber a resistência do ministério das Finanças à desvalorização fiscal – a proposta do FMI que visava promover a competitividade empresarial, aumentando as taxas de IVA e baixando a TSU das empresas. É que em termos teóricos a medida seria neutra em termos de receita. O problema, parece dizer Gaspar, é que na prática a teoria é outra. E chama-se curva de Laffer.

    

 

 

 

Rui Peres Jorge